As medidas de combate à fraude no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), introduzidas pela Lei 14.973/24, são vistas por muitos como uma tentativa louvável de reduzir os gastos indevidos com benefícios sociais.
No entanto, ao implantar ferramentas rigorosas, como o bloqueio automático de benefícios e o uso obrigatório de registro biométrico, o governo pode estar criando mais problemas do que soluções, especialmente para aqueles que dependem de tais benefícios para sua sobrevivência.
Uma das principais preocupações em relação a essas novas medidas é o risco de que o foco excessivo no combate à fraude acabe prejudicando beneficiários legítimos.
Erros administrativos podem afetar beneficiários
Com o bloqueio automático de benefícios suspeitos, há uma grande probabilidade de que pessoas que dependem desses recursos sejam afetadas por erros administrativos ou pela incapacidade de provar sua elegibilidade a tempo.
O INSS já é conhecido por sua burocracia e lentidão, e aumentar a rigidez dos procedimentos sem fornecer melhorias no atendimento pode resultar em um número ainda maior de cidadãos desamparados por falhas no sistema.
O uso de tecnologias como o registro biométrico, embora positivo do ponto de vista da segurança, também gera preocupações.
A implementação desse tipo de controle em um país com desigualdades regionais tão grandes pode ser um desafio logístico.
Em regiões mais afastadas, onde o acesso à tecnologia é limitado, o processo de cadastramento biométrico pode ser inviável para muitos beneficiários, especialmente os idosos e aqueles com dificuldades de locomoção.
O resultado é que, na prática, essas pessoas podem perder o acesso aos seus direitos por não conseguirem cumprir com os novos requisitos.
Além disso, o enfoque exclusivo em medidas de fiscalização e controle não resolve a questão de fundo da má gestão dos recursos públicos.
Sistema de benefícios precisa de reforma ampla
O combate à fraude deve ser acompanhado de uma reforma ampla no sistema de benefícios, que inclua investimentos em tecnologia, melhor capacitação dos funcionários do INSS e uma reestruturação nos processos de concessão de benefícios.
Apenas endurecer as regras não garante que os recursos serão aplicados de maneira mais eficiente ou justa.
Outro ponto a ser considerado é a sobrecarga que essas medidas impõem ao sistema de atendimento do INSS.
Com o bloqueio automático de benefícios, é provável que haja um aumento expressivo no número de recursos e de pedidos de revisão, o que agrava ainda mais a já existente sobrecarga nos postos de atendimento.
Beneficiários que dependem de seus auxílios para sobreviver terão que enfrentar longas filas e esperar meses para reaver um benefício que foi bloqueado, muitas vezes, por erro ou desinformação.
Aí vem a “brilhante” solução do governo, vamos fazer concurso público para INSS no programa de geração de empregos, ou realizar contrato emergencial para solução das filas e recadastramento dos beneficiários do INSS.
Suspensão de benefícios pode atingir os mais vulneráveis
Também é importante destacar o impacto social que essas medidas podem gerar. Para muitos cidadãos, especialmente os mais vulneráveis, a suspensão de benefícios pode significar a diferença entre a subsistência e a pobreza extrema.
Em um país com altas taxas de desigualdade, essas medidas rígidas podem agravar ainda mais as disparidades sociais, criando um cenário onde os mais pobres são os mais afetados pela tentativa de reduzir fraudes que, em sua maioria, são cometidas por uma minoria.
É preciso questionar se o combate à fraude no INSS está sendo implementado da maneira mais eficiente.
A corrupção e a fraude em larga escala, praticadas por redes organizadas, dificilmente serão desmanteladas apenas com o uso de bloqueios automáticos e registro biométrico.
Esses mecanismos são mais eficazes para impedir fraudes pontuais, mas é necessário um esforço maior de inteligência e investigação para combater os grandes esquemas de desvio de recursos públicos.
Em conclusão, as medidas de combate à fraude no INSS, embora necessárias, precisam ser implementadas com cautela para não prejudicar os beneficiários que realmente dependem do sistema.
O foco em controle e fiscalização deve ser equilibrado com melhorias no atendimento e na gestão dos recursos, garantindo que o combate à fraude não resulte em mais exclusão social e burocracia desnecessária.
Sandro Ronaldo Rizzato
Advogado, sócio da PRL Advogados, Vitória (ES)