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MERCADO DIÁRIO

por Tiago Pessotti

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Como se comportam os principais índices em períodos de guerra?

Com a recente escalada das tensões no leste-europeu, o mercado financeiro reagiu de diversas maneiras ao redor do planeta. Mas afinal, como se comportam os índices financeiros em períodos de guerra? Dados históricos da bolsa de valores americana durante 3 conflitos recentes (Invasão ao Afeganistão, Guerra do Iraque, Invasão da Crimeia) podem nos ajudar a entender o comportamento do mercado.

Guerra Capital

Jeremy J. Siegel, economista e autor de livros sobre o tema, escreveu em 1994 o livro “Stocks for the long run” (Em português: Investindo em ações no longo-prazo) e dedicou um capítulo inteiro à análise do comportamento da bolsa de valores americana em períodos de guerra. Na análise feita por Siegel, ele encontra que historicamente, os movimentos da bolsa de valores não têm relação com nenhum evento específico. Siegel conseguiu verificar que, desde 1885, o índice Dow Jones havia sofrido alterações diárias de 5% em 126 ocasiões (Considere 2008 pré-crise do subprime), e em apenas 30 dessas ocasiões é possível relacionar diretamente a oscilação ocorrida com algum evento político ou econômico. Dentre eles, as duas Guerras Mundiais. Um fato curioso é que o autor conseguiu constatar, que mesmo com os conflitos mais recentes, como as recentes invasões americanas no Oriente Médio, onde o mundo se encontrava mais globalizado, os períodos de guerra costumam ser relativamente mais estáveis. Embora períodos de paz entreguem significativamente mais retornos aos investidores, ele também é marcado por uma maior volatilidade (medido pelo desvio-padrão mensal do índice Dow Jones Industrial). Via de regra, imagina-se que guerras seriam períodos em que a bolsa é impactada de maneira negativa, devido ao redirecionamento de recursos para esforços de guerra, que costumam incluir aumento dos impostos e da dívida pública. Há também a possibilidade dos países envolvidos, sejam por meios de alianças comerciais ou de maneira direta no combate, perderem o conflito e sofrerem sanções econômicas, que contribuem ainda mais com a queda nos índices. Há também o lado de que durante o período inicial de um conflito, os mercados tendem a reagir imediatamente de maneira negativa, porém, em seguida começa a retomada dos índices, ocasionado por uma expectativa positiva de que as corporações irão se beneficiar com o aumento da oferta de produtos.

Guerra moderna e seus impactos

Invasão ao Afeganistão (2001)  O mundo foi pego de surpresa com o ataque às torres gêmeas em 11 de setembro de 2001. Os Estados Unidos, impactado, tratou o ato terrorista como uma declaração de guerra e usou o ataque como uma justificativa para iniciar a invasão ao Afeganistão, que se iniciou em 7 de outubro de 2001. O objetivo: destruir a organização terrorista Al-Qaeda e a retirada do Taleban do governo. A reação do mercado, que na época estava passando por um período de seguidas baixas devido ao rompimento da bolha das dot-coms, foi de pânico imediato. Não houve abertura da bolsa americana no dia do ataque, e ela permaneceu fechada até o dia 17 de setembro. Na reabertura, o índice Dow Jones despencou 684 pontos (aproximadamente 7.1% de variação) e foi, até o início da pandemia de COVID-19 em 2020, a maior queda que o mercado já havia registrado em um único dia de negociação em sua história. S&P 500 e NASDAQ registraram quedas de 11,6% e 16% respectivamente. Estima-se uma perda de US $1.4 Trilhão de dólares no período. Surpreendentemente, a bolsa se recuperou nos 6 meses seguintes à invasão americana realizada no Afeganistão. O índice Dow Jones do período subiu incríveis 11.9%, mostrando uma reação positiva do mercado a resposta que o governo americano realizou, que fora impulsionado pelo fato de que o conflito não ocorria em território americano e gerava uma maior oferta de produtos em diversos setores. Guerra do Iraque (2003) A guerra do Iraque, que teve início em 20 de março de 2003, foi uma operação militar realizada pelos Estados Unidos e países ocidentais aliados que se opunham ao governo de Saddam Hussein, como forma de retaliação ao desenvolvimento de armas químicas e armas de destruição em massa que supostamente estavam em andamento. Curiosamente, a resposta do mercado financeiro americano foi diferente. Desta vez, investidores já conviviam com a ideia de que uma guerra com o Iraque era iminente, e passaram a criar expectativas que uma invasão realizada pelo governo americano ao país, seria uma operação militar rápida e bem-sucedida. Dado isso, nos dias que se antecederam o início oficial da guerra, o índice Dow Jones subia 3,59%, enquanto NASDAQ e S&P 500 acompanhavam, com alta de 3,88% e 3,54%, respectivamente. O mesmo ocorreu no dia em que se iniciou o conflito, porém, de maneira mais moderada, com os 3 índices subindo menos de um ponto percentual. Invasão da Criméia (2014) A invasão Russa e a consequente anexação da região da Crimeia na Ucrânia, se trata do conflito que mais se assemelha à atual situação vivida no leste-europeu. À época, o governo pró-Rússia de Viktor Yanukovych foi deposto depois de uma série de protestos iniciados pela população de Kiev no que ficou conhecido como euromaidan. Ao mesmo tempo, na região da Crimeia, que pertencia à Ucrânia (mas que já havia pertencido a Rússia) a população de maioria pró-Rússia começou uma série de protestos envolvendo milhares de pessoas que se opuseram aos eventos ocorridos em Kiev e reivindicavam um estreitamento dos laços com a Rússia, ou uma eventual anexação do território. Em 1 de março de 2001, o parlamento russo concedeu autorização a Vladimir Putin para o uso da força militar na Ucrânia, devido a um pedido de ajuda não-oficial de um líder pró-Rússia, Sergey Aksyonov. Os impactos no mercado financeiro gerados por esta crise também foram imediatos, com a bolsa de valores de Moscou sendo a mais afetada. Cerca de $44,97 bilhões de dólares em valor de ações de empresas russas desapareceram no primeiro dia da crise. O mercado americano também respondeu de maneira negativa, porém com mais modéstia. O índice Dow Jones registrou queda de 1% no dia em que a invasão se iniciou, e operou de maneira volátil até o encerramento da crise. E o momento atual? Como ele se relaciona com o que já ocorreu historicamente? Como mencionado, embora pareça ilógico, no início de cada conflito (à exceção a invasão da Crimeia), houve um otimismo inicial para com o segmento corporativo. Se deve a esse comportamento, a expectativa de que as companhias iriam se beneficiar com o aumento da oferta de produtos, já que o conflito não ocorria em território americano. Esse mesmo comportamento não ocorre agora, com o conflito entre Rússia e Ucrânia. Com a globalização, automatização de operações de mercado e acesso a informações quase instantâneas, a resposta do mercado à guerra ocorreu de maneira imediata. Durante o início do pregão do dia 24/02, bolsas do mundo inteiro despencaram, devido ao medo do mercado de que uma nova Guerra Mundial se iniciasse por conta do conflito. Porém ao final daquele mesmo dia, a bolsa americana fechou em alta, com o Dow Jones Industrial subindo 0,27% e o S&P 500, 1,49%. A alta ocorreu porque houve uma quebra de expectativas do mercado. Investidores estavam sub-precificando os ativos, já que era esperado que o Ocidente se envolvesse militarmente no conflito, escalando uma guerra local a nível global. Porém, ocorreu justamente o contrário, visto que os países ocidentais se comprometeram ao não-envolvimento militar no conflito, oferecendo apenas ajuda financeira e humanitária, além do envio de alguns materiais bélicos. O mercado também respondeu positivamente ao anúncio das sanções econômicas impostas à Rússia. Mas ainda é cedo para dizermos exatamente como os mercados irão reagir. Não se tem ainda, uma estimativa exata de quanto tempo o conflito vai durar, uma vez que quanto mais longo, pior tende a ser para a economia como um todo. A principal lição é que o mercado sempre se recupera, mesmo que em alguns casos ele leve mais tempo para tal.