O livro “Livre para Escolher” é uma leitura que retrata aspectos da economia de mercado, o papel do governo e como o crescimento de seu poder vem afetando a sociedade e o que podemos fazer para manter nossa liberdade como indivíduos. O autor apresenta como a falácia do estado de bem-estar social resultou no tamanho que o governo atingiu, com sua tremenda ineficiência e burocracia, seus orçamentos exorbitantes e sempre em expansão, com uma tributação cada vez mais invasiva e sufocante, munido de um mecanismo de taxação ainda mais perigoso, por sua sutileza e modo silencioso de agir – a inflação. Mas talvez o aspecto mais relevante que Milton Friedman aborda nesta obra é sua visão acerca do indivíduo, da liberdade e da igualdade em nossa sociedade.

O autor conceitua e diferencia a igualdade perante a Deus, a igualdade de oportunidade e a igualdade de resultados e aponta que, uma sociedade que põe a igualdade de resultados – segundo a qual todos devem terminar a corrida ao mesmo tempo – à frente da liberdade, terminará sem uma nem outra. A intervenção ou o uso da força para se obter a igualdade vai minar a liberdade e, mesmo que adotada sob a falácia de bons propósitos, a força terminará sempre nas mãos de gente que a usa para a promoção dos seus próprios interesses.

Friedman defende que a sociedade que põe a liberdade em primeiro lugar terá como subproduto a igualdade, pois uma sociedade livre confere às pessoas a capacidade de perseguirem os seus próprios objetivos. Assim, posições privilegiadas devem ser almejadas e alcançadas por pessoas (e não há problema nisso!), desde que a liberdade seja mantida, de modo que essas posições não se tornem institucionalizadas e continuem podendo ser alcançadas pelas pessoas que este caminho escolherem com êxito.

Ao longo de toda linha de raciocínio do livro, Friedman defende a economia de mercado como algo indispensável para uma sociedade livre. A percepção está alinhada com a de Adam Smith, com uma camada extra de riqueza de conteúdo, ao trazer uma abordagem as funções e os poderes do mercado, dos preços e do governo. No papel do governo, encontramos um exemplo da adição que Friedman faz aos conceitos de Adam Smith. Ele está em concordância com os papéis de se encarregar da proteção dos indivíduos provenientes de coerção interna ou externa a da administração completa da justiça, inclui um ponto de atenção sobre a criação e manutenção de instituições e obras públicas, sobre como o conceito de benefício para a sociedade versus a não geração de lucro pode ser distorcida, fazendo o papel do Estado crescer cada vez mais e, por fim, acrescenta um quarto dever não contido na obra de Adam Smith, que é a proteção dos indivíduos que não podem ser considerados como “responsáveis”. Neste último, ele enfatiza o risco que a atribuição traz, no que tange à suscetibilidade à abuso por parte do Estado, mas ressalta que o item não pode ser evitado.

Apesar de já escrita há algumas décadas, a obra se mostra quase atemporal em certos aspectos. Mudam apenas os exemplos dados com relação à intervenção do Estado no controle de preços, na tentativa da manutenção do estado de bem-estar social, nos incentivos, no protecionismo, nos inúmeros programas e agências regulamentadoras. Os conceitos por trás da tomada de decisão do governo, as suas justificativas e o fato de que este tipo de atuação está fadado ao fracasso continua nítido como nos tempos em que a obra foi escrita.

A leitura é tão leve e instigante, que a ligação do porquê a tirania dos controles permanece é explicada pelas palavras de um personagem de uma tira de jornais. Este diz, por sua vez, que o inimigo somos nós mesmos. Protestamos contra os interesses especiais, exceto quando o interesse especial, por acaso, é o nosso. Cada um de nós sabe que o que é bom para si é bom para o país. Sendo assim, achamos genuinamente que o nosso interesse especial é diferente dos demais. Muitas vezes não se trata de malícia ou maldade humana, mas o favorecimento de muitas minorias em detrimento dos demais impacta na liberdade da maior minoria que há: o indivíduo.

A leitura também se mostra, ainda, como uma aula de história da economia. Aula essa ministrada pelas palavras de um Nobel Prize Winner e que aborda desde a origem do Federal Reserve System, ou Fed, seu propósito inicial e sua atuação em crises. Friedman dissecou e detalhou os fatos e as interpretações sobre a grande depressão, demonstrando também como o cenário se tornou propício ao crescimento do poder do Estado, dando abertura para a escola Keynesiana.

Longe de ser um anarquista, Friedman propõe inteligentes soluções que diminuem o papel do governo, mas ainda não os elimina. Ele critica arduamente a ditadura dos burocratas e como é insustentável o modelo de gastos em que terceiros gastam o nosso dinheiro em benefício de terceiros. Todavia, é possível enxergar que a eliminação total do papel do Estado não é um desejo do autor. As soluções de Imposto de Renda Negativo e vouchers para o sistema de ensino são exemplos disso.

Outra crítica feita por Friedman está na ineficiência das estruturas que se dizem construídas para proteger o consumidor e o trabalhador. Entidades reguladoras, sindicadores e conselhos profissionais vêm cada vez mais aumentando o seu tamanho. Pior do que isso, é o fato de que a regulação, pela própria natureza humana, acaba por brecar o progresso. Todos concordam que, para um fiscal, é mais sensato errar por não deixar passar algo bom, que poderia trazer progresso, do que liberar algo que pode, eventualmente, fazer algum mal para a população. Dessa maneira, é natural se pensar que muitas coisas boas acabaram não passando pela régua do FDA, por exemplo.

Em relação à sindicatos e conselhos profissionais, é límpida a percepção do autor de que, ao proteger os altos salários de uma categoria, este limita a demanda do mercado, fazendo que uma quantidade menor de pessoas possa seguir a carreira que deseja. No final das contas, o protecionismo de uma minoria prejudica a liberdade do indivíduo escolher o que deseja.

É interessante observar que este trabalho, escrito de maneira formidável pelo autor, não impõe que o leitor concorde com todas as suas afirmações para que seja apreciado. Na verdade, a eventual discordância torna a dinâmica ainda mais interessante, pois, ao divergir em um ponto, o leitor é levado a um grande esforço para uma sólida contra-argumentação ou solução alternativa sobre o que está sendo proposto. O ganho disso, obviamente, é o enriquecimento do pensamento lógico e a criação de uma massa crítica relevante para o debate de questões importantes em nossa sociedade. Vale a leitura!

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