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Crítica | "Longlegs": um novo ícone do horror contemporâneo

Filme de Oz Perkins causou empolgação nos Estados Unidos e está em cartaz nos cinemas brasileiros

Guilherme Lage

Redação Folha Vitória
Foto: Diamond Films/Divulgação

O que torna um filme de terror um clássico instantâneo? Será que para fazer alguém sentir medo no século XXI é realmente necessário lembrá-lo de que está assistindo a algo feito para assustar ou uma boa obra fala por si só? 

Pelo visto, a segunda opção parece a mais adequada, pelo menos para a crítica e para espectadores exigentes quando o assunto é roteiro.

O longa-metragem "Longlegs - Vínculo Mortal", causou certo furor quando foi anunciado. Apontado como o filme mais assustador da década, a obra dirigida por Oz Perkins fez jus ao "hype" causado pelo trailer ao chegar às salas de cinema brasileiras.

Em linhas gerais, o filme causa medo por uma receita clássica do horror (e clássicos só ganham este status por funcionarem). 

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Na trama, Lee Harker, uma agente do FBI vivida por Maika Monroe, mergulha em uma investigação quase obsessiva para solucionar crimes atribuídos a um serial killer chamado "Longlegs", interpretado por Nicolas Cage.

Tudo no filme é feito para causar medo. Mas isso não quer dizer que a todo o tempo haverá sanguinolência hollywoodiana, facadas e mortes que fariam Michael Myers corar. Não, o que existe ali é uma construção lenta, é um fósforo que se queima aos poucos. 

Os cortes de câmera, a trilha sonora, a ambientação nas cinzentas manhãs dos invernos estadunidenses, agem como uma forma de causar inquietação e angústia. Há um sentimento de desesperança latente que permeia toda a obra.

Talvez, essa construção seja o que tornou filmes como "A Bruxa" (2015) e "Babadook", do mesmo ano, além de "Hereditário" (2018),  clássicos contemporâneos do gênero. Em todos esses filmes, assim como em "Longlegs", há uma sensação de que algo está à espreita. 

É como andar em uma floresta escura, sabendo que alguma coisa te vigia, mas ela não se mostra, você não sabe o que está enfrentando. E isso causa uma das mais aterradoras sensações humanas: a impotência.

Os personagens

Os personagens também ajudam bastante no envolvimento com a trama. Todos são excêntricos do seu próprio jeito. Lee é uma casca de ser humano. Há sempre uma aura de apatia e desinteresse na forma como se comunica com as pessoas. Ainda é consciente do que faz, mas não age como alguém  comum.

A mãe, Ruth, por outro lado, vivida por Alicia Witt, é alguém que parece já ter desistido há tempo. Sua relação com a filha se resume a alguns esporádicos telefonemas. Em sua vida, há apenas espaço para a "religião" e para estranheza, o marasmo.

Apesar da pregressa fama de canastrão, Nicolas Cage está simplesmente espetacular e inacreditavelmente assustador como o antagonista principal da trama. Capaz de gelar a espinha do mais corajoso dos frequentadores de salas de cinema.

O personagem Dale Cobble, interpretado por ele, não é apenas um choque visual (Cage está irreconhecível). Um fã da banda T. Rex, Cobble é quase que a manifestação de um roqueiro glam saído diretamente do inferno. 

Com roupas que evocam o gênero musical famoso no início dos anos 1970 e o rosto coberto por pó branco que busca cobrir inúmeras cicatrizes, tentando lhe conferir algum ar de "normalidade".

E isso é justamente um dos trunfos do personagem. Não há nada normal sobre Cobble. Aqui estamos falando de um homem inadequado, desajustado, sem lugar no mundo. 

A interação com outras pessoas varia do aterrorizante para o simplesmente patético. E é esta inquietação, esse constrangimento que causa aos outros que o transforma em um vilão completamente arrepiante.

E se fosse eu? 

O filme se constroi em um ambiente de familiaridade. Quem morre são as pessoas normais, homens comuns que cometem crimes brutais em dias tão ensolarados quanto um cartão-postal vendido em qualquer posto de gasolina norte-americano. 

Ali não há lugar para gentileza. Os assassinatos representam a completa destruição da utopia de uma vida  tranquila, a total aniquilação da sensação de segurança que temos em nossos núcleos familiares, aparentemente perfeitos para quem observa de fora. 

E esta é a grande ideia de mesclar uma investigação policial ao horror psicológico e sobrenatural, o que é sempre bem-vindo. 

Pois sejam os homicídios o resultado de um pai que surtou e se cansou de sua vida suburbana, ou obra do "Homem Lá de Baixo, Debaixo de Todos os Lugares", como diz Cobble, a perda é algo que acontece a todos, e ninguém pode escapar da brutalidade da vida - ou da morte. 

O meio termo por aqui não existe 

No fim, "Longlegs" não é um filme feito para assustar, e sim para angustiar. A obra se escora em uma boa história e na atmosfera, é preocupada em ter uma ótima trama antes de ser um terror para causar pulos das poltronas, os famigerados "jumpscares". 

Talvez seja uma obra que agrade e muito os admiradores de "O Bebê de Rosemary", e deixe muito p da vida os fãs de "Invocação do Mal".