Recessão brasileira e economia capixaba

Por Rodrigo Medeiros

A elevação de tributos anunciada recentemente pelo governo federal decreta o fracasso da sua política econômica. O Brasil abraçou a austeridade fiscal, a partir de profundos cortes nos investimentos públicos, em decorrência da grave recessão iniciada em meados de 2014. Aspectos estruturais, como a desindustrialização precoce e a acomodação de trabalhadores em atividades econômicas de baixa produtividade, não foram considerados. O fim do superciclo global das commodities expôs a fragilidade da inserção externa brasileira.

Após a grande crise financeira de 1929, a década que se seguiu foi de preciosas lições para muitos estudiosos. De certa maneira, revivemos certos aspectos daqueles dilemas com o estouro da crise global de 2008, após a queda do Lehman Brothers. A resposta inicial conjunta de muitos países à crise foi no sentido de manter o nível da demanda agregada e evitar os efeitos adversos nos empregos e na produção. O receituário “keynesiano” recomendava o investimento público, em infraestrutura, por exemplo, como remédio eficaz para a recuperação da economia.

Pouco tempo depois, iniciou-se um processo de forte “marcação” dos agentes financeiros sobre o avanço das dívidas públicas dos países e vivenciamos, desde então, o mantra da austeridade fiscal. Estamos repetindo o debate econômico da década de 1930 e presenciando a emergência de extremistas e populismos. O desemprego elevado e persistente, a desesperança coletiva no futuro e as elevadas desigualdades conspiram contra a democracia. Merece destaque o fato de que a forte queda dos preços internacionais das commodities e a Lava Jato coincidem com o início da recessão brasileira, sendo que a sobrevalorização cambial crônica do real impede a efetiva e sustentada retomada de atividades schumpeterianas, isto é, dinâmicas do ponto de vista tecnológico e com retornos crescentes de escala. Nesse sentido, é preciso muito cuidado para que o Brasil não se especialize em ser pobre.

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O processo de desenvolvimento capixaba é conhecido pelos seus estudiosos. Segundo Morandi e Rocha, em 1952, o governador Jones dos Santos Neves advertia que os “galhos dos cafezais eram frágeis para sustentar nossos sonhos de progresso” (em: ‘Cafeicultura e grande indústria’. 2.ed. 2012). Certos aspectos daquela advertência se encaixam nos desafios presentes. Constata-se que os municípios capixabas localizados ao leste da BR 101 somam 81% do produto estadual (VILLASCHI, A. [org.] ‘Economia capixaba’. 2015). Os municípios ao oeste dessa rodovia respondem por 70% da participação na produção agropecuária, de mais baixa complexidade econômica.

Problemas espaciais de desequilíbrios do desenvolvimento também são encontrados em outros países, em escalas distintas. A Região Metropolitana da Grande Vitória (RMGV) concentra aproximadamente 60% do PIB e quase 50% da população capixaba em apenas 5% da área estadual. A economia capixaba, com o seu expressivo grau de abertura comercial e por ter as suas exportações predominantemente pautadas por commodities, sentiu os efeitos adversos do fim do boom das commodities. Nesse sentido, não causa espanto que as receitas dos municípios capixabas tenham caído ao patamar de 2010. Tal fato revela as fragilidades estruturais da economia capixaba.

Da grave crise do café à industrialização parcial da economia capixaba ao leste da BR 101, através de grandes projetos, vivemos a onda recente de diversificação dos serviços no Espírito Santo. Em tempos de crises política e econômica, é necessário ampliar o debate sobre o desenvolvimento capixaba, suas assimetrias, fragilidades e potencialidades. Os solilóquios não costumam abarcar a pluralidade de perspectivas sociais existentes. Eles podem apenas garantir aplausos fáceis e uma tranquilidade intelectual do tipo paz de cemitério para alguns poucos.

Rodrigo Medeiros é professor do Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes)

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