Condomínios podem barrar locação pelo AirBNB, diz STJ

Alex Pandini

Shutterstock.

 

Fundada em 2008, a AirBNB é uma plataforma online que permite a locação de casas, apartamentos, quitinetes, quartos e outras acomodações para viajantes. A praticidade e economicidade tornaram a ferramenta um sucesso no mundo inteiro, fazendo da empresa uma das maiores no ramo de hospedagem. Atualmente, a AirBNB tem um portfólio de mais de sete milhões de unidades disponíveis para a clientela, em mais de 220 países.

 

No Brasil, o Superior Tribunal de Justiça se debruçou sobre um caso em que o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul acatou pedido de um condomínio, concedendo o direito de proibir a locação de imóveis no local por meio da plataforma. No caso concreto, o proprietário de um apartamento do condomínio se utiliza da locação da unidade por curta temporada. A questão gravitou em torno do direito de propriedade, da finalidade residencial do imóvel e do período de tempo de utilização da unidade.

 

Em Recurso Especial interposto à decisão proferida pelo TJRS, que foi julgado pela 4ª Turma do STJ, a decisão de garantir que o condomínio decida sobre permitir ou proibir o uso foi mantida. Uma decisão que certamente traz impacto, não só para a empresa, bem como para todo o mercado de hospedagem e também imobiliário, já que seu viés poderá modificar as relações de consumo pela plataforma daqui por diante.

 

Por esse motivo, o assunto gera ampla discussão no meio jurídico e empresarial. Diante do caso, o blog ouviu o advogado Carlos Augusto da Motta Leal, especializado em Direito Imobiliário, para saber o que ele pensa a respeito da decisão.

 

O especialista não acredita que o STJ tenha criado nenhuma inovação ou modificado nenhuma regra já existente, e que agiu em um caso específico à luz da lei e do bom senso. Motta Leal acredita que a decisão de dar autonomia aos condomínios para decidirem sobre a utilização não inviabilizará o novo modelo de negócio no ramo de hospedagem, mas sim garantirá sua utilização com razoabilidade e limites. Vamos ao resumo do nosso especialista:

Carlos Augusto da Motta Leal, do escritório Motta Leal & Advogados Associados. Foto divulgação.

 

“O debate gravitou sobre a natureza da locação por curtíssima temporada em confronto com a locação por temporada tratada na Lei do Inquilinato (Lei 8.245/91). Embora não haja na legislação fixação de prazo mínimo para configuração da locação por temporada, tendo, a lei, fixado apenas o prazo máximo desta modalidade (90 dias), o STJ confirmou o entendimento do TJ gaúcho que considerou que locação por reduzidos e repetidos períodos, com moldura de hospedagem, se divorcia da natureza residencial. Este entendimento se deu sob a ótica de que condomínios residenciais não admitem atividades comerciais em suas unidades autônomas, o que, efetivamente, decorre de lei.

 

“Entendeu ainda o STJ que no ambiente condominial há primazia do interesse coletivo sobre o individual, e que o exercício do direito de propriedade é limitado pelos deveres e regras condominiais, dentre os quais a de não praticar atos de cunho comercial; o que, igualmente, decorre de lei. Nesta esteira, entendeu o STJ que locação por curtíssima temporada com serviços, com nuances de hospedagem e não de habitação, não tem natureza residencial e sim comercial. Ainda, proclamou que o ciclo continuado deste tipo de ocupação pode impor desconforto e colocar em risco o ambiente e comunidade condominial.

 

“Ao declarar que condomínios que têm suas unidades com destinação residencial não admitem atividades comerciais, exceto se houver regulação expressa em convenção; ao estabelecer que convenção de condomínio pode vedar práticas comerciais em condomínios residenciais e limitar determinadas práticas sem violar direito de propriedade, e, enfim, ao fixar que, no caso concreto examinado e que foi originário do Rio Grande do Sul, houve violação ao sossego condominial e desfiguração da natureza residencial da unidade locada simultaneamente para pessoas sem vínculo entre si e por curtíssima temporada, não me parece que o Egrégio STJ tenha laborado em inovação ou mudança das regras já assentadas. O direito de propriedade tem matriz no Código Civil Brasileiro. Nesta ordem, o bom senso é que deve imperar. Sempre ele.

 

“Natural que o direito de ceder em locação o imóvel é prerrogativa do proprietário. É sabido, também, que a inovadora modalidade de locação por plataformas digitais, com ocupações por temporada, por vezes curtas ou curtíssimas, é uma inovação que veio para ficar e que é uma relevante mola propulsora do segmento imobiliário. Portanto, ao lado do bom senso caminha a harmonia, que recomenda que haja pacificação destas condutas. De um lado, a preservação do ambiente residencial e o privilégio à convivência condominial com sossego e segurança e, de outro, a possibilidade de o proprietário de unidade residencial em condomínio locar seu imóvel por temporada ou não, curta ou longa, sem ter ceifado o exercício de seu livre direito de posse, nem tampouco limitado o retorno de seu investimento imobiliário. Os excessos não são boas companhias.

 

“Portanto, o que se depreende da recente decisão proferida pelo STJ, é que é lícito aos condomínios residenciais regular a destinação das unidades para locação por curtíssima temporada, vedando a prática cuja natureza e características, desfigure o perfil de locação comercial e se assemelhe a meio atípico de hospedagem, sem, entretanto, ter proibido, de forma ampla e generalizada, locações residenciais por temporada, curta ou curtíssima. Cada caso merece ser examinado em concreto e regra boa é aquela que harmoniza os interesses e privilegia o bem de todos”.

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Alex Pandini

Alex Pandini é jornalista, tem 53 anos e mais de 3 décadas de experiência profissional em rádio, jornal, TV, assessoria de imprensa, publicidade e propaganda e marketing político. Além de repórter e apresentador na TV Vitória, é responsável pelo conteúdo da plataforma ConstróiES.