Economia

A controvérsia do voto de qualidade no Carf e a insegurança jurídica resultante

A polêmica sobre o voto de qualidade, previamente eliminado pela MP 1160/23, reflete a divergência de opiniões sobre o sistema de julgamento no Carf

IBEF-ES

Foto: Divulgação
*Artigo escrito por Pedro Henrique Merote, advogado tributarista, sócio nominal em Merote Advocacia, membro da Comissão de Direito Tributário da OAB Vila Velha e associado II IBEF Academy.

No cenário complexo da tributação brasileira, o Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) desempenha um papel crucial na resolução de conflitos relacionados aos impostos.

Com uma composição paritária de oito representantes, equilibrando interesses de contribuintes e do governo, o Carf funciona como um tribunal administrativo vinculado ao Ministério da Economia.

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Contudo, a controvérsia em torno do voto de qualidade tornou-se um ponto central nos debates recentes. A extinção desse mecanismo pela Lei 13.988/20 deu lugar a uma reviravolta com a promulgação da Lei 14.689 em setembro de 2023.

A polêmica sobre o voto de qualidade, previamente eliminado pela MP 1160/23, reflete a divergência de opiniões sobre o sistema de julgamento no Carf.

O ministro da Economia, Fernando Haddad, chegou a comparar os representantes dos contribuintes a detentos em um julgamento de habeas corpus, destacando a peculiaridade de um empate favorecer o detento.

A narrativa de Haddad não alterou a trajetória legislativa, e a MP 1160/23 perdeu eficácia por não ser convertida em lei no prazo estipulado. Esse episódio evidencia a volatilidade das decisões legislativas e a dificuldade de consenso em um tema tão sensível.

Posteriormente, em setembro de 2023, a Lei 14.689 reintroduziu o voto de qualidade no Carf, gerando incerteza jurídica. Essa rápida oscilação de paradigmas – quatro mudanças em menos de 12 meses – gera desconfiança nas instituições e nos investidores.

Alega-se que a reintrodução do voto de qualidade, agora com o representante do governo possuindo o voto de minerva em empates, busca equilibrar as decisões. O governo argumenta que a regra anterior, favorecendo o contribuinte em empates, prejudicava a arrecadação.

No entanto, as estimativas sobre o impacto real dessa mudança são divergentes, com o governo prevendo um aumento de R$ 50 bilhões na arrecadação, enquanto o mercado estima R$ 10 bilhões.

Apesar dos argumentos apresentados pelo governo, uma pesquisa no Congresso Nacional indica que a maioria dos entrevistados apoia a permanência do voto de qualidade, introduzindo complexidade ao cenário. Contudo, é importante ressaltar que o resultado foi equilibrado, revelando também incerteza além do âmbito parlamentar.

Foto: Ibef-ES

Em meio a essas incertezas, os custos agregados do governo federal aumentaram 6,6% no primeiro semestre de 2023. Esse dado adiciona um componente econômico à controvérsia, levantando dúvidas sobre a sustentabilidade financeira das decisões relacionadas ao Carf.

Para agravar a situação, a Secretaria de Orçamento Federal (SOF/MPO) revisou a projeção para o déficit primário do governo central, em 2023, de R$ 141,4 bilhões para R$ 177,4 bilhões.

Em suma, a saga do voto de qualidade no Carf é emblemática da oscilação e imprevisibilidade do sistema tributário brasileiro. A insegurança jurídica resultante afeta empresas e mina a confiança no sistema jurídico. Resta saber se novas reformas serão necessárias para proporcionar estabilidade ao cenário tributário nacional, em meio aos desafios financeiros enfrentados pelo governo.