Quais as chances da PEC do fim da escala 6x1 avançar no Congresso?
O anúncio do Ministro da Fazenda Fernando Haddad (PT) frustrou as expectativas e repercutiu negativamente no mercado financeiro e político. Apesar de promessas de ajuste fiscal, a estratégia adotada levantou incertezas em virtude de um conjunto de erros.
1. Expectativa mal administrada e atrasos
O envio do pacote era ventilado em Brasília há meses, mas foi adiado sucessivas vezes. Inicialmente em virtude das eleições municipais, depois em meio à agenda do G20 no Brasil, bem como em virtude da falta de consenso político do próprio governo sobre as medidas. Os atrasos geraram apreensão no mercado, e contribuíram para a deterioração do câmbio.
O governo prometeu economizar cerca de R$ 70 bilhões em medidas para 2025 e 2026, mas também prometeu aumento de isenção de imposto de renda como forma de compensação, o que neutraliza parte do impacto esperado.
2. Antecipação desnecessária de debates fiscais
Ao incluir no pacote a discussão sobre a reforma da tributação da renda, que estava programada para 2025, desviou-se o foco de problemas imediatos, e também pode comprometer negociações futuras.
3. Dependência do Congresso em um cronograma apertado
O pacote dependerá da aprovação do Congresso, mas o atraso no calendário orçamentário ameaça inviabilizar a aprovação do próprio orçamento de 2024 antes do final do ano. Com menor tempo para negociações, dificulta-se a própria viabilidade do plano diante de uma base política do Governo no Congresso Nacional relativamente instável.
4. Números que podem não bater
O governo promete que a isenção do imposto de renda para quem possui renda de até R$ 5 mil mensais será compensada pela maior tributação de renda superior a R$ 50 mil. Seriam 36 milhões de beneficiados (78,2%), um impacto fiscal estimado de R$ 51 bilhões, ao passo que a base de incidência da compensação seria de cerca de 100 mil pessoas. A conta não fecha. E não seria a primeira vez.
A título de exemplo, o governo projetou uma arrecadação de R$ 54 bilhões com a implementação do voto de qualidade do CARF no orçamento em 2024, mas até julho deste ano, a arrecadação foi de apenas R$ 85 milhões.
O economista-chefe do BTG Pactual, Mansueto Almeida, calculou que o ganho potencial em dois anos anunciado pelo governo de R$ 72 bilhões é, na verdade, de no máximo R$ 46 bilhões.
Os números apresentados pelo governo para aumento de arrecadação são objeto de questionamento e que comprometem a eficácia da proposta como sustentabilidade fiscal.
5. O problema estrutural continua intocado
O pacote anunciado não ataca o cerne da questão fiscal. A regra do Teto de Gastos, cujo aumento de despesas era restrito à inflação, foi substituída por um arcabouço que obriga o gasto público crescer de forma sistemática acima da economia.
Esse modelo implica que, a cada ano, o Congresso precisa aprovar aumentos tributários para equilibrar as contas, perpetuando um ciclo vicioso de elevação de carga tributária sem controle efetivo das despesas. Ou seja, mesmo se a conta fechar no próximo exercício fiscal, isso não acabará com o problema do ano seguinte.
6. Raciocínio excessivamente político
O pronunciamento de Haddad, em rede nacional na noite de quarta-feira (27), revelou um roteiro que vai além das medidas fiscais e escancara o tom político do pacote. Em um discurso cuidadosamente estruturado, Haddad apresentou as conquistas econômicas do governo Lula 3 como o eixo central de uma narrativa que parece já mirar a campanha à reeleição do presidente em 2026.
A mensagem foi clara: destacar a economia como motor das realizações do governo atual, sempre em comparação com gestões passadas. Frases como “o Brasil recuperou o tempo e o espaço perdidos” e “o desemprego, que castigava nossa gente no período anterior, está entre os mais baixos da história” se repetiram, reforçando o contraste com o governo anterior e criando um discurso com forte apelo eleitoral.
Outro elemento que não passou despercebido foi a estética do discurso: música de fundo, a bandeira nacional posicionada estrategicamente, e a fotografia de Lula ao fundo, compondo uma imagem simbólica e emocional que vai além das contas públicas. A estratégia sugere que o pacote não é apenas uma tentativa de ajustar as finanças do país, mas também um instrumento para consolidar a imagem de Lula como gestor competente em um cenário de reconstrução.
A abordagem levanta preocupações sobre a real prioridade do governo: resolver os desafios fiscais de curto e médio prazo ou pavimentar o caminho para 2026? A mensagem de Haddad, recheada de comparações com o passado e elogios às conquistas recentes, parece responder à pergunta.
7. Falha em restaurar a confiança
Como resultado de todo esse conjunto de erros, o ajuste fiscal anunciado não resolveu a falta de confiança no mercado. Na manhã de quinta-feira (28), o dólar bateu R$ 6, os juros futuros aumentaram e o risco país também.
Em paralelo, o banco americano JP Morgan publicou um relatório reduzindo a recomendação de compra para ações brasileiras.
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