Quem nunca se deparou com a seguinte situação: ao promover a compra ou contratação de um serviço se viu obrigado a também adquirir outro, igual ou não? Ou seja, para que fosse possível a aquisição de algo (seja um produto ou um serviço) seria necessária e indispensável a aquisição de um segundo item, condicionando a venda ou a prestação de um serviço a outro.
Tal conduta, muito praticada no mercado, se chama venda casada e é vedada pelo Código de Defesa do Consumidor, sendo considerada como prática abusiva. A legislação consumerista dispõe no art. 39, inciso I: Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: I – condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos”.
Um exemplo clássico sobre o tema é a venda casada de pacotes de TV, internet e telefone. Veja que em algumas situações nunca é possível adquirir apenas um serviço, estando este vinculado necessariamente à aquisição de uma segunda modalidade, ou seja, para a contratação da internet banda larga é indispensável a aquisição do serviço de telefonia, ou ainda de TV a cabo.
Notem que não haveria qualquer óbice à oferta de tais serviços de forma separada, se realizada mediante a apresentação de um preço justo e condizente com a prestação do serviço, o que afastaria a incidência da norma legal mencionada acima.
Contudo, tais ofertas sempre são acompanhadas de uma proposta comercial tentadora financeiramente, o que leva ao consumidor à contratação de vários itens, ainda que esteja precisando de apenas um dos serviços.
Observem: para que o consumidor tenha direito ao “preço tentador” (geralmente um excelente desconto) é indispensável a contratação de dois serviços! Assim, o condicionamento da prestação de um serviço a outro torna a oferta ilegal e contra as regras de consumo.
Outro exemplo muito visto é a imposição realizada em contratos de financiamento habitacional, nos quais a instituição bancária obriga o contratante a adquirir um seguro por ela ofertado, ou ainda, exige que a contratação do seguro se dê necessariamente com um terceiro por ela indicado. Da mesma forma do exemplo anterior, não haveria conduta ilegal a exigência de contratação de seguro para o bem financiado, desde que o contratante tivesse a liberdade de escolha do segurador, podendo livremente pactuar a cobertura e optar, dentro das exigências do agente financeiro, por um contrato de seguro mais acessível.
Por fim, o exemplo mais clássico é a proibição do consumo de produtos em salas de cinema que não tenham sido adquiridos nas bombonieres do local, vedando o consumidor ingressar nas salas de cinema com alimentos adquiridos em outros locais ou até mesmo de levá-los de casa.
Vale frisar que a prática de venda casada, além de ilícita (contra a lei), é considerada crime contra as relações de consumo, previsto no art. 5º, II, da Lei nº 8.137/90, todavia, a análise quanto à ocorrência de venda casada é subjetiva e dependerá das nuances de cada caso.
Insta finalizar consignando que o consumidor que se sentir lesado pela prática mencionada pode buscar as vias administrativas e judiciais para ver reparado o dano decorrente de tal conduta.
Rovena Roberta S. Locatelli Dias, sócia de Carlos de Souza Advogados, especializada em Direito Civil, Médico, Comercial e Imobiliário.
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