Educação e memória: veja a importância da celebração escolar no Final de Ano

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Lara Brotas

Ana Mae Barbosa, referência em Educação e Arte no Brasil, nos ensina que a arte vai além da estética; ela é memória, experiência e transformação. Seus princípios reforçam a importância de celebrar os momentos marcantes na vida dos jovens — algo essencial em tempos de pressa e volatilidade.

Sua proposta de Arte/Educação Triangular — leitura de imagem, contextualização e fazer artístico — nos mostra que a arte amplia o olhar crítico e resgata memórias significativas. Celebrar conquistas pessoais, transições escolares ou reflexões cotidianas é, de certa forma, praticar essa tríade: olhar para o vivido, entender seu contexto e ressignificar a experiência.

Numa sociedade que banaliza relações e processos, a falta de memória afeta o pertencimento. Jovens privados de celebrações significativas veem suas vivências fragmentadas e carentes de sentido. Por outro lado, registrar esses momentos — por meio de escrita, fotografias ou fazer artístico — fortalece a identidade e resgata a poesia do cotidiano.

Assim como a arte, a celebração é um gesto contra o efêmero. É pausa para olhar o que passou e projetar o futuro. Se, para Ana Mae Barbosa, a arte é essencialmente educativa, celebrar a vida é uma arte em si. É criar memórias que resistem ao tempo e se tornam parte do que somos.

O Ritual do Fim de Ano: Um Convite à Reflexão e à Esperança

Dezembro nos convida a pausar e refletir. Como uma moldura ao redor de uma tela, o fim do ano delimita o ciclo vivido. As conquistas ganham o peso de grandes feitos, e os desafios revelam aprendizagens antes invisíveis. A memória, como uma artista paciente, restaura cores desbotadas e destaca traços essenciais.

A celebração de fim de ano não é só um marco temporal, mas um rito que nos coloca como autores de uma narrativa maior. Na escola, ela se expressa em murais de fotos, apresentações de encerramento e portfólios de estudantes. Cada atividade é o fechamento de um ciclo e o anúncio de um novo.

Nas famílias, as celebrações de fim de ano reconstroem memórias. Fotografias antigas saem das gavetas, histórias são recontadas e o tempo parece suspenso. Esses gestos cotidianos reafirmam a memória como parte da identidade. Cada encontro, abraço e palavra partilhada se torna uma obra de arte irrepetível.

Educar Para a Memória: A Arte Como Ferramenta de Preservação

Na educação, a arte eterniza o que poderia se perder. Quando um estudante pinta, desenha ou escreve sobre o que viveu, transforma o efêmero em permanente. O que era uma lembrança vaga se concretiza em forma e cor.

Ao longo do ano letivo, cada projeto realizado e ciclo concluído carrega o potencial de uma obra de arte. Encerrar o ano escolar não é apenas finalizar atividades, mas fechar uma exposição coletiva, onde cada estudante é artista e obra ao mesmo tempo.

Exposições, murais e apresentações mostram aos jovens que o que fazem tem valor. Nesse ciclo, a experiência é resgatada, transformada e celebrada. Para os estudantes, especialmente os mais jovens, isso fortalece a autoestima e o senso de pertencimento. Eles aprendem que suas histórias importam e que até os detalhes simples têm significado.

Memórias Que Atravessam o Tempo

Se o fim de ano é tempo de memória, a passagem para o ano seguinte é a abertura para a criação. Como o artista diante de uma tela em branco, cada um de nós se depara com o desconhecido. O que dará sentido ao futuro será, justamente, o que ficou para trás.

Memórias não são arquivos mortos. Elas se misturam e reconfiguram no presente. Cada olhar para o passado ressignifica o que foi vivido. Nesse contexto, o educador atua como curador de memórias, ajudando o jovem a perceber o valor de suas histórias. O processo de aprendizagem se assemelha à criação de uma obra coletiva: múltiplas mãos e olhares compõem uma narrativa única.

A Celebração Como Obra de Arte

Ao celebrarmos o fim de um ciclo, assinamos nossa própria obra de arte. O tempo vivido não é uma linha reta que se apaga; ele se revela em camadas e sobreposições. Cada encontro, escolha e aprendizado tornam a vida mais rica em textura e cor.

Ana Mae Barbosa ensina que o fazer artístico exige olhar, pensar e fazer. Assim também é o ciclo de fim de ano: olhamos o passado, refletimos sobre o presente e projetamos o futuro. Cada pessoa se torna autora de sua própria narrativa.

Que narrativa queremos contar? Quais memórias queremos preservar? Ao educar jovens para celebrar suas conquistas, ensinamos mais do que resiliência — ensinamos a transformar memória em matéria-prima para o futuro. Não se trata de nostalgia, mas de percepção crítica do que foi vivido, como sugere a proposta triangular de Barbosa: olhar, contextualizar e fazer.

Final de Ano: A Trama da Arte e da Vida

Se o ano fosse uma tapeçaria, dezembro seria o momento de arrematar os fios soltos. É quando ajustamos as linhas que se cruzaram ao longo do caminho e, com paciência, encerramos o trabalho para que um novo possa começar. Assim como na arte têxtil, o fim do ano exige atenção e delicadeza. É preciso saber quais fios continuarão na trama e quais ficarão no passado.

Para os educadores, o fim do ano é mais que o encerramento do calendário letivo. É a chance de ensinar o valor da celebração como prática educativa e estética. Cada ciclo que se encerra se revela como uma grande obra coletiva, composta de singularidades e significados únicos.

Assim, celebramos. Celebra-se o que foi, o que não foi e o que ainda pode ser. Celebra-se o esforço, o fracasso, a coragem e o aprendizado. Celebra-se a vida em sua potência de recomeçar. Se a memória é uma forma de resistência, então o fim de ano é um ato de coragem — coragem de olhar para trás e, ao mesmo tempo, desejar o que está por vir.

Que, ao final deste ciclo, possamos perceber a beleza que deixamos no caminho. Que as memórias vividas se tornem fonte de inspiração e que o próximo ciclo seja uma nova tela em branco, pronta para ser preenchida com os traços firmes de quem sabe que o tempo vivido nunca é perdido — ele é arte em estado puro.

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Lara Brotas

Mestre pela UFRJ com estudo sobre Museu Picasso, Fundação Antoni Tapies e Fundação Joan Miró. Cofundadora da Matias Brotas, atua na área de arte contemporânea, curadoria, gestão cultural e de projetos. Membro do Núcleo de Arte, Cultura e Educação (Nace), com especialização em História e Teoria da Arte. Professora do curso de Arquitetura e Urbanismo da Multivix. Atualmente cursa Pós-graduação em Gestão Cultural na USP SP.