Mais uma belíssima contribuição do nosso amigo e consultor, Omar Souki.
No fundo do quintal canta o canário. Lá fora ruge a crise. Depois que saí da cidade grande e vim para a roça, aumentou o canto do pássaro e diminuiu o rugido da crise. Ambos fazem parte do meu imaginário. A melodia da natureza não consegue abafar de todo o grito da cidade que eu trouxe dentro de mim. Mas, a visão da mata verde, o suave bailado dos ciprestes, o frescor do ar e o cantar da ave, fazem com que eu coloque os mundos da política e dos negócios em seus devidos lugares.
(Na foto, Omar Souki com o seu mais recente livro, O voo da borboleta azul)
Sim, há crise. A crise está dentro da família que perde um ente querido e das inúmeras famílias que perdem os filhos para as drogas. Está no governo que perde o rumo. À noite, no Santuário, o padre dá os pêsames às famílias dos falecidos e pede oração pelos dependentes químicos. Pela manhã o jornal anuncia mais um desatino da classe dominante. Como não sucumbir à crise?
Não é uma tarefa fácil, mas também não é impossível. Exige enorme disciplina pessoal. Às vezes fico coçando de vontade de pegar o celular e acessar o noticiário, curioso para saber quantos degraus o país se afundou no mar de lama. Mas, eu me seguro. Vou preparar um gostoso café da manhã e fazer a minha ginástica. Vou focar a atenção em tudo que Deus, em sua linda natureza, me oferece de graça. Respiro fundo e passa a vontade de saber mais sobre a crise. A minha consciência me diz que a melhor contribuição que eu posso dar para a sociedade não é sendo parte da agitação, mas da paz. Para escrever é preciso paz. Imagine se eu permitisse que o veneno do mal me dominasse e começasse a escrever com raiva—raiva de tudo que está sendo feito de errado no Brasil e no mundo. Eu estaria colocando mais lenha na fogueira e não sendo um instrumento da paz do Senhor.
Portanto, o primeiro passo é a disciplina pessoal, o autodomínio para não se deixar levar pelo tsunami de corrupção que afunda o Brasil. Lá fora os passarinhos brincam de pega-pega, saltando de galho em galho. Portanto, para mim é mais fácil focar no lado bom da vida. Assim também era São Francisco. Em uma época de imoralidade profunda, ele se retirou. Respirou fundo e, com sua mensagem de amor, contribuiu para um mundo melhor.
Você e eu podemos fazer muito para que o Brasil e o mundo mudem. Sim, a primeira coisa é mudando nossos pensamentos. A segunda é mudando nossas emoções. A terceira é mudando nossas atitudes. E, a quarta é mudando nossas ações. Mudar nossa forma de pensar é fundamental. Como? Não permitindo que pensamentos de ódio, maldade ou vingança se apossem de nós. Depois de cultivarmos pensamentos de coragem, bondade e compaixão, começamos a sentir mais paz e mais amor. Com tranquilidade e afeto germinam em nós atitudes mais equilibradas que nos levam a ações construtivas.
É dentro desse contexto que nossa ação será mais eficaz. Assim poderemos sim participar de protestos pacíficos e conseguir até o que parece impossível. Para os indianos da época de Gandhi parecia impossível se verem livres do jugo inglês. A Inglaterra na época era a nação mais poderosa do mundo. Mas teve que dar liberdade aos habitantes da Índia, pois—sob a liderança pacífica de Gandhi—as manifestações populares foram mais forte do que a violência dos ingleses. Nosso inimigo não está fora do Brasil, mas dentro. É um adversário que deseja instigar em nós ódio, maldade e vingança. A forma de combatê-lo será usando a força invencível da coragem, bondade e compaixão. Acredito que seja necessário primeiro vencer a crise dentro de nós, para depois combatê-la fora de nós. Lá fora, o canário continua cantando livre e feliz!