LIMITAÇÃO DE TRATAMENTOS DE SAÚDE POR PLANOS E SEGUROS

Na semana passada, o Superior Tribunal de Justiça – STJ concluiu julgamento sobre um tema muitíssimo sensível para a maior parte dos brasileiros, beneficiários de planos de assistência à saúde, ou seguros saúde, e que dependem de tratamentos médicos diferenciados ou de alto custo.

A decisão do STJ teve grande repercussão em diversos veículos de imprensa, mas foi pouco comentada ou esclarecida quanto aos seus impactos na chamada “judicialização da saúde”.

Isto porque o sistema processual brasileiro, na intenção de manter-se o mais perto da coesão e coerência, adotou a teoria dos precedentes, ou seja, a tendência é que os juízes e tribunais do país acompanhem a decisão, ou precedente do STJ nos casos concretos que forem conduzidos à apreciação do Judiciário, ou que já estejam em processamento, pendentes de decisão final, tais como aqueles em que foi concedida decisão liminar – provisória – em todos os municípios e estados.

Assim, cumpre esclarecer que o STJ decidiu, em resumo, que: o rol de procedimentos e eventos em Saúde Suplementar é, em regra, taxativo;  a operadora de plano ou seguro de saúde não é obrigada a arcar com tratamento não constante do Rol da ANS se existe, para a cura do paciente, outro procedimento eficaz, efetivo e seguro já incorporado ao Rol; é possível a contratação de cobertura ampliada ou a negociação de aditivo contratual para a cobertura de procedimento extra Rol; não havendo substituto terapêutico ou esgotados os procedimentos do Rol da ANS, pode haver, a título excepcional, a cobertura do tratamento indicado pelo médico ou odontólogo assistente, desde que: (i) não tenha sido indeferido expressamente, pela ANS, a incorporação do procedimento ao Rol da Saúde Suplementar; (ii) haja comprovação da eficácia do tratamento à luz da medicina baseada em evidências; (iii) haja recomendações de órgãos técnicos de renome nacionais (como CONITEC e NATJUS) e estrangeiros; e (iv) seja realizado, quando possível, o diálogo interinstitucional do magistrado com entes ou pessoas com expertise técnica na área da saúde, incluída a Comissão de Atualização do Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar, sem deslocamento da competência do julgamento do feito para a Justiça Federal, o que se poderia aventar com a inclusão da ANS nos litígios sobre o tema.

Quando se estabelece a expressão “em regra”, é possível concluir que a regra trará exceções. Os ministros do STJ inclusive fizeram constar em seus votos que a decisão tem por finalidade resguardar a maior parte dos beneficiários que poderiam ser prejudicados se os planos tivessem de arcar com ordens judiciais para a cobertura de procedimentos fora da lista da autarquia, e por vezes concedidas de forma “indiscriminada”. O voto assevera a necessidade de respeito à lista para garantir que a introdução de novos medicamentos seja precedida de avaliação criteriosa da ANS, especialmente em relação à eficácia dos tratamentos e à adoção de novas tecnologias em saúde, afirmando que ainda que a lista seja taxativa, há situações em que é possível ao Judiciário determinar que o plano garanta ao beneficiário a cobertura de procedimento fora do Rol, a depender de critérios técnicos e da demonstração da necessidade e da pertinência do tratamento,  admitindo-se a comprovação da necessidade e adequação para o paciente por meio de perícias técnicas e laudos que assegurem a pertinência do tratamento de saúde que esteja fora do rol no caso concreto.

Ademais disso, o sistema processual brasileiro, embora preveja a adoção de precedentes, permite que os julgadores das instâncias inferiores ao STJ, em decisões monocráticas ou colegiadas, como no caso dos tribunais estaduais, por exemplo, adotem entendimento diverso da corte superior, desde que de maneira fundamentada, demonstrando a existência de distinção, ou diferença, no caso concreto em julgamento e a decisão em comento.

É bom que se diga que a referida decisão não afasta a possibilidade de que a matéria seja enfrentada ainda pelo Supremo Tribunal Federal, vez que a saúde é tema pulsante e direito social previsto no art. 6º da Carta Constitucional.

Deve-se acrescentar que o STJ veio cumprir seu papel de julgar uma questão para a qual, pelo menos até o momento, não há previsão legal específica, sendo que no Senado Federal a limitação ou taxatividade do Rol da ANS tem sido visitada por alguns projetos de lei em tramitação, o que poderá vir a alterar o atual cenário em eventual votação de tais proposições normativas.

Chrisciana Oliveira Mello, sócia de Carlos de Souza Advogados, aluna especial do curso de mestrado em Processo Civil da Universidade Federal do Espírito Santo.

Foto: Agência Brasil

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