Colaboração especial do amigo Claudius D’Artagnan C. Barros, da Academia Brasileira da Qualidade – ABQ, um dos maiores gurus brasileiros da Qualidade e Produtividade.
Breve introdução ao tema PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO
A expressão Planejamento Estratégico reúne em si mesma dois conceitos: Planejamento e Estratégia. Ambos podem ser implantados de forma incorporada ou isolada, em considerável escala no ambiente corporativo. Este, por sua vez, representado por organizações do setor público ou privado, de médio ou grande porte e também, em casos pontuais, de pequeno porte e, excepcionalmente, por microempresas.
Juntas, estas duas palavras compõem uma verdadeira simbiose, transformando-se numa poderosa ação que aponta os rumos, as metas e as proposições de mercado. A fusão dessas palavras pode ser considerada o ponto de inflexão entre o êxito ou o fracasso de uma organização, levando-se em conta as perspectivas de médio ou longo prazo.
Mas, afinal, o que esses termos significam isoladamente?
Planejamento é um termo de gênese latina derivado da palavra planus, de onde também se origina a expressão planilha. O latim planus significa algo “achatado” ou “nivelado” e dele resulta o termo português plano e, por extensão, o ato de planejar. Em outras palavras, levando-se em conta a origem etimológica do termo, planejar significa “levar a cabo um esquema por meio de consulta a dados ou elementos gráficos”.
Portanto, pode-se dizer que Planejamento é uma ferramenta de gestão tradicional que consiste no ato ou efeito de planificar e que estabelece (hoje) um esquema ou arquitetura de um dado projeto, visando alcançar (amanhã) uma determinada meta, resultado ou propósito. Trata-se, enfim, de um ato de prevenção.
Estratégia, por sua vez, é uma palavra de natureza grega – Strategos – cujo significado aponta para o universo militar. Originalmente, é a “função do general do exército” ou, por extensão, pode significar os “planos de manobra e ações para derrotar o inimigo”. No discurso corporativo, estratégia diz respeito à construção de um plano focado no alinhamento e na convergência de ações voltadas a conquistas e vantagens competitivas de mercado.
Combinando-se, então, essas duas expressões e considerando seus respectivos e supracitados significados, chegamos àquilo que conhecemos por Planejamento Estratégico, que pode ser conceituado como uma ação metodológica e sistêmica de avaliação e contextualização de ambientes organizacionais (tanto internos como externos), capaz de possibilitar mecanismos de tomada de decisão com vistas à sustentabilidade institucional, frente à concorrência e aos inúmeros desafios do mercado no qual a empresa se insere.
Planejar estrategicamente não é algo recente.
Voltemos no tempo, a uma data próxima de 450 a.C. Considerada a civilização mais antiga do mundo com existência contínua, a China vivenciava à época batalhas épicas entre reinos, motivadas pela conquista e domínios de extensões territoriais.
Esse período histórico, conhecido como Reinos Combatentes (entre o quinto e o terceiro séculos a.C.), sob a dinastia Wu, foi marcado por domínios de jurisdição ou reinos. Um deles, o Reino de Hu Lu, tinha no comando dos seus guerreiros um general contemporâneo de Confúcio conhecido por Sun Tzu, que além de exímio estrategista militar, era considerado um homem intelectualmente sensível às questões da cultura, sabedoria e conhecimento. Em função dessas competências humanas e profissionais, Sun Tzu ostentou o título de general-filósofo.
Sun Tzu escreveu, gravando os caracteres em tiras de bambu, um texto militar conhecido por Manual Estratégico, obra que, séculos mais tarde, seria rebatizada de “A Arte da Guerra”, um tratado de táticas militares descritas em treze capítulos. Seu conteúdo foi descoberto e traduzido para o francês em 1772 pelo missionário jesuíta Joseph-Marie Amiot, vindo a ser publicado sob o título “Les Treize Articles” (Os treze Artigos). Mais tarde, a obra é impressa em inglês como “The Art of War”. Seu conteúdo estratégico notabilizou-se inclusive entre os agentes dos aparatos de inteligência de Estado, sobretudo entre os espiões soviéticos da famigerada KGB. O mesmo se aplica às mais famosas academias militares do mundo moderno.
Sua popularização nos meios empresariais se deu somente no início dos anos 80, quando a obra ancestral é reeditada pelo australiano James Clavell (1921-1994), agora direcionada ao ambiente corporativo. Especialistas em estratégia empresarial observaram que as proposições gravadas por Sun Tzu naquelas lâminas de bambu revelavam não apenas ações pertinentes ao mundo dos negócios, mas representavam estratégias perfeitamente aplicáveis à gestão corporativa atual com foco no planejamento e, principalmente, na liderança tática.
Considerando esta perspectiva estratégica, a leitura e a interpretação do “Arte da Guerra” de Sun Tzu tem sido recomendada em instituições de renome, como o Corpo de Fuzileiros Navais dos EUA, a Universidade de Harvard e o Massachusetts Institute of Technology (MIT), dentre outras.
Algumas interpretações dos escritos deixados por Sun Tzu
Note algumas observações de Sun Tzu descritas na obra “Arte da Guerra” e seguidas por interpretações livres aplicadas ao ambiente corporativo:
Sun Tzu: “Se conhecemos o inimigo e a nós mesmos, não precisamos temer o resultado de uma centena de combates;
Interpretação: Se conhecemos as estratégias dos nossos concorrentes e estamos convictos da nossa competência em gestão dos negócios, não precisamos temer os embates competitivos impostos pelo mercado.
Sun Tzu: “Se conhecemos a nós mesmos, mas não ao inimigo, para cada vitória sofreremos uma derrota”;
Interpretação: Se estamos convictos da nossa competência em gestão dos negócios, porém não conhecemos as estratégias dos nossos concorrentes, a cada conquista de mercado, sofreremos uma derrota.
Sun Tzu: “Se não nos conhecemos nem ao inimigo, sucumbiremos em todas as batalhas”
Interpretação: Se não conhecemos nossa capacidade de gestão dos negócios, nem as estratégias dos nossos concorrentes, provavelmente seremos derrotados em todos embates competitivos impostos pelo mercado.
Sun Tzu: “… o oficial inteligente procura o efeito da energia combinada não necessitando exigir muito de seus guerreiros. Leva em conta o talento de cada um e utiliza cada homem de acordo com sua capacidade, não exigindo perfeição dos sem-talento”
Interpretação: O gerente inteligente procura o efeito da energia combinada (ou, a sinergia de esforços compartilhados), não necessitando exigir muito dos seus liderados. Leva em conta o talento, motivação e competência de cada um e estimula cada liderado de acordo com sua capacidade e ambiente situacional.
Sun Tzu: “… a glória suprema consiste em quebrar a resistência do inimigo, sem necessariamente lutar”!!!
Interpretação: O êxito de uma organização consiste em estratégias circunstanciais que bloqueiam o avanço da capacidade competitiva de seus concorrentes, ou tornam-se parceiros de negócio (joint venture) não necessitando com isso eliminá-los do mercado.
Sun Tzu: “…concentre-se nos PONTOS FORTES, reconheça suas FRAQUEZAS, agarre as OPORTUNIDADES e proteja-se contra as AMEAÇAS”
Interpretação: Nesta citação, em particular, SunTzu propõe em sua essência uma ação característica de planejamento estratégico que, a partir dos anos 60, ficou conhecida como SWOT, acrônimo das expressões inglesas Strengths (pontos fortes), Weaknesses (fraquezas), Opportunities (oportunidades) e Threats (ameaças). O meio acadêmico e corporativo atribui a transformação (ou adoção) da citação de Sun Tzu na Análise Swot ao consultor de negócios e gestão organizacional da Stanford Research Institute (Universidade de Stanford), Albert S. Humphrey , falecido em 2005. Citado em algumas literaturas especializadas como o “Pai do SWOT”, Humphrey seguramente baseou-se nos princípios milenares de Sun Tzu para conceber esta ferramenta de análise ambiental sistêmica tão importante no plano das organizações, com o objetivo de mitigar os riscos e lograr vantagens competitivas.
Por mérito, é dever que se mencione outro ícone das técnicas do Planejamento Estratégico, o matemático russo naturalizado americano Igor Ansoff (1918/2002). Professor e pesquisador da consagrada Brown University e autor do clássico “Estratégia Corporativa”, publicado em 1965, Ansoff é considerado o grande inspirador da Gestão Estratégica. Sua genialidade produziu um modelo de direcionamento de ações e processo decisório denominado “Matriz Ansoff”, que permite avaliar o crescimento e a projeção do êxito de uma organização com base na análise do cenário externo, relacionando decisões estratégicas contrapostas a produtos e mercados novos ou já existentes.
Suspeita-se que Humphrey e Ansoff construíram suas referidas técnicas de planejamento estratégico, respectivamente – Análise SWOT e Matriz Ansoff – tendo como base os milenares e consagrados preceitos de Sun Tzu, sem que isso represente qualquer demérito para os ditos autores. Ao contrário, cabe ressaltar que ambos deixaram valorosa contribuição para o desenvolvimento e sustentabilidade de inúmeras organizações ao redor do mundo. O pragmatismo de suas metodologias permanece incólume, sendo fonte referencial para a construção do Planejamento Estratégico e resultantes planos de ação, seja qual for modelo organizacional.
Claudius D’Artagnan C. Barros é empresário, autor, consultor em Planejamento Estratégico para empresas de pequeno e médio porte, membro da Academia Brasileira da Qualidade e da Academia de Letras de Lorena
Ilustrações: Getulio A. Ferreira