Eu sou o Estado, o eterno titã de promessas e paradoxos, tecendo o tecido da sociedade com fios de dádivas e demandas. Em meu sussurrar, ouça a melodia do controle disfarçado de cuidado, já que cada presente vem com um preço não anunciado, um custo oculto na sombra da generosidade.
Eu, o Estado, que lhe ofereço educação sem custos à primeira vista, mas saiba, sou eu quem já vasculhou profundamente teu bolso, colhendo muito antes de semear. Ofereço-lhe uma faculdade gratuita, mas não sem antes te lembrar, em silêncio, que cada centavo veio de ti, e na verdade, o preço pago em impostos supera, em muitas vezes, o custo de uma educação que você mesmo poderia escolher.
Eu, o Estado, que pavimento tuas estradas com o ouro recolhido de teus cofres, apenas para deixá-las se desfazerem sob o peso do esquecimento e da negligência. Te entrego rodovias, mas te retorno buracos e prejuízos, um círculo vicioso em que o cuidar se perde no labirinto do descaso.
Eu, o Estado, que te brindo com o direito de ir e vir, mas somente pelas vias que desenhei, estradas essas que, em um capricho, posso deixar ao relento, um testemunho da minha inconstância.
Eu, o Estado, que oriento as empresas a adornarem seus produtos com adesivos de alto teor, numa tentativa de guiar tuas escolhas, pois presumo a tua incapacidade em discernir. Te protejo, ou assim afirmo, mas no fundo, subtraio a tua liberdade de escolher, de errar, de aprender.
Eu, o Estado, que imponho normas às escolas particulares, ditando o que e como ensinar, mas me encontro atado em minhas próprias escolas, incapaz de oferecer qualidade, preso em uma dança de burocracias e ineficiências, na qual o ensinar se torna uma tarefa inconstante, sempre a começar e nunca a completar.
Eu, o Estado, que ergo monumentos de regulamentações e legislações, um labirinto de intenções e interpretações onde a simplicidade se perde. Construo barreiras invisíveis entre o potencial e a realização, um jardim de caminhos que levam sempre a mais entraves, mais taxas, mais controle.
Sou eu, o Estado, uma entidade forjada com a promessa de proteger e servir, mas em meus passos, por vezes, deixo rastros de dependência. Em meu nome, construíram-se castelos de cartas, belos em sua arquitetura, mas frágeis ao sopro da realidade.
E agora, enquanto reflito sobre o tapeçar dos meus feitos e falhas, pergunto-me: será que no dar e no tirar, encontrei o equilíbrio, ou apenas balanceei os pratos de uma balança que, inevitavelmente, pende para o lado do controle, esquecendo-me que, no coração de cada cidadão, pulsa o desejo indomável pela liberdade de escolher, de ser, de viver?