Excelente artigo do nosso presidente da ABQ sobre Inovação e Qualidade. Pedro Luiz detalha com grande maestria as particulares do tema da inovação e suas relações com o tema da qualidade.
Vamos ao texto integral do artigo publicado originalmente no site da ABQ – www.abqualidade.org.br.
Fiz recentemente, a convite, uma palestra com este titulo no Fórum de Inovação da Fundação Getulio Vargas, coordenado pelo meu amigo Prof. Dr. Marcos Vasconcellos, da prestigiosa Escola de Administração de Empresas de São Paulo, ligada àquela Fundação. Por julgar provocativas e de interesse algumas colocações que fiz, decidi colocá-las no presente artigo. Nele, me estenderei mais sobre a parte da palestra referente à Inovação e menos sobre a da Qualidade, por ser esta mais difundida entre os especialistas.
Apenas lembrarei aqui uma definição para a Qualidade usada por um ex-aluno meu de mestrado na Escola Politécnica da USP, pois seu espírito tem a ver com o que se discute na sequência.
“Qualidade é o somatório de todas as características e propriedades dos bens e serviços oferecidos que satisfaçam as necessidades razoáveis dos clientes, juntamente com o conjunto de situações envolvidas na obtenção e uso destes produtos que favoreçam uma existência saudável e autenticamente humana a todos os que são afetados”. Fonte: Cerquinho (1994)
Já para a Inovação temos, certamente entre outras, as seguintes definições:
“A inovação tecnológica é definida pela implementação de produtos (bens ou serviços) ou processos tecnologicamente novos ou substancialmente aprimorados. A implementação da inovação ocorre quando o produto é introduzido no mercado ou o processo passa a ser operado pela empresa.” Fonte: IBGE (2000)
“Inovação Tecnológica em Produtos e Processos (ITPP) compreende as implementações de produtos e processos tecnologicamente novos e substanciais melhorias tecnológicas em produtos e processos.
Uma ITPP é considerada implementada se tiver sido introduzida no mercado (inovação de produto) ou usada no processo de produção (inovação de processo). Uma ITPP envolve uma série de atividades científicas, tecnológicas, organizacionais, financeiras e comerciais”. Fonte: OECD (1997)
As duas primeiras definições enfatizam o uso da tecnologia, mas essa, embora importante, não é condição necessária para a existência da Inovação. A condição efetivamente necessária é a agregação de valor ao seu uso. Muitas invenções não são Inovações por esta razão. A inovação tecnológica é resultado de um processo amplo, conforme ilustrada na Figura 1.
PESQUISA PURA (ou básica, ou fundamental) é a pesquisa realizada com o objetivo de aumentar os conhecimentos científicos, sem se preocupar com a possibilidade de aplicações praticas.
PESQUISA APLICADA é a busca de novos conhecimentos científicos ou não, que ofereçam soluções a problemas objetivos, previamente definidos.
CIÊNCIA é o conjunto organizado dos conhecimentos relativos ao universo objetivo, envolvendo seus fenômenos naturais, ambientais e comportamentais.
TECNOLOGIA é o conjunto ordenado de todos os conhecimentos científicos, empíricos ou intuitivos, empregados na produção e comercialização de bens ou serviços. Fonte: Longo (1975)
As inovações têm indiscutivelmente trazido grande contribuição ao progresso da humanidade, mas podem também trazer consequências indesejáveis. De fato:
Inovação deve trazer: vantagem competitiva; mais conhecimento/tecnologia; mais possibilidades de lazer; mais saúde e segurança; melhor aproveitamento do tempo; e melhor qualidade de vida. Inovação pode trazer: isolamento das pessoas; falsa ilusão de status; vulgarização da cultura; especialização exagerada; e pior qualidade de vida.
Estas considerações sugerem se pensar a Inovação em sua abrangência geral, a exemplo do que fez Fabio Cerquinho com a sua definição de Qualidade. Assim pensa a Fundação da Nacional da Qualidade, que tem a Inovação com os dos fundamentos para a excelência em gestão, ao exigir quanto a ela a “Promoção de um ambiente favorável à criatividade, experimentação e implementação de novas ideias capazes de gerar ganhos de competitividade com desenvolvimento sustentável”. Fonte: FNQ (2013)
A propósito, segundo Gro Harlem Brundtland, ex-primeira ministra da Noruega, “Desenvolvimento sustentável é aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade das gerações futuras atenderem às suas próprias necessidades”. Fonte: OECD (1997)
Classificações da Inovação (Fonte: Vasconcellos – 2015)
Classificação quanto ao conhecimento : tecnológicas e organizacionais. São exemplos de inovações organizacionais: uso de tecnologias apropriadas; contêineres; transporte urbano de Curitiba; restaurantes por quilo; e restrição ao goleiro no futebol com bolas atrasadas.
Classificação quanto ao foco: voltadas para dentro e voltadas para o mer-cado. O cruzamento dessas duas classificações aponta para onde incidem as inovações, conforme a figura 2.
Classificação quanto ao grau de novidade: incremental: produz melhoria contínua; e radical: produz salto de melhoria. A Figura 3 ilustra a influência das inovações no processo de melhoria.
As inovações incrementais consistem de pequenos e sucessivos aperfeiçoamentos tendo como objetivo a melhoria contínua do desempenho. O resultado cumulativo de uma série contínua de pequenas ideias pode, em muitos casos, ser maior que o de uma inovação radical isolada (ÁLVARES, 2010). Esta colocação de Álvares (2010) sugere uma nova visão para o processo de melhoria, conforme a Figura 4.
Desafios à razão
O objetivo maior ao se buscar Qualidade e Inovação é promover a Qualidade de Vida das pessoas na sociedade. Este truísmo está representado na Figura 5.
“A Inovação é a fonte das grandes oportunidades no século XXI”. Certo? Certo, mas olhemos para a Figura 6.
Entretanto, nada contra a Inovação. Como diria Fernando Pessoa, “Inovar é preciso!” Mas, talvez seja também preciso trabalhar o conceito de Qualidade da Inovação, nos moldes da definição de Fabio Cerquinho!
Para tanto, sugere-se a criação de um indicador chamado Qualidade da Inovação – QDI, a qual: é uma medida dos benefícios ou malefícios que a inovação traz aos indivíduos e à sociedade.
Propõe-se para essa medida uma escala entre -1 e +1.
– Teorema 1: O valor de QDI é função do tempo de utilização da inovação.
– Teorema 2: O valor temporal da QDI depende do planejamento a logo prazo de sua utilização.
Fatores que afetam a QDI:
• Grau de utilização da inovação;
• Amplitude do mercado;
• Satisfação dos usuários;
• Aspectos éticos;
• Contribuição para a sustentabilidade;
• Simplicidade de uso;
• Vantagem real proporcionada.
Exercício: Estabelecer um valor da QDI para as seguintes inovações: automóvel; zeppelin; bomba atômica; televisão; computador; e telemarketing. Está lançado o desafio aos pesquisadores!
Referências:
ÁLVARES, A. C. T. Desmistificando a Inovação. Palestra pronunciada na FIESP – SP, novembro de 2010.
CERQUINHO, F. Ética e Qualidade nas Empresas. Dissertação de mestrado, Escola Politécnica da USP, Departamento de Engenharia de Produção. São Paulo, 1994.
COSTA NETO, P. L. O. e CANUTO, S. A. – Administração com Qualidade. São Paulo: Blucher, 2010.
FNQ – Fundação Nacional da Qualidade. Critérios de Excelência. São Paulo, 2013.
IBGE – Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. PINTEC – Pesquisa Industrial de Inovação Tecnológica. Rio de Janeiro, 2000.
LONGO, W. P. Tecnologias e transferência de tecnologia. Código 2955, n. A – 937.001.9 Biblioteca do Inmetro, 1975.
OECD – Organization for Economics Cooperation and Development. Manual de Oslo. Oslo, Noruega, 1997.
VASCONCELLOS, M. (coord.) Gestão da Inovação. São Paulo: FNQ, 2015.
Pedro Luiz de Oliveira Costa Neto é professor titular do programa de pós-graduação em engenharia de produção da Universidade Paulista (Unip) e diretor presidente da Academia Brasileira da Qualidade (ABQ).
Interessante a discussão. Gostaria de compartilhar um artigo que escrevi que relata o diálogo entre a Gestão da Inovação e a Gestão da Qualidade nas organização que complementa à visão do autor.
Acesse o link: https://drive.google.com/open?id=0B_yrr7U6DDEVSXNEcFJpbENnY3c
Gostei muito da parte conceitual, com destaque para a discussão sobre os “efeitos colaterais” da inovação. Parece justo alinhar a inovação com a qualidade de vida, mas na prática isso não acontece. Será mesmo que o dispositivo móvel com acesso à internet (smartphone/tablet) como inovação radical, e as diversas outras inovações associadas a este tipo de dispositivo trouxeram melhoria na qualidade de vida? Antes crianças brincavam na rua, interagiam, aprendiam a conviver com diferenças e limitações. Agora preferem ficar em casa nos jogos eletrônicos. Sobre a proposta do QDI faltou elucidar como aplicar a classificação e escala propostas.
Gostaria aprender muito sobre Discíplina de Inovação de Qualidade..