A FLEXIBILIZAÇÃO DAS REGRAS DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL DA EMPRESA (“CRAM DOWN”)

Para que seja viabilizado o pedido de recuperação judicial de uma empresa em apuros, é necessário atender aos requisitos da Lei 11.101/2005, dentre eles, por exemplo, a reunião de toda a documentação necessária, a formulação de um plano de soerguimento econômico e financeiro que, por sua vez, precisará ser aprovado em assembléia geral de credores por meio do voto de mais da metade do valor total dos créditos ali representados, para que então seja homologado pelo juiz.

Entretanto, questiona-se: é possível flexibilizar esses requisitos para que a recuperação judicial seja concedida forçadamente? Sim, é possível, contudo, não de forma corriqueira, mas de modo excepcional, através do mecanismo que o ordenamento jurídico brasileiro importou do sistema norte-americano denominado de cram down, e que está presente em toda a extensão do artigo 58 da lei citada no parágrafo acima.

Incumbe apenas ao magistrado aplicar a cram down, e isso dependerá do resultado da reprovação do plano de recuperação em assembléia geral de credores, como também dos seguintes requisitos cumulativos: I – o voto favorável de credores que representem mais da metade do valor de todos os créditos presentes à assembléia, independentemente de classes; II – a aprovação de 2 (duas) das classes de credores nos termos do art. 45 desta Lei ou, caso haja somente 2 (duas) classes com credores votantes, a aprovação de pelo menos 1 (uma) delas; II – na classe que o houver rejeitado, o voto favorável de mais de 1/3 (um terço) dos credores, computados na forma dos §§ 1º e 2º do art. 45 desta Lei.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ), em 2018, produziu julgamento importante sobre matéria, por intermédio do Recurso Especial nº 1.337.989, proveniente de São Paulo, cuja relatoria foi atribuída ao Ministro Luis Felipe Salomão, onde foi estabelecida a invalidade da reprovação do plano de recuperação, porque, em resumo, entendeu-se que os respectivos credores estavam nutridos de sentimentos individualistas no ato da sua votação.

Portanto, a partir do entendimento do STJ, com muito cuidado e excepcionalmente o cram down pode ser aplicado pelo magistrado, visando coibir o abuso do direito de voto em assembléia geral de credores, preservando-se a empresa em recuperação judicial com meios que possibilitem a superação da crise, mantendo-se ativa a sua fonte de emprego e renda, para que continue cumprindo a sua função social.

Raphael Wilson Loureiro Stein é Associado do Escritório desde abril de 2019 e atua nas áreas: Contencioso Civil, Comercial e Recuperação de Empresas e Falência.

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