Cada indivíduo aprende de uma determinada forma para suprir uma necessidade específica. Padronizar a forma do estudo e do aprendizado é algo que está na contramão do que vem sendo debatido nas esferas educacionais. Isso porque cada vez fica mais claro que não podemos demandar que alunos ao estudar um assunto aprendam necessariamente da mesma maneira e com as mesmas metodologias. Afinal, se todos possuem bagagens, dificuldades e objetivos diferentes, é possível afirmar que também possuem formas diferentes de aprender. Ainda assim, os princípios de aprendizagem e as técnicas para melhorar o desempenho nos estudos formuladas por pesquisadores e apresentadas em artigos ao público geral tem como intuito aumentar o repertório disponível, o que significa maior oferta de possibilidades para tomada de decisões e mais ferramentas para se atender as necessidades individuais.
Com o intuito de dar sequência a série de princípios e técnicas de estudos, aqui serão abordadas técnicas mais robustas que as anteriores para melhorar o desempenho nos estudos, mas que podem compor o leque de possibilidades na hora do aprendizado.
3 dicas que ajudam a melhorar o desempenho nos estudos
aprendizagem espaçada
Apesar de ser um conceito relativamente recente, a aprendizagem espaçada (spaced learning) tem tido adotantes na montagem tanto de aula quanto de estudos. Em 2005, a revista Scientific American publicou o artigo do neurocientista R. Douglas Fields sobre a consolidação da memória de longo prazo e como alguns momentos se tornam lembranças enquanto outros simplesmente evaporam.
A pesquisa mostrou que as vias neurais (a base da memória) são formadas quando as células são estimuladas em intervalos, não em um período contínuo. Anos depois, isso foi fundamental para o neurocientista e educador britânico Paul Kelley publicar um artigo que sugeria o interessante método de formar memórias de longo prazo em um tempo reduzido, ora conhecido como aprendizagem espaçada.
O método constitui em dividir três momentos de instruções intensas e intercalá-los com pausas de 10 minutos. De acordo com Kelley, uma hora de instrução nesse modelo permite cobrir um material que levaria semanas para ser aprendido em outros métodos convencionais.
O neurocientista britânico mostra a eficiência do método comparada a outros formatos, especialmente em seu artigo (Making long-term memories in minutes: A spaced learning pattern from memory research in education, 2013), que apresenta testes realizados em jovens de idade estudantil que obtiveram reduções significativas no tempo requerido para a memorização do conteúdo.
Sobre o método, é importante ressaltar alguns pontos para sua conformidade. O período de instrução pode variar, mas Kelley aplica de 15 a 20min, no qual cada período aborda o mesmo conteúdo sob exigências diferentes.
Embora seja importante que os três momentos usem como base a estrutura apresentar, relembrar e compreender, respectivamente, nos momentos de pausa são essenciais a realização de atividades que fogem do âmbito do aprendizado, algo semelhante à técnica Pomodoro visto no artigo anterior 4 técnicas de estudos eficazes simples de serem aplicadas.
A necessidade da pausa na técnica de Kelley traz o princípio proposto por R. Douglas Fields, no qual os 10 minutos são necessários para que haja o processo químico responsável pela concepção da memória de longo prazo.
A aprendizagem espaçada pode ser aplicada tanto em sala de aula quanto em estudo individual. Aula expositiva, aula interativa com elementos de revisão e a aplicação de um problema ou teste no final, é uma das formas para se explorar a metodologia e sala.
Já o estudo individual pode ser iniciado com exposição ao conteúdo como uma videoaula ou leitura, seguido de anotação e revisão do conteúdo que foi trabalhado na primeira sessão. E, por fim, realização de exercícios acerca do conteúdo, sempre intercalando as etapas com atividades diferentes dos estudos.
sq3r
Já percebeu que nem tudo que lemos fica gravado em nossa mente? Ler de maneira passiva, sem pensar e refletir sobre o conteúdo não é uma forma eficaz de estudo, pois não há processamento de informação.
Sob essa premissa, a antiga e ainda relevante técnica SQ3R é fundamentada. No já clássico livro “Estudo Efetivo” (Effective Study, 1961), Francis Robinson descreve habilidades de estudo, oferece conselhos sobre como fazer exames e apresenta a técnica pela qual hoje tal psicólogo é lembrado.
SQ3R é uma sigla para as cinco etapas que compõem o método de leitura de livro didático. Survey, question, read, recite e review (pesquisar, questionar, ler, recitar e revisar) são as fases de contato com um texto que, se aplicadas corretamente, promovem uma maior interação entre o leitor e o conteúdo, contribuindo para uma maior assimilação. Veja abaixo cada fase de forma mais detalhada:
Pesquisar
A leitura prévia e rápida de títulos, subtítulos, figuras, gráficos e legendas do texto desperta a curiosidade do leitor, ativando e predispondo o cérebro a receber o conteúdo. A fase de pesquisa fornece uma visão geral do conteúdo que será abordado e permite a realização da fase seguinte.
Questionar
O objetivo desta fase é levantar hipóteses sobre os tópicos que serão lidos. Perguntas como “o que eu sei sobre esse assunto?”, “o que vou descobrir?”, “como relaciono esse conteúdo com o meu cotidiano?”, são formas de se manter concentrado na leitura em busca de responder às questões formuladas.
Ler
Uma leitura completa e ativa com marcação de palavras-chave e respostas às questões anteriores são os objetivos dessa fase. A texto deve ser fragmentado por tópicos e a leitura precisa ser concentrada. Portanto, formule mais questões se necessário.
Recitar
Após a leitura, nessa fase deve-se reproduzir com suas palavras o entendimento sobre o texto. Ela pode ser feita simplesmente falando, resumindo, parafraseando, anotando, entre outros. É necessário mais uma vez dividir a leitura em tópicos menores, caso o texto seja extenso, para que a recitação seja eficiente.
Revisar
Nessa etapa finaliza-se o método com a revisão do conteúdo que foi criado nas etapas anteriores.
Os princípios da SQ3R são ecoados em outras obras, como o clássico “Como ler livros”, de Mortimer Adler e Charles Van Doren (1972). Mas também em ações cotidianas que fazemos ao interagir com um conteúdo textual mesmo que inconscientemente. Isso demonstra a força do método que também serve como base para outras técnicas de estudo.
pq4r
A PQ4R é uma atualização da SQ3R. A etapa inicial “Preview” (pré-observação) é análoga a fase de pesquisa da técnica anterior, no qual a diferença está na inserção de um novo “R”, o “Reflect” (refletir), após a leitura. Dessa forma, são as fases desse método: pesquisar, questionar, ler, refletir, recitar e revisar. A execução das etapas é a mesma elaborada por Robinson, entretanto, a reflexão agrega força ao método anterior, como observa-se abaixo:
Refletir
Ao refletir, deve-se pensar sobre o que as informações contidas no texto representam ou significam para você. Sendo assim, a reflexão pode ser feita durante ou após a leitura e, em ambas, se têm a forma mais eficiente.
Além disso, realizar pausas durante a leitura pode melhorar a compreensão do assunto. Nessas pausas, perguntas devem ser levantadas, como, por exemplo, o impacto do assunto estudado em algo que faz parte de sua realidade ou como os tópicos do texto estão relacionados, se esses tópicos possuem a totalidade da informação que buscada, entre outros.
A etapa de reflexão adiciona novas questões durante e após o texto de modo que a leitura se torna mais ativa, permitindo uma reação mais constante do leitor ao conteúdo.
A reação ao texto – como elaboração perguntas, criação imagens mentais, uso do conhecimento prévio para ancorar o conteúdo novo e produção de inferências – são formas ativas de leitura que auxiliam na retenção de informação e estão entre as sete chaves da compreensão (The 7 Keys to Comprehension, 2003), de acordo com as consultoras educacionais Susan Zimmerman e Chryse Hutchins.
A inserção da reflexão em um método tradicional reforça a necessidade de atualização de técnicas e que dificilmente haverá um método que sirva para todos. A beleza da unicidade está nesse ponto, o que não serve para um, pode ter um encaixe ideal para outro, mas ambos podem adaptar para si, algo que já é pré-estabelecido.
No entanto, os métodos não devem ser tratados como universais ou imutáveis, o que o vasto número de pesquisas sobre perfis de aprendizagem demonstra com facilidade a partir da diversidade de arquétipos existentes. Aumentar o repertório de técnicas possibilita uma maior capacidade de combinação gerando alternativas que supram as particularidades na hora de estudar.
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*artigo escrito por Lorenzo Ferrari Assú Tessari, especialista em aprendizagem e metodologias de ensino. Formado em Ciências Biológicas pela Ufes, mestre em Engenharia de Bioprocessos e Biotecnologia pela UFPR, e diretor e cofundador da Gama Ensino e da Anole.