Por um momento, imagine-se vivendo na Grécia Antiga. Em meio à profusão do conhecimento, Aristóteles se debruça sobre o conceito de livre arbítrio. Ouvidos atentos testemunham o filósofo discorrer sobre a correlação entre livre arbítrio e virtude humana. Em sua análise, Aristóteles faz uma distinção entre ações voluntárias e ações involuntárias. Enquanto as primeiras são aquelas que, realizadas por meio de escolha deliberada, pautam-se no conhecimento e na razão, as involuntárias são tomadas por compulsão, ignorância ou desejo. O livre arbítrio, então, se faz presente nas ações voluntárias, nas quais o indivíduo se torna a causa e a fonte de seus próprios atos. A virtude, assim, está na capacidade do ser humano de agir de acordo com a razão e de se responsabilizar pelas consequências das escolhas tomadas. 

Por mais influência que as lições aristotélicas tenham tido na construção da civilização ocidental, suas palavras foram contaminadas pela engrenagem vulgar do Estado, que busca poder pela apropriação escolhas alheias. Enquanto o cidadão contenta-se com a ideia de alcançar o que almeja por meio do voto, o exercício do livre arbítrio por procuração expõe o sequestro da liberdade. Isso, pois, a interferência coercitiva do Estado na vida das pessoas revela o desprezo pelo indivíduo, a dignificação do coletivo e o fortalecimento ideológico de que a prosperidade vem pelas mãos do governo.

Ao tomar-se a virtude aristotélica como norte, sob a conjuntura atual, é inevitável que alguns questionamentos sejam levantados: quando foi decidido que subsidiar determinados setores era a melhor solução para o crescimento econômico? Quando foi anuído que era necessário refrear a indústria para – supostamente – salvar o planeta da ação humana? Quando foi consentido que opiniões precisam ser reguladas por pessoas que se autodeterminam detentoras da verdade? Quando foi acordado que a letra da Lei tem significado diverso daquele escrito? 

Apropriaram-se das nossas escolhas! Vozes complacentes entoam por aí que a democracia é assim mesmo, justa pela força da maioria. No entanto, não há que se falar em livre arbítrio quando decisões são tomadas sem que a razão as guie. Como esperar ações voluntárias de indivíduos movidos pelo desespero da falta de um prato de comida? Como contar com a razão de quem, propositalmente, foi posto em constante ignorância? À pobreza humana, sobre a qual é prometida justiça social em troca de um voto, abate-se o pesadelo de uma democracia de interesses escusos.

Enquanto os deuses do Olimpo brasileiro preocupam-se em calar os dissidentes que ousam utilizar a razão para criticá-los, uma enorme parcela da sociedade é doutrinada a acreditar que viver de auxílios é mais vantajoso que criar riqueza por meio do trabalho. E, assim, a estratégia vil de culpabilizar os virtuosos motores do mundo – que se arriscam, empreendem e inovam – ganha adeptos em uma briga que, enquanto divide a sociedade, beneficia aqueles que a testemunham de camarote. 

Não se pode, entretanto, atribuir toda a culpa aos nossos príncipes. Ainda que a eles sejam concedidos poderes, o indivíduo é responsável pela própria vida. Embora fazer escolhas deliberadas para proteger direitos inalienáveis exija conhecimento que, a muitos, foi privado, a insurreição dos lúcidos por meio da disseminação de ideias é, sim, um dever moral. De Ludwig von Mises à Friedrich Hayek, o defensor da liberdade luta à sombra de gigantes. Desapontá-los não é uma opção, eis que a resistência inexorável à podridão ideológica é a última esperança para reaver o livre arbítrio aristotélico.

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