Além da crise: a luta pela segurança hídrica e a gestão hídrica sustentável no ES

A recente seca histórica em rios da região amazônica acendeu um alerta importante sobre o que entendemos como segurança hídrica. Estamos falando de uma região que detém mais de 60% dos recursos hídricos superficiais do Brasil, onde o Rio Madeira, por exemplo, que antes era amplamente navegável, registrou apenas 19 centímetros de lâmina d’água em outubro deste ano.

Essa situação alarmante nos leva a refletir sobre como estamos cuidando de nossos recursos hídricos e o quanto precisamos agir para garantir água de qualidade e em quantidade para todos.

Segundo o Plano Nacional de Segurança Hídrica, segurança hídrica significa garantir a disponibilidade de água para necessidades humanas, atividades econômicas e a manutenção dos ecossistemas, de forma sustentável e resiliente.

No Espírito Santo, o cenário também é desafiador. Entre 2014 e 2019, o Estado enfrentou secas prolongadas, que afetaram severamente a disponibilidade de água, intercaladas com eventos de cheias sazonais que também trouxeram dificuldades.

Essas situações exigiram ações incisivas para atender aos diferentes usos da água, e foi justamente essa necessidade que impulsionou o Espírito Santo a buscar soluções inovadoras.

A implementação de Acordos de Cooperação Comunitária durante as crises hídricas, o fortalecimento dos Comitês de Bacias Hidrográficas (CBHs), a utilização de sistemas de reúso em setores da indústria e programas de recomposição florestal são exemplos de estratégias que têm sido desenvolvidas para enfrentar esses desafios.

No entanto, ainda há muito a ser feito, especialmente nas áreas mais vulneráveis, onde a escassez de água é uma ameaça constante. Com as mudanças climáticas, os desafios para a gestão dos recursos hídricos aumentam significativamente.

Alterações nos padrões de precipitação e a maior frequência de eventos extremos, como secas e enchentes, colocam uma pressão ainda maior sobre nossos sistemas hídricos.

Precisamos adaptar nossos modelos de gestão, reforçando o monitoramento e as ações preventivas para proteger os mananciais de abastecimento.

Sem uma gestão proativa e integrada, os riscos de escassez e conflitos pelo uso da água só tendem a aumentar, comprometendo não apenas a segurança hídrica, mas também a segurança alimentar e o desenvolvimento econômico e social da região.

Setores são impactados

A segurança hídrica está diretamente ligada ao desenvolvimento da nossa região. Quando falta água, setores essenciais como o abastecimento público, a agricultura e a indústria são os primeiros a sentir o impacto, afetando o bem-estar de milhares de pessoas.

O desafio, porém, não é apenas garantir a água hoje, mas assegurar que seu uso seja sustentável no longo prazo, mantendo nossos ecossistemas saudáveis e nossas comunidades resilientes.

Para isso, é fundamental que exista um planejamento integrado e políticas públicas que considerem as características de cada região, promovendo a participação ativa de todos os setores da sociedade.

Nesse sentido, os Comitês de Bacias Hidrográficas do Espírito Santo desempenham um papel essencial, atuando de forma participativa e descentralizada para garantir uma gestão eficiente da água.

Outro ponto crucial para alcançarmos a segurança hídrica é a integração de políticas públicas. Precisamos articular setores como saneamento, recursos hídricos, meio ambiente e desenvolvimento urbano, garantindo que as ações sejam eficazes e que os esforços não se sobreponham.

A falta de saneamento básico, por exemplo, compromete a qualidade da água e afeta uma série de outros usos. A degradação ambiental, por sua vez, reduz tanto a qualidade quanto a quantidade dos nossos recursos hídricos, enquanto o crescimento urbano desordenado aumenta a pressão sobre a água e coloca as comunidades em risco.

Portanto, instrumentos de gestão, como planos de bacia hidrográfica, enquadramento dos corpos d’água, outorgas de uso, cobrança pelo uso da água e sistemas de informação, precisam ser fortalecidos e implementados de forma eficaz e coordenada, tanto em nível nacional quanto regional.

Avanços e desafios no ES

No Espírito Santo, já vemos avanços importantes no desenvolvimento desses instrumentos, mas ainda há desafios a serem superados.

A implementação plena dos planos de bacia e o enquadramento dos corpos d’água em classes adequadas, além da cobrança pelo uso da água, são pontos que enfrentam resistência, mas são essenciais para garantir uma gestão sustentável.

Os Comitês de Bacia têm um papel crucial nessa jornada, e seu fortalecimento é fundamental para que possamos alcançar as metas de desenvolvimento sustentável da região.

Evidencia-se que não há uma segurança hídrica permanente, e alcançá-la depende de um esforço conjunto e contínuo. Portanto, precisamos integrar políticas, adaptar-nos às mudanças climáticas e garantir que a gestão dos recursos hídricos seja sustentável.

Cada um de nós pode contribuir, apoiando iniciativas locais de conservação e, principalmente, fortalecendo a gestão dos recursos hídricos, seja através da participação nos Comitês de Bacia Hidrográfica ou apoiando políticas públicas que priorizem uma gestão mais eficiente e integrada.

A colaboração entre todos os setores, aliada a uma visão integrada e ações coordenadas, é o caminho para garantir que a água esteja disponível para as gerações presentes e futuras, beneficiando a todos e promovendo um futuro mais seguro e sustentável.

Eliane Meire de Souza Araújo

Engenheira ambiental, mestre em Gestão e Regulação de Recursos Hídricos.

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