Por Flávia Oleare
Continue comigo que eu vou te explicar direitinho como funciona!
Dona Lúcia e Sr. Luiz tiveram um único casal de filhos, Teresa e Jorge. Dedicaram suas vidas a eles. Mesmo com uma situação financeira difícil, os matricularam nas melhores escolas, os levavam para passear e viajar nas férias naquele fusquinha branco sempre brilhando e todo dinheirinho que sobrava era para que nada faltasse a eles.
Sr. Luiz tinha uma mercearia no bairro, e estava sempre lá, barriga atrás do balcão, de segunda a sábado… não fechava por nada! Nem que estivesse doente. E o pior, é que estava… Mas, nunca tinha tempo para se cuidar, afinal, se fechasse, poderia perder faturamento e ele não podia faturar menos, afinal, nada podia faltar em casa.
Mas, infelizmente, exatamente por não se cuidar, quando os filhos eram adolescentes, Sr. Luiz teve um infarto fulminante e faleceu. Foi algo muito triste.
A família continuou com a mercearia, inicialmente, com Dona Lúcia a frente do negócio e os meninos se revezando para ajudar.
Com todo os esforços, os jovens estudaram, se formaram, casaram e tiveram filhos. E dona Lúcia continuou por muito tempo ainda com a mercearia aberta, e continuou os ajudando em tudo que precisaram até se estabelecerem.
Ela trabalhou até os 68 anos, mas com esta idade, sentiu que não tinha mais condições de manter a mercearia aberta. Percebeu que a memória não era mais a mesma e também começou a ficar com medo dos furtos a comércios, pois todos os dias tinha a notícia que um conhecido de loja tinha sido assaltado.
Enfim, questões burocráticas resolvidas e Dona Lúcia em casa em tempo integral. Sozinha. A aposentadoria é pequena, apenas um salário mínimo e não é suficiente para se manter.
Como ela trabalhava de sol a sol na mercearia, não tinha ainda se dado conta de que os filhos não compareciam muito.
Mas agora, que só fica em casa, percebeu que eles não aparecem nunca e nem perguntam se ela precisa de alguma coisa.
Um dia, ela adoeceu e se viu completamente só, ligou para os filhos e nenhum dos dois podia ajudá-la, Teresa estava viajando e Jorge, numa festa de um amigo no clube, segundo ele, um amigo muito especial e que ele não poderia sair naquela hora.
Ela foi acudida por vizinhos, que a levaram ao hospital e lá ela ficou por aproximadamente 20 dias. A glicose estava desregulada e foi difícil estabilizar.
Diante disso e da ausência dos filhos, um casal de vizinhos, que a conhecia há mais de 30 anos, teve que ir na casa dela para buscar roupa, procurar documentos, enfim, tomar as providências enquanto ela estava no hospital.
Ficaram horrorizados ao verificarem que a casa dela estava muito suja, desorganizada, que praticamente não havia comida nem na geladeira nem na despensa (nada além de um pacote de macarrão e 3 cebolas e que as roupas dela eram muito velhas e surradas.
O que eles constataram é que Dona Lúcia, estava completamente abandonada.
Nem acreditaram que aqueles filhos, que tiveram tudo de melhor que os pais puderam prover, tiveram a coragem de simplesmente esquecer da mãe e deixá-la totalmente de lado.
Ela não comentava sobre isso, sempre que perguntavam pelos filhos ela dizia que estavam bem e muito ocupados. Mas ela percebia. Só que a verdade era cruel demais para ela admitir.
Diante disso, os vizinhos procuraram um advogado para saber o que fazer porque eram pessoas esclarecidas e tinham conhecimento de que tanto a Constituição Federal quanto o Estatuto do Idoso preveem a obrigatoriedade dos filhos cuidarem dos pais.
Com base nos dispositivos legais que disciplinam esta matéria, foi ajuizada uma ação de pensão alimentícia em face dos filhos para que ajudem financeiramente a mãe, bem como, uma ação de indenização por danos morais em face do abandono afetivo por ela sofrido. E o juiz ainda encaminhou o processo para o Ministério Público para que fosse verificada a ocorrência do crime previsto no artigo 133 do Código Penal.
Infelizmente, o abandono afetivo dos filhos para com os pais é uma realidade muito mais comum do que se imagina. E ela dói na alma de quem sofre. Imagine você criar um filho com todo amor e carinho e quando “não estiver mais servindo” ser jogado fora, abandonado, como se nunca sequer tivesse existido!
Se você conhece alguém que está passando por esta situação, não seja omisso. Procure um advogado para saber como proceder. Não deixe de enviar esta mensagem para um amigo para que mais gente tenha conhecimento desta triste realidade, bem como, das soluções possíveis, para que tal quadro possa ser revertido enquanto houver tempo.
Flávia Oleare é advogada civilista, especialista em direito de família e sócia da Oleare e Torezani Advocacia e Consultoria.