As deduções das despesas médicas do Imposto de Renda da Pessoa Física podem acabar?
Iniciado o período para envio da Declaração do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) para a
Receita Federal, muitos se questionam quais valores podem ser deduzidos na elaboração da
declaração completa. Entre as despesas passíveis de dedução que são mais relevantes no cálculo
do Imposto de Renda, as despesas relacionadas à saúde nos chamam atenção pelas questões
políticas, sociais e financeiras relacionadas a esta renúncia fiscal.
Pois bem, segundo a legislação, no tocante aos gastos com saúde, podem ser deduzidos aqueles
realizados para tratamento hospitalares, cirurgias plásticas, fisioterapia, psicológico, planos de
saúde, tratamentos dentários, entre outros, desde que sejam devidamente comprovados, sem
que haja um limite financeiro estabelecido para esta dedução.
Em 2020, o Conselho de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas emitiu um relatório de
avaliação que divulgou que quase 80% — mais precisamente 79,85% — do total das deduções de
despesas médicas tem como principais beneficiários os contribuintes com renda mensal entre três
e 30 salários mínimos. Para se chegar a esse dado, foram analisados os números das Declarações
do Imposto de Renda das Pessoas Físicas (DIRPF) referentes ao ano-calendário 2018 —
rendimentos auferidos no decorrer de 2018 e declarados no exercício de 2019 —, atualizados para
o ano-calendário de 2019.
Estes dados nos mostram que a população mais carente não possui nenhuma dedução com
despesa médica, uma vez que em sua grande maioria utilizam o SUS. Em vista disso, estabelecer
um teto que seja justo, e não dê excesso de privilégios e benefícios àqueles que não precisam faz-
se necessária.
Sem prejuízo a existência de uma certa pressão pública para a definição de um limite para as
despesas relacionadas à saúde -como efeito da conscientização desta disparidade-, a legitimidade
de redução, eliminação ou focalização do subsídio poderia ser contestada pelas ‘classes médias’,
que tem relevante influência na opinião pública. Todavia, na prática, o núcleo do poder decisório
do Estado brasileiro é coberto por planos privados de saúde e contam com benefícios da renúncia
de arrecadação fiscal, que acabam se prevalecendo aos interesses públicos.
Nada obstante a falta de apoio político nas propostas que já tramitam no atual governo para
limitação dos descontos relacionadas a estas despesas, o próprio Comitê propõe que, para
reverter esse quadro, uma alternativa seria aumentar os recursos financeiros e melhorar a
qualidade do SUS, bem como ampliar a capacidade regulatória do Estado sobre os planos
empresariais de saúde. Idealmente, o setor público passaria a atrair segmentos da clientela da
medicina privada, tendo-se como resultado a redução dos gastos das famílias e dos empregadores.
Autora: Maria Manuela Mattedi, pós-graduada em direito tributário pela FGV e advogada
tributarista