Por causa da pandemia da COVID-19, o Enem 2020 está sendo realizado no início deste ano. Além disso, cerca de 50 mil candidatos farão a aplicação piloto do Enem Digital nos dias 31 de janeiro e 07 de fevereiro. Até 2026, deve ser obrigatório para todos os inscritos. A próxima edição da prova ainda contará com a redação escrita em papel, mas a versão digital nessa disciplina também parece ser inevitável.
Sair do mundo analógico para o digital pode causar um grande impacto, principalmente na prova de redação. Isso tem justificativa: o hábito diário de se trocar e-mails no computador e mensagens por celulares não envolve todos os sentidos de que escreve um texto à mão.
Na visão dos professores e pesquisadores Daniel M. Oppenheimer e Pam A. Mueller, que publicaram o artigo “A caneta é mais poderosa do que o teclado”, no renomado jornal Psychological Science, escrever à mão requer um processo cognitivo distinto do envolvido em teclar. E vão além. Quem anota manualmente tem que ouvir, digerir e resumir a informação, pois não alcança a velocidade obtida ao digitar. E assim se captura a essência do conteúdo, obrigando o cérebro a se esforçar, o que aumentaria a compreensão e a retenção dos dados.
Dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) do Enem 2019 mostraram que dos 5,1 milhões de candidatos ao exame, a maioria tinha entre 21 e 30 anos, ou seja, usuários intensos do meio digital.
Quando uma pessoa tecla, o cérebro não necessariamente processa o significado da informação, tornando, por vezes, o procedimento robotizado. De fato, a tecnologia nos coloca em um mundo de muitas possibilidades, o que facilita o nosso dia a dia. Mas, às vezes, limita a criatividade.
De acordo com um levantamento feito por Carolina Siequeroli, responsável pela gestão dos dados de mais de 2 milhões de redações realizadas em plataforma especializada, mais de 30 mil redações do Enem mencionaram o sociólogo e filósofo polonês Zygmunt Bauman e sua teoria da “Modernidade Líquida”. Isso comprova que modismos de autores e modelos padrão de estrutura de textos se espalham pela internet.
Conforme informações do Ministério da Educação e do Inep, a nota média da prova de redação do Enem do ano passado foi a única que subiu em comparação ao período anterior. O principal motivo das notas zero no exame foi a entrega da prova em branco, o que ocorreu com 57 mil candidatos. Outros 40 mil fugiram ao tema proposto, e 23 mil copiaram o texto apresentado no enunciado da prova.
Oppenheimer e Mueller defendem a tese de que escrever à mão com as próprias palavras, acaba recriando o texto, fazendo observações auxiliares, sínteses, conexões, conclusões pessoais, entre outros.
A cultura digital nos permite fazer mais em menos tempo, veio para ficar, mas como ela vai impactar na qualidade das redações do Enem?
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*artigo escrito por Clayton Dick, engenheiro pela POLI-USP e MBA em marketing pela FIA. Dick tem 18 anos de experiências no mercado de comunicação e educação. Atuou em diversas áreas do grupo Abril, passando por planejamento, distribuição, atendimento ao cliente, além da direção geral da Abril Coleções – unidade responsável pela produção e comercialização de cursos de idiomas, preparatórios para vestibulares e cursos de inclusão digital. Há seis anos dedica-se à Redação Nota 1000.
Bom trabalho ! Continuem cumprimentos !
Mesmo que o processo de escrever à mão tenha um aspecto cognitivo melhor, considerando o que apontam os especialistas, no próprio mundo acadêmico, raros são os casos de pessoas que escrevem à mão seus trabalhos, inclusive dissertações de mestrado e teses de doutorado. Acredito que o mundo digital dinamiza sim a nossa capacidade cognitiva, digo por experiência, porém isso requer metodologia, autoavaliação e constante aperfeiçoamento. Não faz sentido ter uma prova digital em partes, a redação tem sim que ser escrita no computador, afinal, quem é que escreve um relatório em uma empresa à mão? Rascunho, ok, mas o final deveria ser digitado, além de que melhoraria o gerenciamento do tempo, pois uma hora para pensar, rascunhar e escrever também não permite utilizar o máximo do cognitivo não, quem tira nota 1000 geralmente treinou o cérebro muitas vezes e já tem um esboço em mente, não é somente criatividade, é procedimento.