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Governo sabia desde agosto que não havia verba para bolsas da Capes

Esses auxílios são pagos a estudantes de licenciaturas para desenvolver atividades em escolas

Estadão Conteúdo

Redação Folha Vitória
Foto: Divulgação

O governo federal sabia, desde agosto, que não haveria dinheiro suficiente para pagar as bolsas da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) voltadas para a formação de professores. 

Neste mês, os 60 mil auxílios de dois programas estão atrasados e não há previsão de quando serão retomados. Estudantes que recebiam as bolsas relatam dificuldades para pagar as contas básicas e buscam trabalho fora para se manter.

Em um ofício ao Ministério da Economia, enviado em agosto, o Ministério da Educação apontava a necessidade de suplementação de recursos para bolsas da Capes ligadas à educação básica. 

Esses auxílios são pagos a estudantes de licenciaturas para desenvolver atividades em escolas. Na pandemia, por exemplo, os bolsistas ajudaram os professores no ensino remoto.

O documento de agosto não detalhou o número de bolsistas que poderiam ser afetados com a falta de verbas nem deixou claro quanto seria necessário receber para conseguir pagar todos os auxílios ligados à educação básica. 

De um modo geral, para várias ações do MEC, o documento pleiteava à Economia suplementação de R$ 2,5 bilhões para a "execução de importantes políticas no 2º semestre".

Naquele mês, indagada sobre o ofício, a Capes informou ao Estadão que negociava no Ministério da Economia a liberação de recursos para as bolsas da educação básica, assim como foi feito para as bolsas de pós. 

Essas não foram afetadas porque receberam uma suplementação de R$ 56 milhões - o que não ocorreu no caso dos auxílios voltados para a formação de professores.

Segundo a Capes, como não há agora mais permissão legal para a suplementação orçamentária por meio de ato do Executivo, a liberação da verba precisa passar pelo Congresso. 

Um projeto de lei prevê crédito suplementar no valor de R$ 43 milhões para pagamento das 60 mil bolsas do Pibid e do programa de Residência Pedagógica, atrasadas desde o dia 10 deste mês.

Esse valor, no entanto, seria suficiente apenas para pagar as bolsas relativas à folha de setembro, cujo pagamento cai em outubro, segundo informou a presidente da Capes, Claudia Queda de Toledo, na Comissão de Educação da Câmara dos Deputados. 

Para pagar os valores relativos aos próximos meses, até o fim do ano, seriam necessários R$ 124 milhões a mais - o que a Capes espera conseguir por meio de novos projetos de lei.

Na tarde desta quinta-feira, a Comissão Mista de Orçamento aprovou a liberação dos R$ 43 milhões para a Capes, mas o projeto ainda tem de passar no plenário do Congresso. 

Por meio do Pibid, a Capes concede bolsas para que alunos da primeira metade do curso de Licenciatura desenvolvam projetos em escolas públicas. O programa de Residência Pedagógica segue os mesmos moldes, mas para estudantes da segunda metade do curso. As bolsas para estudantes são de R$ 400. Já coordenadores do programa recebem R$ 1,5 mil.

BABÁ

Os atrasos e a incerteza em relação aos pagamentos futuros fazem com que estudantes bolsistas procurem emprego em outras áreas, o que atrapalha a formação e a continuidade do trabalho que já estavam desempenhando. 

Sabrina Brito, de 21 anos, aluna de Licenciatura em Letras da Universidade Federal de Alfenas (Unifal), no interior de Minas Gerais, teve de voltar a trabalhar como babá para conseguir colocar comida em casa.

"Não tem como ficar sem trabalhar. Não sei quando essa bolsa vai voltar nem como vai ser nos próximos meses", diz ela, que usava a bolsa do Pibid de R$ 400 para ajudar a cobrir despesas como água, luz e internet. 

No programa, a jovem apoiava os professores no ensino remoto em uma escola municipal - tirava dúvidas dos alunos pelo WhatsApp e propunha atividades.

Já a aluna de Licenciatura em Educação Física Vitória Martins, de 21 anos, esperava ter bolsa até março. No Pibid, ela e outros bolsistas orientavam as crianças de uma escola no interior do Paraná sobre como realizar atividades físicas. O grupo também tinha projetos para melhoria na prática pedagógica. O pagamento, que caía no início do mês, não veio.

Vitória não quer abandonar o trabalho que já começou, mas, ao mesmo tempo, se vê sem saída para conseguir dinheiro. "Quatrocentos reais é muito pouco, mas complementa. A gente conseguia tirar para pagar água, luz", afirma. "Estou desesperada atrás de emprego", diz a jovem, que manda currículo para várias funções que não exigem formação superior.

Se conseguir uma vaga, Vitória terá de se desligar do Pibid mesmo que as bolsas voltem a ser pagas pela Capes. "Fico triste porque, se for trabalhar com outra coisa, como caixa de supermercado, é de domingo a domingo. 

Não vou conseguir me dedicar ao curso e o patrão não vai me liberar para fazer estágio", lamenta. "Parece que para outras coisas o governo tem dinheiro. É um descaso com a educação."

PROTESTO

Contra os atrasos, estudantes se mobilizam e pressionam o governo e o Congresso. Nos últimos dias, universidades também se manifestaram. A Universidade Estadual Paulista (Unesp), por exemplo, calcula que 1.001 estudantes foram prejudicados. 

Para não afetar os trabalhos, a reitoria da Unesp decidiu realizar por conta própria o pagamento, de forma emergencial.

Indagada sobre o atraso nos pagamentos, a Capes informou que foram solicitados ao Ministério da Economia R$ 43 milhões para o pagamento das bolsas do Pibid e Residência Pedagógica do mês de setembro. 

"O governo federal disponibilizou o orçamento, mas é necessária a aprovação do Projeto de Lei 17/2021 no Congresso Nacional para a efetuação do pagamento das bolsas."

A Capes disse ainda que já foi solicitado um novo crédito ao Ministério da Educação, no valor de R$ 124 milhões, para os pagamentos das bolsas de outubro, novembro e dezembro de todos os programas relacionados à educação básica. Assim que o Congresso liberar os recursos, "o pagamento será feito com a máxima urgência". Procurados, os Ministérios da Educação e da Economia não se manifestaram.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.