Ricas diz não ter projeto político para 2026. Já combinou com a mosca azul?

Eugênio Ricas / crédito: Thiago Soares

O governador Renato Casagrande (PSB) convocou uma coletiva de imprensa, na tarde desta terça-feira (06), para apresentar o novo secretário de Segurança Pública do Espírito Santo.

Conforme antecipado pela coluna De Olho no Poder na segunda, o superintendente da Polícia Federal no Estado, delegado Eugênio Ricas, vai assumir o posto deixado por coronel Alexandre Ramalho e comandar uma das pastas mais sensíveis da gestão.

Casagrande justificou sua escolha citando a competência e a trajetória de Ricas que, inclusive, já foi seu secretário em outros mandatos – embora o delegado tenha tido maior proximidade, no passado, com o ex-governador Paulo Hartung.

Revelou o que espera do novo integrante da equipe a quem entregou a missão de dar continuidade e ampliar o programa Estado Presente, além de investir maciçamente em tecnologia – algo que o governo do Estado já tem feito, mas que a Polícia Federal tem expertise.

E os dois acordaram em trabalhar para levar o Estado para o ranking de quinto, terceiro ou até primeiro lugar entre os estados mais seguros do País. Meta audaciosa – hoje o Estado está em 14º de acordo com dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2023 –, mas que fez parte do pacote de promessas de campanha do governador em 2022.

Para isso, há alguns desafios a serem superados, como continuar com a mesma pegada de redução de homicídios anualmente; combater o tráfico de armas que empodera facções criminosas que atuam no Estado; trazer a Capital, Vitória, para o eixo, tendo em vista que foi a única cidade da Região Metropolitana a apresentar aumento no número de assassinatos; prevenir e combater os casos de feminicídio.

Não é pouca coisa. Além de ser uma pasta com muitas demandas, há também muita pressão. A cobrança vem de todos os lados: das vítimas de crimes por solução, da sociedade por justiça, do governo por resultado.

Mas, há também um outro ponto, o outro lado da moeda: a visibilidade. Muitos holofotes estão virados para a cadeira de comandante das forças policiais do Estado. E se o desempenho for bom, se o resultado for além do esperado, se superar positivamente as expectativas, a visibilidade pode render frutos.

Se não fosse dessa forma, o Espírito Santo não teria tantos ex-secretários de Segurança se aventurando no mundo político. Coronel Alexandre Ramalho – que atualmente passa férias na Bahia, mas que na volta decide seu futuro político – não foi o único a ser projetado politicamente após passar pela Sesp.

Só para citar alguns casos de um passado recente, o Espírito Santo já teve como secretário da Segurança o delegado Rodney Miranda, que atuou no governo de Paulo Hartung entre 2003 e 2005 e depois de 2007 a 2010.

Rodney foi secretário num momento em que o Espírito Santo se encontrava mergulhado no crime organizado, com fugas espetaculares de bandidos perigosos pela porta da frente da prisão e assassinato de juízes. Em 2010, Rodney virou deputado estadual e, dois anos depois, foi eleito prefeito de Vila Velha.

O substituto de Rodney foi André Garcia, que também esteve em dois momentos à frente da Sesp: entre 2010 e 2011 – no primeiro governo de Casagrande – e, depois, retornou em 2013, ficando até 2018, já no governo do sucessor, Paulo Hartung.

À frente da Sesp enfrentou um dos momentos mais delicados do Estado: a greve da PM, em 2017, o que acabou lhe rendendo muita visibilidade. Em 2018, deixou o governo em abril para disputar uma vaga de deputado estadual.

Seu sucessor foi Coronel Nylton Rodrigues, que foi alçado a comandante-geral da PM durante o movimento grevista de 2017, onde teve uma atuação marcante, e acabou virando secretário da Segurança depois. Em 2020, Nylton, já fora do governo, se filiou ao Novo e disputou a Prefeitura de Vitória.

Já o coronel Alexandre Ramalho, que em 2018 virou comandante-geral da PM, em 2020 foi convidado pelo governador Renato Casagrande para assumir a Sesp num momento em que os homicídios tinham dado um salto fora da curva.

Em 2022, tentou se viabilizar como candidato ao Senado, mas terminou disputando a Câmara Federal. Voltou ao governo Casagrande, entregou no ano passado o menor índice de homicídios de toda a série histórica (26 anos) do Espírito Santo. Bastante popular e midiático, agora deixa a gestão para decidir se disputa a Prefeitura de Vila Velha ou de Vitória.

Não se sabe se a mosca azul, esse lendário inseto que adora política, ronda a cadeira de secretário à espera de “morder” seu ocupante e fazê-lo aspirar a um posto de mais poder. Fato é que, tradicionalmente, quem ocupa a Sesp acaba trilhando o caminho político depois.

Ricas, Casagrande e Duboc / crédito: Thiago Soares

E Ricas?

O novo secretário foi questionado pela coluna, ontem na coletiva de imprensa, se também teria pretensões políticas para 2026. Porém, em poucas palavras, ele descartou. “Não tenho pretensão política, não penso em política para 2026. Minha meta é fevereiro, espero que fevereiro tenha menos homicídios que fevereiro de 2023”, disse Ricas.

O governador enfatizou: “Conversamos sempre sobre políticas de segurança pública, não tratamos de projetos eleitorais. Até porque nós temos uma caminhada longa até chegar 2026, e a gente tem que apresentar resultado para a população capixaba”.

Não caberia aos dois outra resposta. Seria muito complicado explicar para a população capixaba e para as lideranças que já respiram 2026, a chegada de um secretário com os olhos voltados para as eleições. Toda ação, operação, aparição pública seriam questionadas e deslegitimadas. Enfrentaria resistência interna e sua permanência no cargo seria colocada em risco.

Isso não quer dizer, porém, que nos bastidores ou daqui a dois anos a intenção não seja outra.

Em 2022, Ricas chegou a ensaiar uma candidatura ao governo. Numa entrevista dada ao programa De Olho no Poder, na rádio JP News Vitória, Ricas admitiu a possibilidade de disputar ainda naquele ano.

“Tenho sido procurado por muitas pessoas, empresários, lideranças políticas, religiosas, pessoas comuns. Eu pego um uber, o motorista me reconhece e fala que o Espírito Santo precisa de renovação, nas redes sociais tenho recebido muitas perguntas e pensado muito sobre isso. Sou apaixonado pela Polícia Federal, nunca nem cogitei sair da polícia, mas admito que estou pensando sim em ser candidato”, disse ele, à época.

Chegou a dizer que fora convidado por quatro partidos de centro-direita – que é o seu perfil político e ideológico – mas que estava mais próximo do PSD, sendo incentivado a disputar por Hartung.

Porém, a indefinição do PSD a dar legenda para o delegado, que teria de disputar internamente com o ex-prefeito de Linhares Guerino Zanon a vaga do partido para concorrer mesmo se deixasse a PF, fez com que Ricas desistisse e recuasse. Na época, ele ficou bastante frustrado.

Pode ser que a frustração tenha gerado um trauma a ponto de Ricas não querer mais ouvir falar do jogo político. Mas a mosquinha azul continua rondando a cadeira…

À frente da Sesp, recebendo a visibilidade que o cargo proporciona – é ordem do governador que o secretário apareça à opinião pública para explicar as ações de segurança –, pode ser que o cenário mude. Por ora, é acompanhar os primeiros resultados. Porque, de fato, serão os números apresentados que poderão traçar ou não um caminho de sucesso para o novo secretário.

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