Capixaba fundador da ViaNuvem lança startup de financiamento automotivo
A antiga Codesa, atual VPorts, que administra os portos de Vitória e Barra do Riacho, ganhou uma página na história do país como a primeira autoridade portuária estatal vendida para uma empresa privada. O presidente que esteve à frente da Codesa durante boa parte do processo de desestatização, Júlio Castiglioni, foi nomeado em abril deste ano pelo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, como presidente do Metrô de São Paulo. Tarcísio, enquanto Ministro da Infraestrutura de Bolsonaro, apoiou a privatização do Porto de Vitória e trabalhou ao lado de Castiglioni. Agora, o governador de São Paulo estuda modelos para a concessão do metrô paulista com um executivo experiente em processos de privatização. Confira a entrevista com Castiglioni a seguir.
Júlio Castiglioni é Procurador de carreira do Espírito Santo e está afastado há oito anos, desde que assumiu um cargo na gestão de Paulo Hartung. Em 2019, foi nomeado presidente da Codesa por Bolsonaro com a missão de privatizar a estatal. Com a tarefa cumprida, deixou a autoridade portuária em pouco um mês depois do arremate.
A privatização da Codesa foi considerada uma grande vitória pelo setor produtivo do Espírito Santo. A autoridade, que agora se chama VPorts, foi arrematada por um fundo da Quadra Capital por R$ 106 milhões, empresa que deverá fazer investimentos de quase R$ 1 bilhão nos portos de Vitória e Barra do Riacho durante o período de 35 anos da concessão.
Mundo Business: Quais foram os principais aprendizados em passar por esse processo no Porto de Vitória?
Júlio Castiglioni: Conduzir a primeira desestatização de uma autoridade portuária no País foi uma experiência grandiosa. Até pelo ineditismo do que foi feito, não se pode negar que este desafio na Codesa acabou por projetar positivamente os profissionais que atuaram no projeto. Valorizo a vivência que o Porto de Vitória me proporcionou e extraio dali lições que têm sido úteis no Metrô de São Paulo. De bate pronto, vem à minha mente, por exemplo, que a concessão do Porto jamais poderia ter ocorrido se não tivéssemos resiliência. Grandes feitos exigem paciência, diálogo, sem perder firmeza de propósito.
De toda forma, prefiro não esquecer da minha origem como Procurador do Estado do Espírito Santo. É a minha casa, onde recebi os primeiros incentivos para inovar e buscar soluções na gestão pública. Foi o meu trabalho técnico na Procuradoria que, naturalmente, com o passar dos anos, me conduziu e me preparou para o desafio atual. A PGE faz um trabalho silencioso, mas conta com gente realmente talentosa. Minhas andanças pelo Brasil me confirmam isso.
Mundo Business: Como se deu a relação com o então Ministro da Infraestrutura Tarcísio durante a atuação na Codesa?
Júlio Castiglioni: Fui apresentado ao então Ministro da Infraestrutura, Tarcisio de Freitas, em dezembro de 2018, a partir de uma indicação de técnicos do BNDES. Não o conhecia. Mas não foi necessário muito tempo para me convencer de que deveria topar aquela jornada.
Primeiro porque o Governador Tarcisio é essencialmente um técnico que, na linha do que também acredito, entende que uma boa ideia, capaz de mudar a vida das pessoas para melhor, depende de capacidade de formulação, de argumentação. É fazer política na melhor acepção do termo. É abandonar a ideia equivocada de que o plano da técnica está dissociado do campo dos debates. E segundo porque o Governador Tarcisio é sensível e leal à sua equipe. Sem isso, não haveria liderança legítima.
Mundo Business: Quais desafios e oportunidades você encontrou até o momento na gestão do Metrô?
Júlio Castiglioni: É equivocada a associação entre um suposto interesse em privatizar o Metrô e a minha indicação para a Presidência da Companhia. O grande desafio que se impõe ao Metrô, neste momento sob a minha liderança, não é esta discussão sobre o modelo societário, se deve ser público ou privado. O debate é relevante, mas ainda prematuro. O próprio Governo de São Paulo não “fechou questão”.O que está posto como desafio imediato é o iminente choque de gestão cujos benefícios, nós capixabas, temos a honra de vivenciar há duas décadas.
O Metrô de São Paulo é espetacular. Faz um trabalho incrível e é assim reconhecido mundo afora. Mas a Companhia foi criada e mantida sob a perspectiva de uma receita sempre crescente. A pandemia fez uma outra realidade bater à porta. E, mesmo em meados de 2023, ainda transportamos 25% de passageiros a menos do que era transportado no período pré-pandemia. Ao passo em que as despesas, neste período, aumentam a passos largos, sobretudo em virtude da pressão inflacionária que ainda repercute na cadeia de suprimentos e nas expectativas sindicais que, como em qualquer setor, exercem a sua vocação e lutam por benefícios salariais.
É necessário, neste momento, reconfigurar a empresa para que ela possa ter mais ductibilidade, que possa conviver de maneira mais equilibrada com momentos de frustração de receita. O conceito não tem nada de novo: é gastar o que se pode gastar, é ter parcimônia, porque nenhuma empresa– nem mesmo as estatais– têm alvará para serem deficitárias ou ineficientes no seu custeio.
Mundo Business: Qual é a importância de passar ao setor privado a operação de ativos estratégicos como um dos principais portos do país e o metrô da maior cidade?
Júlio Castiglioni: Não acredito que a solução para o Porto de Vitória deva ser, necessariamente, a solução para o Metrô de São Paulo, porque, como disse, é necessário ter honestidade intelectual, se divorciar de amarras ideológicas e, com muito pragmatismo, modelar algo que se conecte com a realidade específica de cada empresa. São setores substancialmente diversos…a começar pelo fato de que o Porto encontra ambiente concorrencial absolutamente distinto do Metrô. O próprio perfil do “cliente” é significativamente diverso.
Então, não vejo como uma solução feita sob medida possa ser automaticamente levada a outro setor. Mas, sem dúvida, seja num caso ou no outro, é possível dizer que operações privadas, em geral (e apenas em geral), tendem a ser eficientes porque o setor privado tem, por exemplo, menos custos de contratação. Empreende com mais leveza e com uma dinâmica melhor que a estatal.
Por outro lado, a presença privada no serviço público exige um fortalecimento do poder de regulação e fiscalização para fazer face a eventuais excessos do operador privado. No caso do Metrô de São Paulo, é notável o fato de que a operação pública e a operação privada estão coexistindo dentro do mesmo sistema, de modo que a sociedade tem tido a oportunidade de avaliar, concretamente, os benefícios e as externalidades negativas de cada modelo. É um exercício diário de comparação, que não parte de suposições, mas da experiência concreta de cada passageiro.
Mundo Business: Existem desafios em comum entre a Codesa e o Metrô de São Paulo como estatais?
Embora cada setor possui regras e costumes próprios, há questões centrais, universalmente válidas, independente do setor regulado… Seja no setor de saneamento, ou seja nos transportes coletivos, vejo a mesma preocupação com a racionalidade dos custos e com a busca de eficiência. Não se trata simplesmente de gastar menos, mas de gastar corretamente. A modelagem da concessão do Porto de Vitória foi particularmente um exemplo que lança luz para o restante do País. No início da caminhada, uma empresa capturada politicamente, sem apreço pela meritocracia e com custos irracionais.
No fim, mesmo convivendo com pontuais incompreensões no caminho, os capixabas entenderam a abraçaram o que estava sendo proposto: um setor mais leve e dinâmico, capaz de impulsionar a nossa economia. E, para isso, foi necessário demonstrar que a empresa era capaz de gerar valor, de justificar a sua existência. O modelo de concessão foi apenas a decisão para aquele caso. Mais importante que isso é o turn around que precede a decisão sobre conceder ou não o serviço.
Mundo Business: Porque você acredita que o governador Tarcísio estuda fazer a concessão?
A questão quanto ao modelo societário e quanto à participação privada no sistema metroviário sequer é uma novidade para São Paulo. Já existem duas linhas com operação concedida e outras duas, em construção, que também terão um operadores privados. A política pública e as diretrizes para a mobilidade urbana permanecem, todavia, nas mãos do Estado. E assim será sempre, independente do modelo de negócio. Então, este tema não pode ser encarado como tabu, desde que não se perca de perspectiva que o passageiro deve estar na centralidade das nossas preocupações.
O passageiro, ao mesmo tempo em que se identifica com o Metrô e reconhece a sua imprescindibilidade, a sua excelência no planejamento e na execução de obras, está cada vez menos tolerante, por exemplo, com greves que, por vezes, não respeitam os limites impostos pela própria legislação paredista. É necessário encarar estes desafios. Como tornar melhor a experiência do passageiro, sem ofender direitos dos empregados, dos parceiros de negócio etc? E é exatamente isso que o Governador vem incentivando, ou seja, vamos trabalhar para garantir o melhor modelo para a população, sem pré julgamentos, sem compromisso ideológico.
Qual é o modelo? Ora, sem a densificação dos estudos, não se pode antecipar decisões. Neste momento, nada pode ser confirmado ou descartado. É preciso arregaçar as mangas e, com mais maturação das propostas, levar as ideias à sociedade.
As informações/opiniões aqui escritas são de cunho pessoal e não necessariamente refletem os posicionamentos do Folha Vitória