O pastor televangelista do Rio de Janeiro Silas Malafaia gravou um vídeo, e divulgou em seus canais, endereçado aos eleitores do Espírito Santo. Nele, o pastor defende a eleição ao Senado de Magno Malta (PL), seu aliado. Até aí tudo bem, já faz algum tempo que líderes religiosos deixaram de só pregar o Evangelho para entrarem de corpo e alma na política partidária.
A questão é que, para isso, Silas atacou o candidato ao Senado Nelson Júnior (Avante), que também é pastor, o que fez com que diversos outros pastores capixabas ficassem indignados e culpassem Magno Malta pelos ataques.
“A eleição de senador é uma vaga e um turno só. Eu estou vendo gente que não sabe nem onde está o nariz na política, que chegou agora, pensando que é alguma coisa, que nunca se posicionou e que gosta de ensinar os outros a aprender a esperar, mas ele não espera, que está sendo instrumento da esquerda para derrotar Magno Malta. Você não pode desperdiçar esse voto e jogar esse voto fora, você só tem uma vaga para senador e essa vaga é de Magno Malta. Não caia nesse jogo de gente que não tem história, não tem conteúdo para defender nossos princípios e valores e que faz jogo baixo”, disse Silas no vídeo.
Nelson Júnior é fundador de um movimento chamado “Eu escolhi esperar”, que prega abstinência sexual aos jovens até o casamento. Inspirado nesse movimento, a Câmara de Vitória aprovou uma lei para reduzir os índices de gravidez na adolescência.
Nelson também é escritor e palestrante e coleciona seguidores nas redes sociais. Muito popular entre os jovens, tem 2,1 milhões de seguidores só no Instagram. Em entrevista ao programa “De Olho no Poder com Fabi Tostes”, Nelson disse ser conservador, de direita e que vai votar em Bolsonaro.
Porém, no mercado político, ele é visto como alguém que pode tirar voto de Magno Malta, uma vez que os dois disputam o mesmo eleitorado: religioso, conservador e de direita. Essa leitura pode ter motivado o vídeo de Silas Malafaia.
No Instagram do pastor carioca, os comentários se dividem entre quem apoia Magno Malta e quem defende Nelson Júnior. Já em grupos de conversas mais restritos, pastores ficaram indignados com o ataque gratuito ao colega de pastoreio e o defenderam. Nos bastidores, alguns teriam ido direto a Magno Malta reclamar da ação, chamada no grupo de “infeliz”.
Questionado se teria encomendado o vídeo a Silas Malafaia, Malta negou: “Não tem nada disso. Não somente o pastor Silas, mas outros líderes religiosos fizeram vídeos de apoio à minha candidatura, como Robson Rodovalho, JB Carvalho, Jorge Linhares, Renê Terra Nova e etc”, respondeu o ex-senador ,em nota. A assessoria de Magno Malta enfatizou que o vídeo de Silas foi espontâneo.
Procurada, a assessoria de Nelson Junior disse que respeita a opinião do pastor Silas Malafaia, “considerando em particular todos aqueles que o têm como referência”. Mas, defendeu que Nelson atua há mais de 25 anos com serviços prestados “para a sociedade, para as famílias e para os jovens”.
“Sobre a participação do Nelson na disputa para o Senado, faz parte da democracia e contribui muito para que a população possa ter um campo diversificado com mais opções de escolha, não limitado por polarização, e com alternativa de escolher seu candidato por identificação, não pelo menos pior. Além disso, Nelson Junior é uma pessoa íntegra, preparada, com vasta experiência, além de ter capilaridade não só estadual como nacional, uma visão que protege a família e os seus valores, de um tamanho que lhe dá condições de crescer ao longo da campanha e ganhar a eleição”, diz a nota.
A suposta influência de Magno para tirar concorrentes do seu caminho foi denunciada pelo ex-prefeito Sergio Meneguelli (Republicanos), que era candidato ao Senado. Durante convenção do seu partido, Meneguelli disse que teve sua candidatura retirada pelo Republicanos para favorecer Magno Malta. O ex-senador também nega qualquer participação nesse episódio. Meneguelli agora vai disputar uma cadeira na Assembleia Legislativa.
A César o que é de César…
O envolvimento de líderes religiosos nesta eleição tem chamado a atenção e gerado polêmica. O mais comum, porém, não é briga entre religiosos do mesmo campo ideológico, como no caso envolvendo Silas, Magno e Nelson Junior. Os alvos principais são Lula, partidos de esquerda, fiéis progressistas e outros fiéis que, mesmo sem posição ideológica, criticam o uso do púlpito e de outros símbolos sagrados da religião por líderes ligados a políticos.
No mês passado um relatório assinado pelo reverendo presbiteriano Osni Ferreira e enviado para o Supremo Concílio da Igreja Presbiteriana do Brasil sugeria que fosse criada uma comissão na igreja para repudiar “pensamentos de esquerda”.
O documento dizia que os pastores deveriam afastar de cargos de confiança evangélicos que se alinhassem com políticas progressistas. Osni é bolsonarista ferrenho e já pregou em sua igreja que Bolsonaro tem que ser reeleito.
O documento vazou e, para evitar um racha na igreja, foi substituído por um outro relatório que dizia que não é finalidade da Igreja Presbiteriana se manifestar sobre partidos políticos. O substitutivo foi aprovado no último dia 29 pelo Supremo Concílio.
Já nessa semana, um pastor da Igreja Assembleia de Deus de São Paulo disse durante um culto que eleitores de Lula não merecem tomar a “Santa Ceia do Senhor”. Na tradição cristã, participar da Santa Ceia significa ser parte do Corpo de Cristo, em outras palavras, ser parte da igreja. Doutrinariamente, a proibição de participar desse memorial, em algumas igrejas, é para quem ainda não é batizado ou está “em pecado”.
Em boa parte das igrejas, o que o líder religioso diz é seguido como lei. Descumprir o que é pregado nos púlpitos resulta em punições aos membros, como afastamento das atividades desenvolvidas (fazer parte da banda de música, participar de eventos, pregar nos cultos, liderar um grupo de estudos, etc.) e até expulsão daquela congregação. É inegável o poder de influência e mobilização de líderes religiosos, principalmente de denominações carismáticas.
O TSE sepultou a tese sobre o abuso de poder religioso. Ainda assim, não é permitido fazer propaganda política positiva ou negativa de candidatos dentro dos templos. Além de caracterizar propaganda eleitoral irregular pode também se enquadrar em abuso de poder econômico, conforme explicou o advogado eleitoral Marcelo Nunes em entrevista ao programa “De Olho no Poder”. A punição vai de multa até a cassação do mandato do candidato beneficiado.
Na última segunda-feira, o TRE-ES inaugurou o Núcleo de Combate aos Crimes e à Corrupção Eleitoral (Nucoe) para receber denúncias com relação a crimes e irregularidades durante a campanha eleitoral.
O núcleo foi criado para dar “apuração imediata de denúncias de propaganda eleitoral irregular, bem assim das demais práticas ilícitas previstas na legislação eleitoral, tais como a captação ilícita de sufrágio, o abuso de poder econômico, infrações penais e as condutas vedadas aos agentes públicos e todos os atos praticados durante o período eleitoral que possam afetar a igualdade de oportunidades entre os candidatos do pleito”, diz texto no portal do TRE.