Uma análise sobre a regulamentação da hospedagem via plataformas digitais
Em 2023, aproximadamente 30 milhões de pessoas se hospedaram no Brasil através de plataformas que oferecem estadias de curta duração, como o Airbnb, conforme dados do Mapa das Construtechs & Proptechs, desenvolvido pela Terracotta Ventures. O estudo aponta ainda um aumento de 69,4% nos imóveis disponibilizados para este tipo de aluguel até 2022, com um crescimento de 31% nas locações de curta duração.
Para regulamentar a locação de imóveis residenciais para temporada, especialmente intermediada por plataformas digitais como o Airbnb, a Câmara dos Deputados propôs um Projeto de Lei que visa alterar a Lei do Inquilinato.
Em tramitação desde julho, o Projeto de Lei nº 2795/2024 tem como objetivo regular a locação de imóveis residenciais para temporada por meio de aplicativos. O projeto sugere incluir uma disposição legal na seção “Da locação para temporada” da Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245/1991), que regula as locações de imóveis urbanos e os procedimentos relacionados.
De acordo com o texto, as restrições para locações de curta temporada só poderiam ser aplicadas se houvesse “previsão expressa na convenção do condomínio”. Além disso, o PL aborda um tema controverso nos edifícios brasileiros: a possibilidade de locar apenas um cômodo. Segundo o projeto, as negociações poderiam “abranger um ou mais cômodos da unidade imobiliária”, responsabilizando o locador por quaisquer danos decorrentes de uma locação de curta temporada.
Para Josmar Pagoto, advogado e sócio da PRL Advogados, a proposta busca garantir segurança jurídica sem impor proibições ao uso dessas plataformas, assegurando que a locação por temporada continue permitida, salvo restrições específicas expressas nas convenções condominiais. “No entanto,” alerta “há ajustes necessários no PL. O projeto estabelece que, em princípio, qualquer prédio pode ser incluído como unidade locável nas plataformas, a menos que haja uma proibição expressa na convenção de condomínio. Considerando que se trata de um cenário novo, muitos condomínios não têm regras definidas sobre o tema, o que, se o projeto for aprovado como está, deixará a decisão sob responsabilidade individual e não coletiva”.
Riscos e Responsabilidades
O Projeto de Lei também trata das responsabilidades pelos riscos de danos. A proposta atribui ao locador a responsabilidade objetiva por qualquer dano causado ao condomínio por hóspedes que utilizem a unidade via plataformas digitais, independentemente de culpa. No entanto, segundo Pagoto, o PL não aborda a responsabilidade das plataformas digitais. “Essas plataformas estabelecem relações jurídicas que precisam ser consideradas. A responsabilidade da plataforma deve ser também objetiva, já que ela estabelece um contrato com o hóspede, que por sua vez interage com o proprietário. Assim, existem três partes envolvidas nessa relação jurídica, e a plataforma pode ser judicialmente acionada por danos que afetem o hóspede, o condomínio, o proprietário ou até prestadores de serviço”, explica o advogado.
Outra parte polêmica do projeto é a possibilidade de locação de um ou mais cômodos da unidade, o que permitiria a um proprietário transformar seu imóvel em um “hostel”, modelo de locação onde há compartilhamento de quartos. “Esse modelo de compartilhamento com múltiplas pessoas dificulta ainda mais a definição de responsabilidades e a cobrança por eventuais danos, abusos ou excessos”, acrescenta Josmar Pagoto. Ele reforça que a discussão é necessária, mas há vários pontos do Projeto de Lei que precisam ser revistos.