Neste mês, o Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu, por unanimidade, que a atriz e modelo Luiza Brunet não possui direito à metade do patrimônio do empresário com quem manteve um relacionamento. Cabia à ela comprovar que o relacionamento se constituía em uma união estável para se apurar os efeitos na esfera patrimonial no período em que se relacionaram, de 2012 a 2015.
No entanto, o TJSP conclui que o casal manteve um namoro e não a união cujo reconhecimento pretendia a atriz/modelo, assim como os seus efeitos. Independentemente dos fatos que originaram o fim do relacionamento (pautado em alegações de agressões), a finalidade deste processo estava adstrita às consequências do convívio na esfera patrimonial do casal.
Perceba que em tempos de pandemia e de isolamento social, alguns casais de namorados decidiram morar juntos, mas isso significa que o namoro teria evoluído para uma união estável? Trata-se de uma preocupação para muitos casais que optam por “dar este passo a mais” na relação. Para responder tal pergunta é necessário conceituar os dois tipos de relacionamento.
Esclareça-se, de plano, que a união estável é caracterizada pela convivência pública, notória, contínua e com vontade de constituir família. Já o namoro qualificado se caracteriza por uma evolução do relacionamento, que adentra a uma nova fase, em que as pessoas estão juntas, desejam estar juntas, mas não têm a intenção de constituir uma família, pelo menos não ainda, naquele exato momento da relação.
Portanto, o simples fato de se morar junto não caracteriza a união estável, ao passo que é possível morar em casas separadas e haver uma estabilidade da relação suficiente para caracterizá-la como união estável. Afinal, a significativa subjetividade que envolve o tema tem influenciado muitas pessoas a procurarem a justiça para definir o tipo de relação e seus efeitos no patrimônio do casal.
Em 2015, o Superior Tribunal de Justiça precisou enfrentar o tema e passou a entender que o “namoro qualificado” é aquele em que o casal até convive sob o mesmo teto, mas não enseja o direito de partilha dos bens adquiridos neste período por um dos namorados. Naquela oportunidade, o ministro Marco Aurélio Bellizze, da Terceira Turma do STJ, entendeu que não houve união estável, “mas sim namoro qualificado, em que, em virtude do estreitamento do relacionamento, projetaram, para o futuro, e não para o presente, o propósito de constituir entidade familiar”, e nem o fato de ter existido a coabitação do casal foi suficiente para evidenciar uma união estável, já que a convivência no mesmo imóvel se deu apenas por conveniência de ambos, em razão de seus interesses particulares à época.
Assim, a situação examinada se caracteriza como um namoro qualificado, pois não estava presente a intenção de constituir família naquele momento do relacionamento. Com efeito, notou-se que, apesar de viverem sob o mesmo teto, se tratavam, eram conhecidos e reconhecidos no meio em que viviam apenas como namorados.
Fato é que, em tempos de pandemia, a conveniência tem ditado a coabitação de alguns casais de namorados, o que não significa que tenham evoluído para uma estabilidade tal na relação que possa ser considerada união estável, com efeitos patrimoniais, e sim, na maioria dos casos, trata-se de um namoro qualificado, que progrediu para a coabitação diante do cenário inédito da Covid 19.
Aconselha-se, inclusive, que o casal de namorados deixe isso bem claro para familiares, amigos e até nas redes sociais: a coabitação é, no momento, conveniente para o relacionamento.
Chrisciana Oliveira Mello, sócia de Carlos de Souza Advogados, aluna especial do curso de mestrado em Processo Civil da Universidade Federal do Espírito Santo.
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