Construindo pontes: a importância do diálogo sobre saúde mental nas escolas

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Ana Carolina P. Carvalho

No mês de setembro é realizada a campanha de prevenção ao suicídio pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP). Essa ação é um movimento relevante e que dissemina orientações importantes no tema. Clique aqui para saber mais. Aproveitando esse momento, dedico-me a escrever a respeito.

Orienta-se sobre os cuidados com a saúde mental, e reforço aqui a importância, considerando o sono de qualidade, atividades físicas, boa alimentação, uma vida social ativa, além das condições financeiras que supram atendimento multidisciplinar, moradia com segurança e boa educação. 

Quisera fosse essa a realidade dos viventes. Quisera as necessidades da vida fossem supridas na esfera pública e privada. A mesma condição se estende ao ambiente escolar. Trabalhemos, portanto, com a vida como se apresenta e, mais que isso, o que faremos dela.

Discuto então sobre a nossa a existência e as formas possíveis de lidar com ela. Nessa esfera não há promessa, mas, talvez, uma luz (de conhecimento) na forma de pensar a vida e que a forma como essa seja conduzida não leve à morte tão cedo.

Digo cedo, considerando a dimensão cronológica da vida a qual consideramos. Crianças e adolescentes deprimem, adoecem e podem cometer suicídio.  No Brasil, o suicídio está entre as principais causas de morte entre jovens de 15 a 29, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS).

A saúde mental também reflete no ambiente escolar. Vivenciamos os desafios dos jovens com medo de não alcançar o que se espera, de reprovar na prova, de sofrer discriminação, de não ganhar dinheiro, de não ser bom como o amigo da sala. Tais questões impactam na aprendizagem.

A aprendizagem em si não é um lugar confortável. É ponto de deslocamento, de mudança, de corte. Não se é o mesmo a partir do conhecimento.

Para ajudar nisso, creio ser importante conhecer e entender que no campo da saúde mental fala-se de vida e da morte, fala-se de sexo, fala-se de angústia, de medos e de sofrimento. Manter esses termos tabus é negar a realidade, é paralisia. 

Portanto, jovens, pais, professores e demais atuantes da educação, ter espaços na família e na escola para falar e refletir sobre esses aspectos é que é salutar. Conhecer sobre a nossa condição humana também é lançar outros caminhos mais interessantes para a existência, de modo que não seja a morte a resolução.

Escolhemos viver socialmente como maneira de sobrevivência. Por constituição, somos seres sociais. Assim, precisamos de um outro que nos ajude nas funcionalidades orgânicas por meio de simbiose com outros microrganismos que nos ajudam a digerir e absorver alimentos, bem como para forjar a fala e o raciocínio que construímos a partir da cultura. 

Contudo, para assim o fazermos, abdicamos das pulsões e nos submetemos à lei, tendo de aprender a negociar com o outro. Não podemos fazer o que bem queremos e isso nos cobra o preço psíquico que como resolução cinde-se. Sendo a mente cindida, há sempre algo de nós que nos escapa à consciência, há algo em nós que as palavras não explicam. Há algo em que erramos, trocamos ou esquecemos. O acesso se faz por meio da linguagem.

Freud com a concepção do inconsciente e que este governa as nossas ações e filósofos pregressos, como Schopenhauer, que nos diz que a razão está à serviço da vontade e não o contrário, nos convoca a essa reflexão sobre a realidade. O que media esses conflitos internos que fazem parte do que somos é a palavra. Portanto, a forma como vivemos e seus eventos é aquilo que interpretamos dela. A vida é uma representação. 

Quando nos falta um sentido de viver, nos escasseia o recurso da palavra para simbolizar aquilo que sentimos, podemos entrar em sofrimento, no campo imaginário, cheio de fantasmas. Podemos, então, adoecer e dirigir-nos para a morte como caminho de eliminação da dor.

Mas, o contrário também é possível. Ao buscarmos outras formas de interpretação daquilo que vivemos, ao atribuirmos novo sentido para a vida, dissolve-se o insuportável da existência, dilui-se o sofrimento ou o medo e constrói-se ponte para prosseguir por meio das palavras.

Desse modo, quando se fala de saúde mental, falamos do enfrentamento das limitações, da dor, do tédio, sem negá-los ou evitá-los, mas suportá-los! Fraquejar, cansar, angustiar faz parte da nossa existência. Assim somos. A questão será como cada um lidará com isso e prosseguirá com os seus afazeres, compromissos e novas desafios que a vida lhe imporá. Isso é ter saúde mental. É sofrer e aceitar muitas vezes, é saber chegar e esperar, é reagir quando necessário, e remediar quando preciso.

Marco Aurélio, imperador romano e filósofo, também nos disse que a “morte nos sorri”, e o que podemos fazer é “sorrir de volta”. Isso não significa passividade, mas, pacificação frente a limitação da vida, e a convocação para prosseguir conforme convivemos com a morte. Não nos mantenhamos, portanto, rasos sobre a vida e tão pouco sobre a morte. Conheçamos, compreendamos e façamos um caminho possível de existir.

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Ana Carolina P. Carvalho

Mestra em Administração de Empresas pela FUCAPE Business School. Pós-Graduada em Gestão de Pessoas pela Fundação Getúlio Vargas. Psicóloga e psicanalista. Atualmente é Gerente de Desenvolvimento Humano da Faculdade FUCAPE, atuando nas frentes de carreiras, gestão de pessoas, saúde mental e desenvolvimento do ensino multidisciplinar.