Por André Paris
Um dos objetivos mais desafiadores de um programa de compliance é “tirá-lo do papel”, ou seja, trazer efetividade às políticas, procedimentos, diretrizes, treinamentos e demais controles estruturados dentro do programa de compliance de determinada empresa.
Para que um programa de compliance seja mais do que regras a serem seguidas, controles a serem implementados, treinamentos a serem realizados e monitoramentos a serem conduzidos, profissionais de compliance, lideranças e a alta direção devem ter sucesso em fomentar uma cultura corporativa que tenha preocupações éticas em seus valores fundamentais.
Mas como os profissionais de compliance e as lideranças do negócio podem promover um impacto efetivo na cultura corporativa de uma empresa? Para conduzir sua cultura a um caminho ético e transparente, primeiro, uma organização deve direcionar comportamentos.
Ao longo de uma série de textos irei compartilhar alguns exemplos de como uma empresa pode influenciar o comportamento de seus funcionários e, por extensão, sua cultura corporativa. Vamos iniciar com alguns dos métodos tradicionalmente aplicados.
Técnicas tradicionais para direcionar comportamentos
O “tom” dado pelas lideranças
Antes de tudo, é importante entender que “ações falam mais alto que palavras”, ou seja, o que as pessoas fazem diz mais sobre suas intenções do que o que as pessoas dizem.
Com base nisso, não é difícil encontrar o “tone at (e mais recentemente from) the top” indicado como pedra angular de um programa de compliance efetivo em trabalhos nas áreas de governança ou compliance.
No entanto, como dito, o tom definido não será percebido como verdadeiro ou será seguido se as lideranças de uma empresa apenas “falem por falar” sobre ética, mas não pratiquem o que “pregam”. Se o CEO de uma organização fizer um discurso de tirar o fôlego sobre ética e respeito no local de trabalho a todos os seus funcionários na reunião anual da empresa, mas não responder adequadamente a uma denúncia de assédio (ou caso ele mesmo assedie seus subordinados), ninguém acreditará nas lindas palavras presentes em seu discurso.
Além disso, estudos mais recentes argumentam, de forma precisa, que não apenas o “tom” definido pela alta administração é importante para orientar os comportamentos dos colaboradores da organização, mas também o “tom” definindo pelos demais níveis de liderança da empresa.
Dependendo do tamanho ou da abrangência territorial do negócio, pode ser improvável que um funcionário tenha contato com membros da alta direção em uma frequência superior a uma ou duas vezes por ano. Se for esse o caso, o “tom” estabelecido, e os comportamentos demonstrados, pelo superior direto de determinado colaborador provavelmente serão aqueles que afetarão sua percepção de como a organização espera que ele se comporte.
Incentivos financeiros
Como você se sentiria se o lema da sua empresa fosse “Lucrar sem perder a integridade”? Provavelmente incrivelmente satisfeito por trabalhar em uma organização com tais preocupações éticas, certo?
No entanto, e se essa mesma empresa não incluir nenhuma meta de compliance em seu programa de bônus? Ou se as metas escolhidas estão relacionadas, exclusivamente, a objetivos de ganho de receita? Agora, talvez você não se sinta mais tão confiante sobre as intenções da empresa.
É exatamente assim que os membros de uma organização podem se sentir se as palavras de uma empresa lhes dizem algo e seus incentivos (financeiros) mostram o contrário. Para impactar corretamente o comportamento do funcionário, uma empresa deve garantir que seu programa de incentivos, também, contemple metas de conformidade, ética e transparência.
Embora possa ser desafiador selecionar quais ações podem representar o cumprimento de metas éticas, alguns exemplos são: a manutenção de um registro profissional sem nenhum registro de conduta indevida, ou, decisões éticas tomadas, e reconhecidas como tal por seus pares ou subordinados, nas operações do dia a dia da organização.
Da mesma forma, algumas empresas estão usando mecanismos de “clawback” para punir funcionários que se envolveram em comportamentos antiéticos. Nesses casos, se for constatado que um membro da organização cometeu uma conduta indevida, a empresa terá o direito de recuperar eventuais bônus concedidos a quem realizou a conduta indevida.
No próximo texto da série sobre economia comportamental e compliance irei tratar sobre outros métodos tradicionais para o direcionamento de comportamentos, os quais envolvem práticas de vigilância, estabelecimento de proibições e aplicação de sanções.