Há uma grande frustração quando um trabalhador entra na Justiça e não consegue efetivar o recebimento, mesmo depois de obter sentença que assegura direitos que não haviam sido respeitados pela empresa, muitas vezes em um processo que dura vários anos.
Isto é muito comum: a Justiça concede os direitos ao trabalhador, aquilo é transformado num determinado valor, mas, na hora do pagamento, a empresa não cumpre e os responsáveis não possuem bens que possam satisfazer a obrigação.
Em situações assim, alguns juízes trabalhistas têm interpretado uma norma legal e agido de forma extrema contra os empresários. O fundamento legal usado por juízes está no Código de Processo Civil, que permite ao julgador determinar medidas coercitivas nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária, inclusive busca e apreensão.
Firmadas nessas disposições, certas decisões judiciais contra empresários que não honram com as sentenças trabalhistas têm chegado ao ponto de determinar a apreensão de carteira de motorista, passaporte e cartão de crédito. Segundo entendimento constante das determinações judiciais, não seria admissível que alguém que deve a um trabalhador possa ficar fazendo viagens, usando cartão de crédito ou dirigindo um carro.
Segundo uma dessas decisões judiciais: “Todas as medidas executivas cabíveis foram tomadas, sendo que o executado não paga a dívida, não indica bens à penhora, não faz proposta de acordo e sequer cumpre de forma adequada as ordens judiciais, frustrando a execução. Se o executado não tem como solver a presente dívida, também não pode ter recursos para viagens internacionais, ou para manter um veículo, ou mesmo manter um cartão de crédito”.
Sem dúvidas é muito ruim uma obrigação deixar de ser cumprida, especialmente quando se trata de verba alimentar, que é o caso dos créditos trabalhistas. Num mundo perfeito, todos cumpririam fielmente com as suas obrigações pecuniárias. Porém, como essa perfeição nas relações humanas não existe, é preciso haver um comando judicial. O que não se pode, contudo, é afrontar princípios democráticos a despeito de cobrar uma dívida justa.
É necessário que o assunto seja objeto de um debate no Congresso e se busque um mecanismo para dar mais efetividade às cobranças de dívidas trabalhistas. Isto é urgente! Realmente é lamentável ver um trabalhador sem esperanças por não ter recebido o que a Justiça lhe concedeu, enquanto o empresário devedor fica postando fotos em viagens caras!
Por outro lado, não se pode, absolutamente, afrontar garantias fundamentais de uma pessoa, mesmo que esteja com dívidas trabalhistas; garantias como a dignidade humana e o direito à locomoção (ir e vir) são absolutos.
Os tribunais trabalhistas têm sido maciços ao repelirem as decisões de juízes que determinam a apreensão de carteira de motorista, passaporte e cartão de crédito.
O entendimento dos tribunais tem sido no sentido de que “não é razoável nem proporcional limitar tal direito como forma de compelir o devedor a pagar uma dívida, ainda que de natureza trabalhista. A suspensão da CNH e o recolhimento do passaporte das executadas, de claro caráter punitivo, não se revelam adequados ou úteis à finalidade visada, qual seja, o pagamento da dívida”. Acrescenta a decisão parcialmente transcrita: “No caso, o recolhimento da CNH dos devedores e de seus passaportes, além de não ter utilidade direta na satisfação do crédito exequendo, pois não permitirá o bloqueio de bens passíveis de garantir a execução, fere direitos fundamentais de ir e vir, que protegem inclusive os inadimplentes”.
Sérgio Carlos de Souza, fundador e sócio de Carlos de Souza Advogados, autor dos livros “101 Respostas Sobre Direito Ambiental” e “Guia Jurídico de Marketing Multinível”, especializado em Direito Empresarial, Recuperação de Empresas e Ambiental.
Foto: Reprodução / Folha Vitória