Por Xerxes Gusmão
A possibilidade de dispensa do empregado que recusa a vacinação contra a Covid-19 vem gerando bastante polêmica no Brasil, a ponto de ter provocado a publicação de uma Portaria pelo Ministério do Trabalho – a de nº 620, de 1º de novembro de 2021.
Tivemos, inclusive, a oportunidade de abordar especificamente o teor desta Portaria, na nossa coluna anterior (Proibição da dispensa do não vacinado: a Portaria 620/21 do Ministério do Trabalho).
Como salientamos nesse texto, sua principal característica era a proibição da (pretensa) discriminação contra o empregado que se recuse a se vacinar, seja pela não contratação, seja pela dispensa, com ou sem justa causa.
Sucede que o Ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, derrubou, nesta sexta-feira, dia 12 de novembro, a validade dos principais dispositivos dessa Portaria.
Nesse sentido, na condição de relator de uma ação que tramita no STF, questionando a validade da Portaria (ADPF nº 898), o Ministro Barroso deferiu medida cautelar, declarando a inconstitucionalidade e, portanto, afastando a aplicação das suas disposições mais relevantes e polêmicas.
Trata-se, mais especificamente, do afastamento das seguintes medidas da Portaria: a equiparação da não contratação ou da demissão do empregado não vacinado à discriminação por motivo de sexo, raça ou deficiência, com a consequente proibição da exigência de certificado de vacinação contra o coronavírus, a ser substituído por testagem periódica; o direito do não vacinado demitido de exigir da empresa indenização por danos morais e de ser reintegrado ao emprego, ou indenizado em dobro pela dispensa.
Os motivos dessa declaração de inconstitucionalidade dos dispositivos citados são, basicamente, as inconsistências da Portaria apontadas por vários especialistas e indicadas no nosso artigo anterior: a impossibilidade de uma norma inferior à lei – uma Portaria do Ministério do Trabalho – impor uma restrição geral tão importante a todas as empresas do país, como a proibição da demissão; o fato de constituir direito dos demais empregados (vacinados ou não), além de dever do empregador, a preservação de um ambiente de trabalho seguro e saudável.
O Ministro Barroso valeu-se, ainda, do posicionamento anterior do STF, no sentido de considerar como constitucional a obrigatoriedade da vacinação contra a Covid-19 no país, validando meios coercitivos indiretos, como a vedação do acesso a determinados locais ou serviços ao não vacinado.
Vale ressaltar, todavia, que o Ministro Barroso admitiu a recusa do empregado a se vacinar por questões de saúde devidamente comprovadas, com expressa contraindicação médica, não sendo possível, neste caso, a aplicação de qualquer penalidade, mas somente a imposição da testagem periódica.
Fato é que essa decisão do Ministro Barroso modifica completamente o cenário, pois a partir dela – que tem efeitos imediatos e vinculantes em todo o país – a empresa passa a ter o direto de demitir o seu empregado não vacinado, com ou sem justa causa, não se configurando mais hipótese de discriminação.
O que não significa, absolutamente, que essa demissão possa ocorrer imediatamente, pois é necessário um diálogo prévio com o empregado relutante a se vacinar, numa tentativa de convencimento. Todavia, caso insista nesta opção que põe em risco a saúde de todos no local de trabalho, a justa causa poderá ser aplicada, como última medida para o problema.
Xerxes Gusmão Juiz do Trabalho do TRT do ES. Professor universitário. Mestre e Doutor em Direito do Trabalho e Previdenciário, pela Universidade de Paris 1 – Panthéon-Sorbonne.