Economia

SUS, automóveis, meio ambiente: o que mudou no acordo Mercosul-UE

Governo Lula insistiu em mudanças no item compras governamentais, para ampliar competitividade de empresas nacionais nas compras públicas

Estadão Conteúdo

Redação Folha Vitória
Foto: Ricardo Stuckert/ divulgação
Membros do Mercosul e da Comunidade Europeia celebram assinatura de acordo comercial

O acordo comercial entre União Europeia e Mercosul já havia sido politicamente concluído uma vez, em 2019, mas nunca foi assinado. O tratado foi renegociado nos últimos dois anos, entre 2023 e 2024, e o governo Lula quis deixar o seu DNA no texto, alterando o que havia sido fechado pelo governo Bolsonaro. Nesta sexta-feira, 6, ao anunciar a conclusão do acordo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que o tratado de 2019 tinha condições “inaceitáveis”.

“O acordo que finalizamos hoje é bem diferente do anunciado em 2019. As condições que herdamos eram inaceitáveis. Foi preciso incorporar ao acordo temas de relevância ao Mercosul”, disse. “Conseguimos preservar nossos interesses em compras governamentais, o que nos permitirá implementar políticas públicas em áreas como saúde, agricultura familiar, ciência e tecnologia.”

O texto final do acordo ainda não foi divulgado. O Estadão teve acesso, no entanto, a documento elaborado pelo governo brasileiro sobre os principais pontos negociados.

Em julho do ano passado, Brasília articulou com os demais países do Mercosul para fazer uma contraproposta à União Europeia que alterasse, essencialmente, o capítulo do acordo dedicado às compras governamentais. O governo Lula buscava ampliar o rol de situações nas quais o governo poderia preferir empresas nacionais nas compras públicas, para estimular setores que considera estratégicos. A insistência provocou um racha na Esplanada, com ministérios da ala mais “liberal” críticos à movimentação de Lula.

Além de criticar a negociação concluída em 2019, o governo Lula a minimiza. O documento do governo diz, por exemplo, que em 2019, “permaneciam textos sujeitos a negociação”.

Compras governamentais e SUS

A questão das compras públicas é a principal mudança trazida no texto de 2024 dentro do que o Itamaraty vem chamando de “pacote de Brasília”, que são dez itens que foram negociados no governo Lula, entre 2023 e 2024.

De acordo com documento do governo brasileiro sobre o acordo, “o Brasil propôs ajustes nos termos que haviam sido tratados no passado, com vistas a preservar o uso do poder de compra do Estado como ferramenta da nova política industrial brasileira”. Ficarão de fora do tratado, por exemplo, as licitações do Sistema Único de Saúde (SUS).

A intenção do acordo UE-Mercosul é permitir competitividade de estrangeiros em contratações públicas e limitar aquelas feitas sem licitação. Assim, empresas europeias não poderiam ser discriminadas nos processos de licitação no Brasil, por exemplo, salvo em determinados casos. Essa disposição é alinhada com a lei de licitações de 2021, que prevê que estrangeiros devem poder participar das contratações.

Antes de assinar o acordo de 2019, o Brasil negociou com os europeus situações e áreas em que o governo poderia se isentar dessa obrigação assumida com os europeus e usar as compras governamentais para promover políticas públicas. Estatais, por exemplo, podem ter preferência na contratação pelo governo. Compras de pequenas e médias empresas, para incentivar empreendedorismo social, compras para o setor de defesa e compras que sejam consideradas estratégicas para a área de saúde já estão entre as exceções previstas.

No texto de 2024, segundo o governo brasileiro, houve “exclusão completa das regras do acordo das compras realizadas pelo Sistema Único de Saúde; a preservação da possibilidade de encomendas tecnológicas; a eliminação de restrições temporais ao uso de offsets tecnológicos e comerciais; a manutenção de espaço para políticas de incentivo a micro e pequenas empresas e agricultura familiar; e a preservação de margens de preferências para produtos e serviços nacionais”.