As empresas precisam crescer para enfrentar seus desafios, seja por conta do aumento da demanda de seus clientes, para ganhar market-share, pela necessidade de atrair investidores, para diluir custos fixos crescentes, para adquirir escala e foco, enfim, para aumentar sua competitividade num mundo cada vez mais global.
Na década de 80 iniciavam-se as fusões e aquisições na América do Norte e na Europa. Os Tigres Asiáticos se desenvolviam rapidamente, a China fazia uma transição de uma economia fechada para um capitalismo de estado controlado pelo governo, a Indonésia plantava florestas de eucalipto numa velocidade muito forte, gerando uma concorrência cada vez maior no campo da indústria de celulose e papel.
Tínhamos, por exemplo, uns 25 grandes compradores de celulose para fabricação de papéis para o bem-estar pessoal e, de repente, passamos a ter não mais que meia dúzia de clientes após inúmeras fusões e aquisições, o que lhes dava um poder de negociação muito forte. Do lado dos fornecedores de equipamentos, as fusões e aquisições passaram a ter também um papel preponderante e aumentava incrivelmente seu poder de precificação dos equipamentos que usávamos na produção.
Precisávamos, então, aumentar nossa competitividade, crescer e buscar diferenciações para enfrentar tantos desafios. E o mundo se mostrava aberto ao crescimento, com o recente aumento de preços das commodities, puxado pela Ásia, e pelo início da nova arrancada americana após as reformas do presidente Ronald Reagan. Mas não podíamos esquecer que tínhamos também um dever de casa a ser feito dentro de nosso estado, que era conseguir a aprovação ambiental e social para crescer, além de todas as demais licenças e financiamentos ao projeto.
Montamos um plano de trabalho e buscamos pô-lo em prática para, de forma harmônica, obter tais licenças, construindo talvez o primeiro grande relatório de impacto global de um grande projeto no estado do Espírito Santo. Este relatório, tão complexo quanto extenso, ensinou muita coisa às empresas e ao governo do estado, provocando uma mudança de paradigma neste campo.
Ao mesmo tempo, tratamos de enfrentar a questão do odor, analisando tecnicamente suas causas e efeitos, envolvendo a sociedade com a formação pioneira de uma Rede de Percepção de Odor composta por terceiros interessados genuinamente em nos ajudar a identificar problemas internos e externos, variáveis meteorológicas e outros dados. Colocamos todos os recursos possíveis para achar as soluções e, com a ajuda desta Rede, em poucos meses encontramos o bom caminho e de lá não mais nos afastamos.
No plano florestal, decidimos reduzir drasticamente os novos plantios no estado e fomos nos licenciar na Bahia, onde formamos um novo campo com florestas bastante produtivas, embora mais distantes de nossas fábricas. Também iniciamos um projeto de fomento ao plantio do eucalipto em áreas degradadas de pequenos fazendeiros, municiando-os de tecnologias, dos cuidados ambientais, das melhores mudas, de financiamentos diretos e de assistência técnica e financeira, dando-lhes a garantia de compra da madeira por preços justos e balizados pelo mercado.
O plano teve um início lento e gradual e, após ganhar a confiança daqueles pioneiros, teve um grande desenvolvimento tanto no Espírito Santo quanto no sul da Bahia, envolvendo hoje mais de 3000 fazendeiros, com uma área média plantada de 12 hectares de terras antes totalmente sem produção. Há hoje uma grande aceitação deste programa no estado e, posteriormente, o próprio governo passou a incentivar novos plantios, já que temos no estado mais de 400 mil hectares de terras degradadas e subutilizadas, que podem ser bem aproveitadas pelo reflorestamento. Ele reduz a erosão, melhora a qualidade do solo, substitui o uso de árvores da mata Atlântica e gera renda no campo, em áreas atualmente sem qualquer utilização. A biomassa já é e continuará sendo, com certeza, um produto fundamental na mudança da matriz energética do mundo, para a redução do aquecimento global e para a produção de energia. E o Espírito Santo tem excelente grau de conhecimento e tecnologias já prontas para uso neste campo.
Ainda na floresta, mudou-se a forma da colheita das árvores, substituindo-se as motosserras e introduzindo as máquinas colheitadeiras, mais seguras, mais confortáveis e mais produtivas. Tivemos um bom ganho de produtividade e uma grande redução do número de acidentes de trabalho e, portanto, de passivos trabalhistas. Novas empresas vieram para o Estado por conta desta mudança tecnológica.
Na área industrial, tomamos diversas medidas pioneiras no estado, como o uso do gás natural mais limpo em substituição ao óleo combustível, a construção de barcaças marítimas especiais para trazer nossa madeira do sul da Bahia, com cada barcaça substituindo cerca de 100 caminhões, reduzindo o consumo de óleo diesel, portanto, de CO2, e diminuindo o fluxo das estradas, com consequente redução do número de acidentes de trânsito.
Construímos a fábrica-B, que reduziu o consumo de água quase à metade. Reduzimos fortemente o lançamento de efluentes, graças à construção de seis lagoas de aeração destes efluentes, fazendo com que sua carga final, mesmo com as duas fábricas, fosse menor do que tínhamos com uma só fábrica. Sem dúvida, um grande avanço da tecnologia. O efluente tratado já era lançado via emissários submarinos a mais de 1500 metros mar adentro e, durante anos, tem sido mantido um monitoramento no entorno destes emissários, sob o controle das autoridades competentes, demonstrando resultados compatíveis com os melhores do mundo neste setor.
Mas acho que a medida mais importante tomada foi a determinação de criar e fomentar empresas prestadoras de serviços que pudessem atuar nas áreas de manutenção, montagem industrial, construção e outros serviços. Começamos dando oportunidades a alguns de nossos melhores quadros, que tinham o sonho do empreendedorismo, incentivando-os a formar pequenas empresas que foram crescendo, tornaram-se campeãs e hoje prestam serviços Brasil afora. Incentivamos sua qualificação, participação em nossos cursos internos, nos programas de qualidade e certificação. Isso deu tão certo que levamos este programa embrionário para a Findes, que o abraçou e o transformou no grande sucesso que é hoje o Prodfor, Programa de Desenvolvimento de Fornecedores do Espírito Santo.
Nosso lema, colocado abertamente aos empreendedores do estado quando da instalação de novos projetos era: se vocês têm qualidade, preço e prazo daremos preferência aos fornecedores capixabas, como prova de nosso apreço pelo desenvolvimento do estado e de nossa região de influência. Mas eles teriam de assumir o compromisso de reinvestir seus lucros na empresa, e não sair por aí comprando fazendas, carros importados e outras manias comuns ao sucesso inicial das pequenas e médias empresas. Acho que o recado foi levado a sério e o que se viu foi a consolidação de inúmeras empresas capixabas que se tornaram conhecidas mundo afora.
Hoje são mais de 60 empresas que gravitam na cadeia produtiva da Fibria e, com humildade, mas com muita determinação, construímos uma nova imagem, que muito nos facilitou no diálogo e no entendimento com autoridades e sociedade, no crescimento da empresa. Saímos da autossuficiência para interdependência.
Além destas medidas de ordem prática e de grande impacto na vida econômica e social de nosso entorno, a empresa optou, de forma transparente, por aumentar também seu diálogo com a sociedade civil, com várias organizações não governamentais. Passou a apoiar projetos sociais voltados principalmente para a educação, como o Projeto Formar, que dava treinamento anualmente a mais de 600 professores de municípios com menores recursos, visando seu aprimoramento e melhor aproveitamento dos alunos. Continuo achando a educação fundamental para as transformações que se avizinham em nosso estado. Passou também a buscar melhorias em sua governança e foi a primeira empresa brasileira no setor florestal a ser certificada pelo Índice Dow Jones de Sustentabilidade, um dos mais importantes índices desta categoria.
Mas nem tudo eram flores…! Construímos uma boa imagem, investimos cerca de 1,2 bilhão de dólares para construir a segunda fábrica, duplicamos nossa capacidade, e aí veio a crise asiática, o Brasil enfrentava uma inflação galopante que mascarava improdutividades, que gerava pobreza numa velocidade nunca vista, acabava com os salários no meio do mês, subia custos num ritmo alucinante, remarcava preços duas ou até três vezes ao dia nos supermercados. Enfim, um tempo muito difícil que tínhamos pela frente, com a dívida do projeto e com tantas incertezas dentro e fora do país. Como enfrentar esses novos desafios?
Falarei mais sobre isto nos próximos artigos.
Carlos Aguiar