PT espera apoio do PSB nas eleições municipais de 2024

Não foi um processo fácil a retirada da pré-candidatura do senador Fabiano Contarato (PT) ao governo para apoiar Casagrande à reeleição. Além do desejo da militância de ter um palanque próprio, com um nome que tem se destacado nacionalmente no Congresso, a viabilidade da candidatura, que já pontuava nas pesquisas em segundo lugar, fez o PT capixaba esticar até o último momento a tentativa de levar adiante o projeto.

A decisão nacional já estava tomada e não dependia de condicionantes aqui no Estado, como entregar vagas na majoritária. Na verdade, a condição era nacional, principalmente envolvendo a disputa em São Paulo, o maior colégio eleitoral do país. Se o ex-governador Márcio França (PSB) desistisse de disputar o governo paulista, os outros estados não teriam mais justificativa de manter o impasse. E foi o que aconteceu com o Espírito Santo.

Mas, embora não tenha sido negociado isso agora, o PT espera que em 2024 o PSB o apoie nas eleições municipais. Ao menos essa é a expectativa da vereadora de Vitória Karla Coser revelada em entrevista ao programa “De Olho no Poder”, veiculado na última quinta-feira (14) na rádio Jovem Pan News Vitória (90.5 MHz).

“Acho que seria natural sim, estão caminhando juntos agora, espera-se que caminhem juntos em outros momentos. Mas isso de forma alguma foi feito como moeda de troca. Não está na mesa, não é o momento propício, mas naturalmente acho que isso aconteceria por conta dos projetos”, respondeu Karla ao ser questionada se haveria uma expectativa do PT em ser apoiado pelo partido do governador em 2024. Ela citou que Lula, se eleito, terá um vice do PSB e que seu pai, o ex-prefeito João Coser (PT), já governou com um vice socialista, eleito em 2004. “É uma aliança que não seria a primeira vez que aconteceria”.

“É óbvio que um gesto desse, a retirada de uma candidatura com 15%, 16%, espera-se uma compreensão, um apoio, mas nada disso foi debatido ainda”, disse Karla referindo-se ao recuo de Contarato na eleição.

Em 2020, o PT foi para o segundo turno em dois municípios importantes da Grande Vitória: na capital e em Cariacica. De lá para cá, o partido também se fortaleceu, aumentando seu número de filiados no Estado, de 24.522 para 28.098, sendo o partido que mais cresceu (14,58%) em terras capixabas. A tendência é que o PT dispute a prefeitura em mais cidades daqui a dois anos, principalmente se Lula for eleito presidente da República.

Na última quarta-feira (13), o diretório do PT se reuniu por três horas para bater o martelo. Contarato fez um discurso emocionado e retirou sua candidatura. Segundo Karla, houve uma compreensão geral a respeito da aliança nacional “entendendo que dá para esperar um pouco para esse projeto do Contarato ser o nosso governador”.

Questionada se o partido prometeu algo ao senador, como ser o candidato ao governo em 2026, Karla disse que não, mas que esse seria o caminho. “As forças se alinham, ele é a maior liderança do partido no Espírito Santo, é senador, está no cargo mais alto que o PT tem, conseguiu algo que é dificil no PT, a unanimidade. Quando decidimos pela candidatura dele, todo mundo, todas as correntes foram a favor da vinda dele e dele disputar uma candidatura. Então o caminho natural é que ele continue se fortalecendo como liderança. Meu compromisso com ele é esse: fortalecê-lo para disputar o governo do Estado”.

Outras pendências

Embora a questão da candidatura ao governo esteja resolvida, o partido ainda vai debater como será a participação dos petistas na campanha, no programa e numa possível segunda gestão de Casagrande; se vão continuar com o pleito de indicar um nome na majoritária (vice, Senado ou suplentes) ou se lançarão um nome para o Senado numa candidatura avulsa. Karla afirmou que tudo ainda será debatido e que não haverá nenhuma imposição.

“Dependemos da articulação nacional. Nós não vamos esticar a corda para impor qualquer decisão aqui no Estado. É uma vontade do PT que a gente tenha uma candidatura ao Senado, mas isso não será a qualquer custo. Eu, pessoalmente, acho que seria importante para também colocar o bloco na rua. Candidaturas majoritárias ajudam muito as candidaturas proporcionais”, disse Karla, que não irá disputar nesse ano, mas vai ajudar na campanha do pai a deputado estadual e de Jackeline Rocha, presidente do partido, na campanha à federal. Ela também vai fazer parte da coordenação da campanha de Lula em Vitória.

Hoje, o PT tem dois nomes que disputam internamente para concorrerem ao Senado: o ex-reitor da Ufes Reinaldo Centoducatte e a professora Célia Tavares. E tem uma corrente interna: a DS, que apoia ter uma candidatura avulsa para concorrer à vaga majoritária.

O governador não é simpático à ideia de ter mais que uma candidatura ao Senado em sua chapa e nem a senadora Rose de Freitas, a mais cotada para ganhar esse apoio – na última sexta-feira, em visita ao Estado, a presidenciável Simone Tebet garantiu apoio do MDB a Casagrande e disse que já está selado um apoio do governador à senadora do Estado. Casagrande agradeceu o apoio e a visita de Simone mas, ao menos publicamente, não confirmou o apoio do governo a Rose de Freitas.

Indicar um nome para ocupar o posto de vice também está no radar do PT. Nos últimos dias o nome de Karla foi alçado como possível vice na chapa de Casagrande. Mas ela descartou que tenha tido conversas a esse respeito com o PT, com o PSB e com o governador. “Nunca fui procurada para falar desse assunto”.

 

“Saudade de debater com o PSDB”

Karla também foi questionada se estar no palanque de Casagrande e dividi-lo com bolsonaristas, tucanos e emedebistas causava algum tipo de incômodo, tendo em vista a história recente do PT com esses partidos. A vereadora disse que o importante é “derrotar o que há de pior na política”.

“Os últimos anos foram difíceis para o PT. O golpe na presidente Dilma magoou muito a gente. Eu tenho uma perspectiva que nós estamos ampliando nosso campo de aliados. Porque estamos na expectativa de derrotar o que há de pior na política: o Bolsonaro. O MDB é um aliado histórico, o PSDB é um adversário que eu sinto saudades de debater, que pensa diferente, mas que sempre teve capacidade de dialogar”, avaliou.

Ela explicou melhor a “saudade” da polarização “coxinha-mortadela”: “No final das contas, o propósito que a gente queria era o mesmo: redução da desigualdade. O PSDB acreditava num caminho de investir nas empresas, aumentar o capital, fazer com que o empresário tenha dinheiro e contrate mais. Já o PT acredita na distribuição de renda, fazer com que as pessoas tenham mais dinheiro, para elas comprarem mais, para daí os empresários terem mais com que trabalhar. Mas, no final das contas, o propósito era o mesmo. Eu não vejo um propósito político no governo Bolsonaro, tem propósito de poder, mas não tem um projeto político para o Brasil”.

 

“É impossível não sentir medo”

Durante o programa, Karla Coser também comentou sobre o assassinato de um tesoureiro do PT na festa de seu aniversário por um bolsonarista, no Paraná e responsabilizou Bolsonaro pela escalada da violência. Ela também disse sentir medo do clima dessas eleições.

Petista foi morto durante festa de aniversário

“É impossível não sentir medo depois do que aconteceu naquele domingo. Foi um dia muito triste para qualquer pessoa que defenda a democracia. A incapacidade de sentar e conversar com quem pensa diferente de você é uma tristeza muito grande para quem se propõe a estar na política. Porque a política é a arte de conversar. Quando você não consegue fazer isso você está no lugar errado, no espaço errado. E nós avaliamos enquanto partido que o presidente Bolsonaro tem responsabilidade nessas ações. Quando ele sobe num palanque, pega um tripé, e diz que vai metralhar todos os petralhas, ele incita a violência entre as pessoas”, declarou.

“Ninguém quer ser mártir. Ninguém quer morrer por isso, pela política. É horrivel pensar que a nossa profissão e o momento que a gente está vivendo coloca a nossa vida em risco. Eu temo pelas eleições de 2022, acho que estamos no momento mais polarizado, mais difícil. Nada é tão ruim como agora, porque está sendo impulsionado pela rede de ódio de Bolsonaro e seus seguidores”.

Karla também foi perguntada se o PT não teria uma certa contribuição no clima acirrado e agressivo, com a política do “nós contra eles”. Ela disse que não. “A gente tem que separar a reação do oprimido da agressão do opressor. O que muitas vezes acontece com militantes petistas é reagir à agressão que eles sofreram anteriormente. O PT nunca foi um partido que defendeu a violência, em nenhum aspecto, em nenhum local”.

 

PT precisa fazer autocrítica?

Outra questão tratada na entrevista foi sobre a necessidade ou não do PT fazer uma autocrítica com relação a possíveis decisões equivocadas no comando do país e também a suspeitas de corrupção e desvio de recursos públicos. Karla respondeu que o partido nunca se negou a dialogar com a sociedade e corrigir equívocos, mas enfatizou que Lula teria sido injustiçado.

“Os processos que foram feitos da maneira correta, as pessoas estão respondendo por isso. Mas em relação ao presidente Lula, eu não acho que cabe a ele fazer algum tipo de autocrítica nesse sentido. O processo foi extremamente violado, foi escancarado para a ONU, outros espaços institucionais, o STF reconheceu os excessos. Mas a autocrítica é sempre importante, a capacidade de reconhecer o que nós não fizemos de tão bom e que poderíamos ter melhorado”, explicou.

“O PT sempre esteve nos espaços abertos para que as pessoas o criticassem. A gente nunca negou os nossos equívocos, a gente conseguiu avançar em muitas áreas, tivemos limitações em alguns aspectos e talvez decisões equivocadas em outros. A nossa proposição de autocrítica é fazer melhor agora. O PT sempre foi um partido que fez tudo ouvindo muito as pessoas. Quais governos que foram impecáveis e que não tiveram equívocos?”, questionou Karla.

 

Entre Moro e Bolsonaro, Karla votaria em quem?

Casagrande recebeu Moro na Residência Oficial

A vereadora foi questionada se o ruído com Casagrande por conta do episódio da visita do ex-juiz Sérgio Moro tinha sido superado pelo PT. Ela disse que não. “Acho que não será superado, ficou uma mágoa. Nós não gostaríamos que o Moro tivesse sido recebido com pompa e circunstância. É um grande irresponsável, não merece nosso respeito. Com ele não tem diálogo”, disse Karla.

Ela então foi perguntada se, numa situação hipotética de ter num segundo turno Moro e Bolsonaro disputando a Presidência, em quem ela votaria. “Se esse mundo paralelo fosse desenhado e tivéssemos que decidir entre Moro e Bolsonaro eu estaria no momento político mais difícil da vida.

Eu teria que ouvir um pouco mais do Sergio Moro para ver se eu teria coragem, porque voto nulo é uma coisa que eu não defendo em hipótese alguma. Quando você não decide, alguém decide por você. Normalmente as pessoas optam pelo menos pior, a certeza que eu tenho é que Bolsonaro é o que existe de pior na política brasileira”.

“Então, você votaria no Moro?”, questionou a coluna. “Acho que eu votaria no Moro. Mas, sofrendo, porque pra mim o que ele fez na campanha de 2018, agindo como ator político, interferindo nas eleições e se beneficiando disso para ser ministro da Justiça, isso dói muito em qualquer petista, porque ele tirou da disputa a pessoa mais importante, o Lula. Seria um voto muito duro de dar, mas levando em consideração o contexto do que você já viu o que dá errado, da ausência de democracia e respeito, daria esse voto doloroso, no Sergio Moro”.

 

Na íntegra

A vereadora Karla Coser também falou sobre seu mandato na Câmara de Vitória, as denúncias de violência política de gênero que fez e seus desfechos, sobre como o partido vem para as eleições proporcionais e as metas para a Assembleia e Câmara Federal, sobre como analisa os próximos quatro anos independente de quem for o presidente e se o PT se afastou das bases ao longo dos últimos anos. A entrevista completa pode ser conferida aqui: