A família do maestro e professor de música Wagner Carneiro Leão não acredita que a morte do atleta amador após o acidente ocorrido durante uma corrida de obstáculos no Espírito Santo, no último sábado, tenha sido uma fatalidade.
O irmão do corredor, Fábio Carneiro Leão, alega que houve negligência. “É óbvio que queremos que pessoas sejam punidas pelo acontecido. Nossa família está transtornada. Houve negligência e alguém precisa ser responsabilizado por isso”, disse.
De acordo com a organização da King’s Race, Wagner largou na segunda bateria, 10 minutos após os primeiros 50 corredores terem saído no primeiro pelotão. Ao passar pelo quinto obstáculo, foi atingido por uma palmeira que estava sendo utilizada como apoio para uma corda, onde o corredor precisava subir.
Para Fábio, a justificativa da empresa não convence. “Existe uma divergência entre o que a organização do evento afirma e o que as pessoas que participavam da prova junto com o Wagner dizem. Segundo a King’s Race, 50 corredores passaram na frente dele. No entanto, os participantes alegam que ele foi o sexto a passar pelo obstáculo. Na verdade, esse número não importa, já que a prova era para 300 corredores e teria que ter segurança para todos eles”, afirma.
Fábio afirmou ainda que a família aguarda apenas o resultado do laudo da perícia para avaliar as medidas jurídicas que serão tomadas. “São dois discursos e alguém está falando uma inverdade”.
Sobre a assistência dada pela empresa que organizou a King’s Race, o irmão de Wagner afirma: “A gente nem questiona o suporte e o apoio. É o mínimo a ser feito nesse caso. As pessoas pagaram para participar do evento e não foi brincadeira o que aconteceu. Gostaria que os culpados fossem punidos. Meu irmão era um cara fantástico e queremos que isso seja tratado com a dignidade que ele merece”.
“Não tem como não ter sido uma triste fatalidade”, diz organizador
O organizador da King’s Race, Marco Pena, conversou com o Blog Corrida de Rua, e reafirmou ter procurado o Corpo de Bombeiros e solicitado uma vistoria nos obstáculos. No entanto, a corporação alegou que somente obstáculos superiores a cinco metros de altura necessitavam de testes, o que não era o caso.
“Fui informado que só precisava de uma ambulância no local. Solicitei, inclusive, a do Corpo de Bombeiros. Como me foi negada, contratei uma particular. Também solicitei, por precaução, a presença de um salva-vidas, já que a passagem por um rio fazia parte do percurso. A Prefeitura de Vila Velha também foi acionada e informada sobre a realização do evento”.
Mesmo diante da negativa sobre a necessidade da vistoria, o empresário pediu a avaliação “informal” de alguns amigos militares sobre a utilização de árvores como suporte para os obstáculos. “Esse tipo de suporte é muito utilizado em procedimentos militares e em muitos esportes. Em Venda Nova do Imigrante, por exemplo, onde temos o maior arvorismo da América Latina, as árvores são âncoras de diversos obstáculos”.
Pena acredita que o acidente foi uma fatalidade, já que todos os procedimentos de segurança foram levados em consideração durante a avaliação sobre a utilização da palmeira naquele obstáculo. “Tivemos uma série de cuidados e avaliações. Olhamos se a planta estava podre ou com problemas em sua estrutura que pudessem impedir a sua utilização. Não foi o caso. Jamais imaginaríamos que uma palmeira, nativa da região, plantada há décadas, saudável e sem cupins, não aguentaria o peso de uma corda de 30 quilos e dos atletas”.
Sobre a alegação da família de que há divergências nas informações sobre o número de pessoas que teriam passado pelo obstáculo antes de Wagner, o organizador da King’s Race explica: “A gente acredita que o Wagner respeitou a ordem de chamada da largada das baterias. Pela numeração, ele realmente largou 10 minutos após os 50 primeiros corredores”.
Por fim, Marco Pena insiste que o acidente foi mesmo uma fatalidade. “Não tem como não ter sido uma triste fatalidade. Estamos chocados ainda e eu só posso dizer que lamento o que aconteceu. Acredito que foi uma fatalidade e jamais imaginaríamos que uma palmeira, naquela espessura, poderia não suportar o peso da corda e cair”.
Polícia não investiga
Outro irmão de Fábio, José Rui Carneiro Leão, registrou, no final de semana, o boletim de ocorrência sobre a morte de Wagner em uma delegacia do Espírito Santo. No entanto, a assessoria de Comunicação da Polícia Civil informa que não há investigação aberta pela corporação sobre o caso.
O Corpo de Bombeiros, por sua vez, alega, via assessoria de imprensa, que não fez nenhuma vistoria no local do evento. “Por se tratar de um evento privado e em área aberta é de responsabilidade do organizador do evento fazer a avaliação da estrutura antes e após o evento”, diz a nota encaminhada ao Blog Corrida de Rua.
O laudo oficial sobre a causa da morte de Wagner sai em até 30 dias, segundo informações da assessoria de imprensa da Polícia Civil do Espírito Santo. Na certidão de óbito, que o Blog Corrida de Rua teve acesso junto à família, a causa da morte é descrita como “hemorragia retroperitoneal e pélvica, fratura pélvica, traumatismo contuso, traumatismo pélvico contuso”.
Ou seja, a palmeira atingiu a região pélvica (na altura da cintura) de Wagner no momento em que ele passava pelo obstáculo. O impacto da batida provocou fratura e hemorragia, levando o corredor à morte minutos depois de ter sido socorrido para o Hospital São Lucas, em Vitória.
Mudança de vida
Wagner Carneiro Leão tinha 39 anos e começou a correr no ano passado. Perdeu 50 quilos e participou de diversas provas de corrida tradicionais realizadas no Rio de Janeiro. Ele veio ao Espírito Santo para participar exclusivamente da King’s Race. “A corrida realmente mudou a vida dele. Era obeso e com um ano correndo conseguiu resgatar a sua auto-estima. Ele estava muito feliz antes de morrer, por isso, toda a família está muito consternada”, conta Fábio.
Antes da morte do corredor, a família precisou lidar com outra tragédia. A morte do filho adolescente de Wagner durante um acidente de carro ocorrido há três anos. “O Wagner passou por um processo de depressão após a perda do filho e, embora a corrida tenha sido inserida na vida dele anos depois, acredito que o esporte também o tenha ajudado a superar essa perda”, avalia o irmão.