A saíra-douradinha é uma das mais comuns no Espírito Santo. Já tive a oportunidade de fotografá-las algumas vezes.
E muitas das vezes, elas não apresentavam medo. Levando suas vidas como se eu não estivesse lá… fotografá-las comendo não é difícil.
Porém, ao apresentar fotos dessa espécie tão bonita, lembrei-me de uma história que vale a pena contar. O dia em que uma manhã clara e serena marcou o início de uma das histórias mais curiosas da minha vida como fotógrafo de natureza.
O destino me levou ao interior de Domingos Martins, no Espírito Santo, em busca de um refúgio para a alma e a câmera: me desfazer de tudo na cidade e trocar por um sítio onde eu poderia viver cercado por natureza, águas correntes e o canto dos pássaros.
No entanto, como a vida no meio natural costuma nos surpreender, minha busca pelo sítio ideal terminou com um desfecho inesperado, graças a um pequeno pássaro de cores vibrantes — a saíra-douradinha.
Um plano cheio de sonhos
Eu procurava um lugar onde pudesse construir meu sonho de envelhecer em paz, rodeado por um pedaço de floresta viva, que eu pudesse ajudar a proteger.
Sempre acreditei que a verdadeira riqueza está nas experiências, e não no acúmulo de bens. Cada pedaço de terra que eu visitava carregava a esperança de encontrar o lugar onde a natureza pudesse florescer junto comigo. Ela protegendo minha alma e eu protegendo suas fronteiras.
Quando soube de uma propriedade em Domingos Martins, senti que estava prestes a encontrar esse pedaço de paraíso.
Cercada por uma floresta promissora, uma nascente e um platô perfeito para uma casa com vista deslumbrante, essa terra parecia tudo o que eu sonhara. Marcamos uma visita com o proprietário e lá fomos explorar cada canto.
Um encontro que mudou meu destino
Enquanto caminhávamos pelo sítio, trocamos impressões sobre o potencial da terra. O proprietário me contou sobre o uso agrícola do local e, embora ele não tivesse tanta familiaridade com as espécies que por ali habitavam, falava com paixão sobre o que a terra lhe proporciona. Mesmo que meu interesse fosse outro, a floresta em pé, achei linda a conexão dele e de sua família com a região.
Subimos até um platô já limpo, onde ele planejava uma futura construção. Foi quando ouvi, ao longe, um som inconfundível: o canto de um bando de saíras-douradinhas.
Não hesitei. Com um toque no celular, reproduzi o canto da espécie. Para a nossa surpresa, mais de dez saíras-douradinhas se reuniram na copa de uma pequena árvore próxima.
Elas pareciam iluminar a paisagem com seu amarelo vibrante, como enfeites de Natal em uma árvore verde. Nunca tinha visto um bando tão grande.
O espetáculo foi tão impressionante que até o proprietário, acostumado à terra, ficou boquiaberto.
O sítio que não foi
Naquele instante, percebi que algo mudou. A empolgação dele ao ver as aves tornou-se quase palpável.
A impressão é de que ele e sua família há tempos não percebiam a riqueza natural daquele lugar. Aqueles pequenos pássaros, com sua simplicidade, despertaram um amor adormecido pela terra.
Dias depois, recebi a notícia que não esperava: ele desistiu de vender o sítio. Percebi o meu equívoco em fazê-lo valorizar o que tinha de uma forma diferente. Acredito que não quis mais vender, pois foi como se ele tivesse enxergado sua terra com novos olhos.
Refleti… Por um lado, perdi o negócio, mas por outro, acredito que tenha sensibilizado ainda mais aquele proprietário. No final das contas, acho que valeu a pena.
Uma joia alada
A saíra-douradinha (Tangara cyanoventris), é uma joia das matas brasileiras. Com sua cabeça amarela, peito azul piscina e dorso estriado de preto e amarelo, ela também encanta por sua importância ecológica.
Alimentando-se de pequenos frutos, dispersa sementes, ajudando a regenerar florestas.
Essas aves vivem em pequenos bandos, muitas vezes acompanhadas por outras espécies de aves, criando uma sinfonia colorida na copa das árvores.
Elas habitam regiões montanhosas do Sudeste e Nordeste do Brasil, mas estão cada vez mais restritas devido ao desmatamento. Fotografá-las é um lembrete da fragilidade de nossos ecossistemas.
O aprendizado da natureza
Embora eu tenha perdido o sítio em Domingos Martins, ganhei algo ainda mais valioso: a confirmação de que a natureza tem um poder transformador.
Essa minha aventura me lembrou muito a famosa história, que usa o poeta Olavo Bilac como personagem:
“Certa vez, um amigo do poeta Olavo Bilac queria muito vender uma propriedade, de fato, um sítio que lhe dava muito trabalho e despesa. Reclamava que era um homem sem sorte, pois as suas propriedades davam-lhe muitas dores de cabeça e não valia a pena conservá-las. Pediu então ao amigo poeta para redigir o anúncio de venda do seu sítio, pois acreditava que, se ele descrevesse a sua propriedade com palavras bonitas, seria muito fácil vendê-la.
E assim Olavo Bilac, após conhecer o sítio do amigo, redigiu o seguinte texto:
“Vende-se encantadora propriedade onde cantam os pássaros, ao amanhecer, no extenso arvoredo. É cortada por cristalinas e refrescantes águas de um ribeiro. A casa, banhada pelo sol nascente, oferece a sombra tranquila das tardes, na varanda.”
Meses depois, o poeta encontrou o seu amigo e perguntou-lhe se tinha vendido a propriedade.
“Nem pensei mais nisso”, respondeu ele. “Quando li o anúncio que você escreveu, percebi a maravilha que eu possuía.”
Algumas vezes, só conseguimos enxergar o que possuímos quando pegamos emprestados os olhos alheios.”
Essa experiência reforçou minha convicção de que a conservação pode começar pelo olhar. A fotografia é minha maneira de mostrar a outros o que talvez passe despercebido, com a sensibilidade de alguém que ama a natureza!
Descubra a sua riqueza
Hoje, conto essa história com um sorriso. Acabei encontrando um outro pedaço de floresta maravilhosa à venda em Santa Teresa, mas isso é tema para outra aventura.
Quero deixar uma pergunta para você: será que você já parou para observar os tesouros que possui? Seja uma amizade, um pedaço de terra ou mesmo o simples privilégio de ouvir o canto dos pássaros.
Compartilhe essa história, comente e curta. Sua interação mantém viva a minha chama da conservação e ajuda a espalhar a mensagem de que a natureza merece ser protegida.
Espero que tenham gostado dessa história ao lado das saíras-douradinhas. Até a próxima aventura!
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Por Leonardo Merçon