Diante de vários acontecimentos ocorridos no Brasil e no mundo, arrisco a desenvolver alguns pensamentos sobre a questão da liderança, tanto aqui como lá fora.
Vimos o rebaixamento do Brasil, a retomada da Criméia pelas armas, a crise da Petrobrás, a volta do crime às comunidades pacificadas do Rio e tantos outros eventos que nos fazem pensar sobre quais as razões para isso.
Num primeiro momento, penso que temos líderes com pouco ou em alguns casos, nenhum merecimento desta expressão profunda, em quase todos estes eventos.
Começando pela Crimeia, vejo lideranças difusas nos Estados Unidos e na Europa, desde quando inauguraram seus mandatos. Com discursos promovendo a louvável temporada da diplomacia, mas em aparente detrimento do poder das armas, quando necessário. Ao optarem por este caminho talvez tenham deixado de entender que o uso equivocado e até ingênuo da diplomacia, poderia lhes debilitar perante aos outros, suas próprias forças internas e assim encorajar atitudes intempestivas e até violentas. Vimos atitudes diversas perante a primavera Árabes,etc. Também parece não terem lido com paciência os pensamentos de um povo de importante peso geopolítico no mundo, como é o povo russo.
Quem, com um mínimo de atenção aos discursos do Sr. Putin, não percebia sua frustração e insatisfação com a perda de status de superpotência, após a queda da União Soviética, sua vontade de recuperar aquilo que é sagrado para os russos – seu cinturão físico de proteção às invasões – importância que vem desde a época dos czares e depois com os soviéticos?
Quantas vezes ele falou em proteger os povos de etnia russa ou que falem russo, e que estão espalhados pela Ucrania, Estonia, Moldavia, Bielo Russia e alguns outros paises? E a história nos mostrou que um povo, se sentindo frustrado e perdedor, pode seguir caminhos diversos e até perigosos, como já vimos com a Alemanha, depois que perdeu a primeira guerra mundial.
E como os russos foram tratados durante todo este tempo?
Entraram de favor no G8, mas não tiveram um peso específico proporcional à sua influencia geopolítica e militar. Se voltaram para a economia de mercado, o que foi positivo. É verdade que receberam muitos investimentos do exterior, mas nunca se exigiu deles uma democracia com instituições fortes, como se isto pudesse ocorrer no momento que as grandes potencias dessem um sinal.
A Rússia não tem vocação para país café com leite e era esperado que o seus líderes reagissem a esta incômoda posição, mais cedo ou mais tarde. Eles esperaram, pacientemente, por 25 anos, até que tivessem um bom motivo para se imporem novamente como uma potência regional, conjugando a fraqueza dos atuais líderes ocidentais, cansados de guerras e cheios de olhares para o próprio umbigo e para o politicamente correto, com movimentos nacionalistas e que atingem em cheio seus objetivos geopolíticos, como é o caso da Criméia. O mundo gira em torno de realidades e interesses duros, nem sempre tão pró-ativos, quanto desejariam os atuais lideres ocidentais.
E quanto rebaixamento do Brasil?
O Brasil conquistou o Investment Grade a duras penas e isto foi festejado pelos governantes da época. Entramos num clube mais seleto. Deveriam ter aprendido que o que se conquista, precisa ser preservado e aprimorado. Este fato foi muito positivo para o país, pois atraiu investidores e reduziu os juros de nossas dívidas, seja as do País ou das empresas. E para tal, é sabido que precisamos seguir certas regras do jogo, os fundamentos da economia de mercado e que portanto não podem ser atropeladas por voluntarismos e magias contábeis.
Olhamos o curto prazo e esquecemos que estamos num mundo interligado, e que os investimentos que precisamos vêm, em sua maioria, de fora e precisam seguir regras, respeitar contratos, atribuindo previsilibidade, segurança e retornos adequados.
Vínhamos fazendo isto muito bem, mas a expectativa de sucesso e uma vaidade exagerada, nos fez acreditar que o Brasil era diferente perante a crise mundial, estava à frente de todos, poderia mexer nas regras e desprezar lições do passado, introduzindo nosso velho e já comprovadamente fracassado modelo desenvolvimentista, com o estado tomando a frente dos negócios. Do petróleo, da energia dos juros, das privatizações pouco eficientes, dando preferência ao consumo sem ter uma poupança interna suficiente para fazer os investimentos tão necessários ao aumento da produtividade .
As bolsas que chegaram a 75 mil pontos, hoje estão abaixo dos 50 mil pontos e parece que vai tudo bem… Não vai não.
Estamos ainda diante de uma grave crise na Petrobrás, com redução substancial de valor de mercado e causando uma perda de mais de 200 bilhões de dólares.
E a situação pode ficar ainda mais complicada, em função dos últimos investimentos que superaram e muito seus orçamentos e cronogramas. Não atinge só o país e o governo, mas a todos os trabalhadores que compraram ações da empresa, inclusive com seus depósitos no FGTS.
No meu modo de ver, tanto no caso da Criméia, como no do Brasil, parece haver uma falta de estratégia, planejamento de longo prazo, elementos próprios de líderes e estadistas que pensam no presente, já deixando os caminhos para as próximas gerações.
Líderes hábeis e capazes antecipam eventos, preparam-se para eles e agem no tempo certo para solucioná-los da melhor forma.
Bons líderes projetam o futuro, baseando-se não somente em informações e convicções próprias, mas buscando os fundamentos geopolíticos ou macroeconômicos, como por exemplo, para os casos acima. Eles não se surpreendem, não ficam esperando que o melhor aconteça, não são paralisados pelas infindáveis análises de assessores sempre dispostos a lhes agradar. Decidem no melhor timing e com base nos fundamentos.
No caso da Crimeia, não poderiam ter deixado a corda esticar em Kiev, sabendo dos pensamentos estratégicos de Moscou e da personalidade do Sr. Putin, um homem severo, determinado e vindo do cerne da KGB. Agora, como se diz, Inês é morta e a luta será para dificultar a anexação de outros países e etnias.
As novas lideranças que perderam o timing da diplomacia (tão referendada em seus discursos de posse) e estão cansadas de guerra, irão assistir a novas invasões e acenar com sanções para proibir alguns cidadãos russos de irem à Disney?
No Brasil, depois deste forte sinal dado pela agência de rating, o que iremos fazer?
E não é simplesmente pelo sinal dado. Estamos visivelmente numa rota de alta inflação, baixo crescimento e escalada do endividamento.
E como mudar isto, mesmo que seja depois das eleições?
Teremos lideranças para deixar de lado as famosas concessões e acelerar as privatizações? Teremos lideranças para efetuar cortes de gastos e custos, incentivar o aumento da poupança e dos investimentos?
Nossos líderes estão dispostos a buscarem os fundamentos de nossa economia, mudarem o discurso para a correção de rumos?
Para tudo isto será preciso competência técnica, pensamento de estadista e acreditar na democracia como um valor para a liberdade, a justiça e o desenvolvimento da sociedade.
Como disse, líderes hábeis e capazes, antecipam eventos, preparam-se para eles, estudam os fundamentos, mudam convicções que não deram resultados, munem-se de assessores competentes e agem no tempo certo. Líderes não improvisam e não esperam dádivas da natureza ou do acaso como forma de solução de seus desafios.
Verdadeiros líderes não se guiam por quatro anos ou por um ciclo eleitoral e conhecem o tempo e a perspectiva da história, portanto projetam estratégias pensando neste tempo.
Será que temos esses Líderes por aqui?
Sou realista e, portanto, não espero que sigamos rumos mais complicados como os da Argentina e da Venezuela, pelo menos por enquanto.
Lembro dos tempos em que o Espírito Santo estava mergulhado em uma grave crise de lideranças, com os gastos do governo ultrapassando as receitas, com a falta de investimentos, com as constantes crises entre os diversos poderes, com uma situação econômica precária e sem atração de investimentos.
Parecia que aquele pesadelo jamais chegaria ao fim.
Entretanto, novos lideres deste estado assumiram riscos, buscaram competências, introduziram modelos de gestão já comprovados, enfrentaram com seriedade as drenagens de recursos e uniram todos os poderes e a sociedade em torno de um projeto de recuperação moral e econômica do estado. Deixaram o populismo e se voltaram para eficiência dos gastos e da gestão publica. Uma união pelo mutirão da recuperação do estado.
Hoje estamos num patamar elevado para um pequeno estado da federação. E tudo isto graças aos vários líderes que souberam captar os desejos da população, as experiências do setor privado, adotaram métodos comprovados e dialogaram com os demais poderes constituídos e da sociedade, para que o entendimento dos problemas fosse a base das soluções.
Há sim luz no fim do túnel, se tivermos lideranças que queiram compreender e fazer o certo.
Carlos Aguiar