“Você se sente perdida, parece que está vendo o fim de tudo, as coisas indo embora”. É assim que Lucenir Rocedo da Silva, de 59 anos, resume a madrugada de 22 de março de 2024, quando a enchente que devastou Mimoso do Sul transformou a sua vida.
Moradora da cidade do Sul do Espírito Santo, ela e o marido acordaram com o barulho das sirenes e o sino da igreja. A água já entrava em casa.
“Pensei em pegar documentos e algumas roupas, mas não deu tempo. Meu marido disse para subirmos para o terraço, mas vi que lá também ia alagar. Então saímos de casa com a água no peito e ele com a água no pescoço”, relembra.
Leia mais
Fotos relembram rastro de destruição deixado pelas chuvas em Mimoso
“Ouvimos os gritos de socorro, mas não podíamos fazer nada”, diz dona de casa de Mimoso do Sul
Mimoso do Sul vai homenagear vítimas da tragédia com monumento
Sem ter para onde ir, o casal foi acolhido por vizinhos até que uma van da prefeitura os levou para um abrigo em Guaçuí. A escolha por Guaçuí foi estratégica: Lucenir faz hemodiálise e não poderia perder o tratamento.
Sobrevivência e solidariedade em Mimoso do Sul
No abrigo, Lucenir e o marido dividiram espaço com outras vítimas da enchente. “Nos deram duas camas de solteiro, uma geladeira e um fogão. Foi o que sobrou.” Durante meses, o casal ficou em um espaço improvisado.
A tragédia, no entanto, trouxe à tona histórias de solidariedade. Um casal de idosos da cidade abriu as portas de sua casa e abrigou cerca de 50 pessoas, incluindo Lucenir. “Sem a ajuda deles, não sei o que teria sido da gente”, diz emocionada.
O retorno para casa e as incertezas
Quando a água baixou, Lucenir voltou para Mimoso do Sul, mas não encontrou nada além de lama e destruição. “Perdi tudo o que tinha. Depois de anos de luta, sempre trabalhando, consegui minhas coisas, mas vi tudo indo embora.”
A casa, condenada pela Defesa Civil, foi interditada, mas sem opção, ela decidiu permanecer no imóvel. “Moro no terraço. Juntei as duas camas de solteiro e fiz uma de casal. É o que temos.”
Em novembro de 2024, Lucenir conseguiu se aposentar por invalidez, mas o valor da aposentadoria mal cobre os gastos com medicamentos. “Agradeço a Deus por estar viva, mas é difícil. A gente luta tanto para conquistar as coisas e, de uma hora para outra, perde tudo.”
Um ano depois, a reconstrução ainda é lenta
A tragédia que atingiu Mimoso do Sul fez parte de um evento climático extremo que afetou diversas cidades do Espírito Santo. Além dos prejuízos materiais, a enchente deixou um saldo de desalojados e desabrigados que, um ano depois, ainda tentam reconstruir suas vidas.
Nem a metade do que perdi eu consegui de volta. Mas não reclamo. Só de estar viva, já agradeço
Lucenir Rocedo da Silva, moradora de Mimoso do Sul
As chuvas intensas que atingiram Mimoso do Sul naquela semana provocaram enchentes e deslizamentos, deixando um rastro de destruição. No total, 19 pessoas morreram e mais de 10 mil ficaram desalojadas ou desabrigadas. Segundo relatos, a água atingiu o segundo andar de diversas casas e o comércio local foi gravemente afetado.
O governo estadual estima que cerca de 30% a 40% dos estabelecimentos comerciais ainda não haviam retomado suas atividades um mês após o desastre. Além disso, pontes e estradas da zona rural foram danificadas, dificultando o escoamento da produção agrícola.
Mimoso do Sul vai homenagear vítimas da tragédia com monumento
Um ano depois, para que as vidas perdidas não sejam esquecidas, a Prefeitura de Mimoso do Sul vai realizar uma homenagem nesta segunda-feira (24).
Vamos homenagear as 19 pessoas que faleceram e as pessoas, instituições e autoridades que nos ajudaram: Corpo de Bombeiros, Defesa Civil, todos que estiveram com a gente“, explicou o prefeito da cidade, Peter Costa.
A solenidade vai contar com um ato ecumênico e a inauguração de um monumento na Praça Coronel Paiva Gonçalves, às 19h, que vai simbolizar o ocorrido e lembrar as vítimas.
Conforme o prefeito, a obra faz referências às chuvas, à água e a um barco, representando a tragédia e a ajuda recebida.