Envelhecer ainda é um pecado “quase mortal” na nossa cultura

O Etarismo, Ageísmo, idadismo, idosismo , é o preconceito baseado na idade.

Quem nunca escutou de um filho, ou até do parceiro algo tipo: “você está muito velha para usar essa roupa”? Pois bem, mesmo que você nunca tenha ouvido uma frase dessas antes, ela é super atual, e serve inclusive para questões relacionadas a emprego, na escolha por exemplo, de quem vai ser demitido, mostrando que muitos ainda acreditam que as pessoas com mais de 50 anos são incapazes e improdutivas.
 Para além do impacto na carreia, o etarismo abala também a autoestima feminina, e digo isso, porque para o homem tudo é muito mais fácil na sociedade machista que ainda estamos inseridas.

Vamos por partes: vou dar um exemplo.

 Imagine um homem de meia idade, careca, com a barriguinha mais saliente. Tudo isso é relevado, com comentários positivos como: “fulano, continua bonitão, soube aproveitar a vida, a barriguinha é sinal de que viveu os prazeres e está muito bem com isso”. Já se for uma mulher, é o pecado do dia. Vem logo alguém que diz: “nossa como fulana envelheceu. Cheia de rugas, “bolsa”embaixo dos olhos. Meu Deus” A medicina estética tão avançada, porque ela não aplica uma toxina botolínica, uns fios de PDO”?
Sim, a beleza e os padrões impostos exigidos para nós mulheres são muitas vezes cruéis. Exige-se cirurgias, procedimentos estéticos muitas vezes dolorosos e invasivos, cuidados diários, academia, dietas restritivas, enfim, ser mulher é algo que praticamente nos força a ser belas o tempo inteiro e até morrer, e ainda ir à luta, trabalhar, estar bem disposta, etc.
Nada pessoal, porque assumo publicamente, já fiz alguns procedimentos, não gosto quando os fios de cabelos brancos aparecem, sou vaidosa, gosto de manter cuidados com a pele e cabelo, mas, nada tão exagerado como a gente costuma ver em algumas situações.
 Na verdade, o que quero falar aqui mais profundamente e sobre a dor que tem sido envelhecer para muitas de nós. Que incomodo é esse que vem como um comichão e que não nos permite envelhecer com naturalidade? Que loucura é essa que nos faz detestar nossos próprios corpos,  nos tornando muitas vezes  escravas de um padrão de beleza exigido e que nem sempre cabe no bolso e no biotipo da mulher?
 Não vou nem mencionar a questão da classe social, porque a imposição é tão grande, que passa por todas as classes.
 Para se ter uma ideia, quando a gente liga a TV, ou resolve dar uma zapeada nas redes sociais, as mulheres ricas ou pobres, querem o mesmo: ficar bonita, magra, sarada, com o rosto e corpo bem definidos, chegando inclusive a perder a noção de quem são na verdade.

 Aparência bonita não é sinônimo de bom caráter

A banalização da harmonização facial por exemplo, está tornando muitas mulheres cópias umas das outras. Já observou isso? Precisamos trabalhar na mudança dessa mentalidade, bater na tecla quantas vezes for necessário: é preciso reconhecer esse prejuízo que é cobrar a aparência das mulheres como se fosse ela que fizesse o caráter da mulher.
Ora, se com sorte todos caminhamos para a velhice, porque se marginaliza tanto quem está chegando lá? Não é esse nosso objetivo final? Porque então valorizar ao extremo a juventude como se o que vem depois fosse algo tão ruim e tenebroso? Não podemos nos esquecer que a idade traz sabedoria, cada ruga traz à tona memórias que a pessoa viveu e sua contribuição para este mundo.
 Graças a Deus, estamos envelhecendo melhor, nos cuidando mais, procurando manter uma alimentação mais equilibrada e saudável, praticando exercícios, estudando mais, e a prova está ai quando inúmeras revistas e jornais publicaram que os (50 anos são os novos 30).
É um imperativo social que faz com que você precise se manter jovem, aparentar assim em qualquer idade. Gasta-se rios de dinheiro em propaganda para convencer a mulher de que é dever moral eliminar qualquer sinal de envelhecimento, sobretudo do seu rosto.
 Muito se fala em racismo, homofobia e machismo no ambiente profissional quando discutimos preconceito e acabamos não discutindo o etarismo (ageísmo ou idadismo). Então ao meu ver, esse é um tema que precisa de uma discussão mais abrangente, e que as mulheres, devem procurar envelhecer com calma, cuidados e principalmente com amor e aceitação.
 Quando eu olho para mim, me cuido e me aceito como eu sou, eu vou me amar cada vez mais, e vou enxergar a vida de maneira mais bela, ampla, e sem tanta cobrança. Essa cultura de “jovencentrismo” ou juventude  eterna tem que acabar.

Izabel Mendonça é jornalista, autora dos livros: “Lisboa com Afeto”e “Encontro e outros contos” e comanda o podcast Se Liga Mulher

@seliigamulher