Publicou-se na edição de 26 de janeiro da revista The Economist o resultado de uma interessante pesquisa de opinião. Aproximadamente 18% das pessoas consideram que os líderes de negócios dizem a verdade; para os líderes políticos, apenas 13%. O que pode ser feito? A resposta da matéria merece alguma reflexão da nossa parte: grande parte da resposta está em dar mais transparência, ou seja, aumentar o rigor na prestação de contas dos líderes políticos e melhorar efetivamente a regulação econômica para conter os abusos corporativos.
Desde o movimento de reforma gerencial do Estado brasileiro nos anos 1990, as importâncias da prestação de contas e da regulação das atividades econômicas ganharam relevância. Desestatizações com vieses de mercantilização dos serviços públicos, concomitante às privatizações e/ou concessões ocorridas em diversos setores, fizeram com que essa temática da regulação ganhasse destaque, apesar de não se tratar de um assunto popular.
Objetivando sintetizar qualificadamente essa discussão, iniciaremos com uma pergunta formulada por Robert Boyer em Teoria da regulação (Estação Liberdade, 2009: 46-7): Dada a multiplicidade de formas institucionais de uma economia capitalista, quais os mecanismos capazes de garantir sua coerência e sua viabilidade ao longo do tempo? O autor busca responder a esta questão:
Em primeiro lugar, podemos observar ex post a compatibilidade de comportamentos econômicos associados às diversas formas institucionais. Em seguida, quando surgem desequilíbrios e conflitos que não podem ser resolvidos na configuração presente, é necessária uma redefinição das regras do jogo que codificam as formas institucionais (p. 47).
Ao longo desse processo, a esfera política é diretamente mobilizada para definir os modos de regulação. Nesse sentido, ainda segundo Boyer, a ilusão de uma economia pura, isto é, totalmente independente do âmbito jurídico-político, deve, portanto, ser abandonada (p. 48). No mundo real, dificilmente constata-se que a concorrência independa da intervenção pública inteligente. Citando Boyer novamente:
A concorrência, entregue aos comportamentos estratégicos das empresas, tende a resultar na concentração, na aliança, no acordo, no oligopólio, inclusive no monopólio, assim que se estabelecem custos fixos, rendimentos crescentes, efeitos de rede e de reputação. As vítimas desse processo são estão os compradores/consumidores, o que não deixa de provocar suas reações por meio de processos político e legislativo (pp. 49-51).
Compreende-se que a concorrência opera a partir da mediação entre as instâncias pública e privada. Ela não é obra de um estado de natureza, isto é, um ambiente de concorrência perfeita, cujos princípios são conhecidos pelos estudiosos atomicidade (ausência do poder de mercado); homogeneidade dos produtos; informação perfeita; livre acesso a tecnologias de produção; e livre entrada nos mercados. Nesse ambiente irreal, as firmas são tomadoras de preços e a curva de demanda é horizontal. Esse modelo teórico afirma que a concorrência é boa e que o seu equilíbrio é sempre eficiente. Portanto, basta que o Estado não interfira no jogo das forças impessoais de mercado, distorcendo-o.
O modelo abstrato de concorrência perfeita é silencioso sobre as implicações da competição pelo progresso tecnológico. Sabemos que o avanço do conhecimento é um processo cumulativo e também que os resultados econômicos das sociedades dependem do caminho trilhado. A política é necessária e a qualidade do seu jogo impacta nos resultados socioeconômicos. Não cabe nesta discussão a radical polarização ideológica entre Estado e mercado, algo que se mostra historicamente estéril em termos de desenvolvimento das sociedades democráticas. Devemos reconhecer, entretanto, existirem questões regulatórias nesse relacionamento que demandam maior atenção no Brasil.
Segundo nos informa o relatório Focus (25/01), do Banco Central, a projeção de crescimento para 2013 caiu pela quarta semana consecutiva enquanto a expectativa inflacionária subiu em período igual. Não sei se o próprio mercado está antecipando um ano difícil ou se ele considera efetivamente que o ambiente institucional brasileiro é merecedor de maiores aperfeiçoamentos. Para se ter uma rápida ideia da questão, o Fórum Econômico Mundial (WEF, em inglês) aponta que as instituições brasileiras e a sua infraestrutura estão nas respectivas posições 79 e 70 de um ranking de competitividade de 144 economias avaliadas. O que vem segurando o Brasil, segundo o ranking do WEF, é o tamanho do seu mercado doméstico, posição 9, porque em termos de educação primária e saúde estamos na 88ª colocação e o seu ambiente macroeconômico encontra-se no 62º lugar.
Se quisermos realmente crescer de forma sustentada ao longo do tempo, quebrando o ciclo vicioso dos voos de galinha e deslocando gradualmente a ênfase do crescimento econômico puxado pela demanda de consumo para a de investimento, então precisamos construir institucionalmente pelas vias políticas o futuro que tanto desejamos para os nossos descendentes. Não devemos esperar por milagres, pois a política é feita por pessoas imperfeitas para resolver questões e impasses criados por essas mesmas pessoas.
Rodrigo Medeiros (D.Sc.)