A Câmara dos Deputados aprovou na noite desta quarta-feira (13), em regime de urgência, o PL 4438/23, que traz mudanças na legislação eleitoral já com validade para o ano que vem. Foram 367 votos favoráveis e 86 contrários.
Batizada de Minirreforma Eleitoral, a proposta foi fatiada em dois projetos: o PL 4438/23 e o PLP 192/23 – que será votado hoje, assim como os destaques (emendas ou partes do texto principal que, a pedido dos deputados, podem ser votados de forma separada) ao projeto de lei. Com exceção do Novo e da federação Rede-Psol, os demais partidos e blocos ou liberaram suas bancadas ou orientaram o voto favorável, como o caso do PT.
A maioria da bancada federal capixaba (6) votou a favor da Minirreforma, mas os deputados de mesmo partido se dividiram. Os parlamentares do PP, PT e Podemos, por exemplo, tiveram votos divergentes.
Votaram a favor, os deputados: Amaro Neto (Republicanos), Da Vitória (PP), Victor Linhalis (Podemos), Jack Rocha (PT), Messias Donato (Republicanos) e Paulo Foletto (PSB).
Já os deputados Evair de Melo (PP), Gilson Daniel (Podemos), Gilvan da Federal (PL) e Helder Salomão (PT) votaram contra.
O texto da reforma traz diversas mudanças, entre elas algumas bastante polêmicas, como o enxugamento do tempo de inelegibilidade do político condenado, proibição de sanção que implique na suspensão de repasses de recursos no semestre da eleição e mudanças na distribuição das vagas de sobra nos parlamentos. (Veja o projeto na íntegra aqui: PL-4438-2023 MINIRREFORMA ELEITORAL.)
Analistas pontuam que as mudanças também enfraquecem o Judiciário, uma vez que tiram das mãos da Justiça a definição sobre o que é fraude à cota de gênero, e que abrem brecha para a impunidade.
Há pontos também considerados inovadores como a obrigatoriedade do fornecimento de transporte público gratuito no dia da eleição, movimentação e doação de recursos para a campanha por meio de pix e as candidaturas coletivas.
Maiores partidos beneficiados
Entre os pontos mais polêmicos e debatidos na sessão de ontem – que terminou depois das 22 horas –, está a distribuição das vagas de sobras para preencher as cadeiras dos parlamentos.
Hoje, para um partido conquistar uma cadeira na Câmara de Vereadores, Assembleia Legislativa ou Câmara Federal, ele precisa alcançar o quociente eleitoral (QE), que é o resultado da divisão dos votos válidos pelo número de vagas. O candidato também precisa alcançar 10% da votação do QE.
Por exemplo, determinado município tem 10 vagas de vereadores e o número de votos válidos na eleição foi de 100 mil votos. Para o partido conquistar uma cadeira ele precisa então alcançar 10 mil votos (votos válidos / vagas), que é o quociente eleitoral. Já o candidato precisa ter uma votação mínima de 10% desse quociente, ou seja, 1.000 votos, para ser eleito. Se o partido alcançar 20 mil votos, terá direito a duas vagas, e assim sucessivamente, nessa primeira fase de distribuição.
Se nem todas as vagas forem preenchidas nessa 1ª distribuição – pelo fato do partido e/ou candidato não alcançarem o mínimo da votação –, parte-se para a segunda fase de distribuição que, hoje, é no modelo 80/20, ou seja: o partido terá uma cadeira se alcançar 80% do quociente eleitoral e seu candidato, 20% na votação individual. Se ainda sobrarem vagas, segue para a terceira fase, com o mesmo modelo de distribuição, 80/20.
Porém, o texto da Minirreforma muda esse critério. A distribuição das vagas passará por 4 fases: na primeira será o modelo 100/10 (alcance de 100% do quociente eleitoral pelo partido e 10% pelo candidato), na segunda fase, também 100/10. Na terceira fase, apenas será cobrado do partido o alcance de 100% do QE, sem exigência mínima de votação dos candidatos; e na quarta e última fase, todos os partidos, independentemente da votação que alcançaram, participam da distribuição.
É uma daquelas regras complexas e confusas que parecem encomendadas para o eleitor não compreender. Porém, de forma prática, a mudança tende a beneficiar os partidos maiores, que costumam receber muitos votos de legenda.
Fraude à cota de gênero
A Minirreforma também tratou de regulamentar o que seria caracterizado fraude à cota de gênero – o que no mercado político é conhecido como “candidatura laranja” de mulheres para burlar a lei das cotas que exige 30% de candidaturas femininas.
O texto da Minirreforma diz que: “Constitui abuso de poder político a fraude à cota de candidaturas femininas quando verificadas, cumulativamente, as seguintes situações: I – não realização de atos de campanha. II – obtenção de votação que revele não ter havido esforço de campanha, com resultado insignificante.”
O texto não detalha a quantidade que seria considerada insignificante e chama a atenção para o termo “cumulativamente”, ou seja, a candidata precisa apresentar as duas situações para sua candidatura ser considerada ilegal.
O texto ainda traz um desdobramento: “Parágrafo único: É permitida a renúncia de candidata após o pedido de registro de candidatura, mediante apresentação de declaração de desistência justificada, acompanhada de documentos que comprovem o alegado, sem prejuízo da responsabilização da candidata e do partido ou federação.”
Ou seja, a isenção do partido ou da federação em caso de desistência da candidata pode abrir brecha para eventuais candidaturas fictícias. Como evitar que o registro de candidatura não seja usado apenas para cumprir cota, uma vez que essa candidatura poderá não vingar lá na frente? E como provar que essa desistência já era premeditada?
Um outro ponto que também mudou e recebeu muitas críticas foi a questão de recursos destinados a candidaturas de mulheres poderem custear despesas de candidatos, inclusive propaganda, o que não é permitido hoje. A ressalva é para que esse custeio, de alguma forma, beneficie a candidatura feminina. Na prática, o recurso para as campanhas das mulheres candidatas pode reduzir.
Inelegibilidade ficou para hoje
Já o texto que redefine a data a partir da qual são contados os oito anos de inelegibilidade de agentes públicos condenados deve ser votado hoje, no PLP 192/2023. Pela proposta, haverá um enxugamento do cumprimento da pena e o político condenado passará menos tempo fora do poder. (veja o texto completo do projeto aqui: PLP-192-2023 MINIRREFORMA ELEITORAL)
O que acontece hoje? Muitas vezes o agente político é condenado a ficar oito anos inelegível, mas ele entra com recurso e enquanto está recorrendo, continua no cargo exercendo o mandato. Depois, quando sai a condenação definitiva, ele passa a cumprir os oito anos de inelegibilidade.
O texto, porém, propõe: “Computa-se, no prazo de 8 (oito) anos de inelegibilidade, o tempo transcorrido entre a data da decisão proferida por órgão colegiado e a data do seu efetivo trânsito em julgado”.
Ou seja, mesmo que o agente público esteja exercendo mandato, recorrendo, esse tempo será diminuído dos oito anos e, na prática, como os julgamentos tendem a se arrastar por conta da infinidade de recursos colocados, o tempo em que o condenado ficará fora do poder será bem menor do que os oito anos que a lei prevê.
E há ainda um complemento na proposta ainda mais polêmico, que é o seu efeito retroativo: “Art. 27-A. As alterações introduzidas nesta Lei Complementar quanto ao termo inicial e à contagem dos prazos de inelegibilidade terão aplicação imediata, inclusive em relação a condenações e fatos pretéritos.”
Os destaques, que serão analisados hoje e têm o poder de mudar o texto já aprovado, tratam das sobras de vagas; da fusão e da incorporação de partidos; da limitação à propaganda conjunta (dobradinhas); do número de candidatos de cada partido; de candidaturas coletivas e de janela partidária, entre outros. A sessão está marcada para começar as 9 horas.
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