Por Xerxes Gusmão
Já tivemos a oportunidade de tratar aqui, na coluna Livre Pensar, do home office, modalidade de prestação de serviços na própria residência do empregado, que ganhou notória relevância no atual período pandêmico.
Ocorre que foram aprovadas, recentemente, novas regras do home office, que demandam atenção especial, por modificarem aspectos importantes dele. Trata-se da Medida Provisória nº 1.108, publicada pelo governo federal em 25 de março de 2022.
Primeiro ponto a ser ressaltado, acerca desta Medida Provisória, é um tanto criticável: a previsão de que o home office pode ser caracterizado ainda que o trabalho seja executado habitualmente nas dependências da empresa.
Trata-se de evidente atecnia, pois o próprio conceito do home office sempre foi o do trabalho fora das dependências da empresa, sendo uma incongruência incontornável a de se tentar compatibilizar home office com trabalho na empresa. Em razão disso, inclusive, a tendência é que tal previsão venha a desaparecer, quando a norma for votada no Congresso Nacional.
Um segundo elemento que justifica menção é a alteração do regime do labor extraordinário. Isto porque, até a criação dessa norma, o empregado trabalhando em home office não teria, em princípio, direito às horas extras, ainda que laborasse por mais de oito horas diárias. A razão é porque se presumia que a sua jornada não era controlada, o que lhe garantia, inclusive, o direito a tal parcela, caso comprovasse este controle de jornada pela empresa.
A partir do advento da MP nº 1.108, a situação muda racicalmente: passam a existir duas formas de home office, por jornada ou por produção. No regime por jornada, o empregado tem duração diária do labor de oito horas e, naturalmente, direito às horas extras a partir da oitava hora diária. Somente no regime de produção permanece vigendo o regime antigo, da exclusão das horas extras no home office.
Vale destacar que o regime de produção é aquele em que o empregado não tem jornada fixa, mas meramente tarefas a executar, independente do tempo que leve no dia para finalizá-las. Obviamente, deve haver bom senso na fixação destas tarefas, para que elas não impliquem em jornadas habituais muito longas, de dez ou doze horas.
Interessante, ainda, observar que a nova Medida Provisória prevê a possibilidade de o empregado, contratado no Brasil e que esteja no regime do home office, executar suas atividades no exterior, estando, inclusive, garantida a aplicação da lei trabalhista brasileira, neste caso. Todavia, quando este empregado eventualmente retornar ao regime presencial, a empresa não ficará responsável pelas respectivas despesas do retorno.
Por derradeiro, seria pertinente salientar que a Medida Provisória nº 1.108 assegurou preferência às vagas em home office aos empregados com deficiência e aos pais (homens ou mulheres) de filhos de até quatro anos.
Não se poderia deixar de concluir este artigo sem mencionar que, como toda Medida Provisória, a de nº 1.108 está em vigor desde a data da sua publicação, mas depende, para se tornar definitiva, de confirmação pelo Congresso Nacional. Ou seja: suas regras atualmente já são válidas, mas perderão eficácia, caso o Congresso não a converta em lei, no prazo constitucional.
Xerxes Gusmão é Juiz do Trabalho do TRT do ES. Professor universitário. Mestre e Doutor em Direito do Trabalho e Previdenciário, pela Universidade de Paris 1 – Panthéon-Sorbonne.