Entenda os pilares da responsabilidade civil do dentista
O universo das mentes pueris- crianças e adolescentes- é permeada de fantasias, personagens, contos e fábulas. E, obviamente, super-heróis. Lembro da canção João e Maria com muito carinho: “Agora eu era o herói, e meu cavalo só falava inglês”, Chico Buarque responsável pela letra e Sivuca pela melodia.
Um desses heróis é o Homem Aranha. Assisti a vários filmes da série e uma frase sempre me despertou para reflexões: “com grandes poderes vêm grandes responsabilidades”. Essa frase foi dita pelo tio do Peter Parker, o tio Ben. Quanto à originalidade, há quem credite a frase à Voltaire, um dos grandes pensadores do Iluminismo francês.
Deixando as teias e saltos de lado, pelo menos em parte, trataremos neste artigo da responsabilidade civil do dentista, o grande detentor dos poderes. Reponsabilidade (do latim respondere) corresponde ao deve de responder pelos atos próprios e de terceiros sob proteção legal.
A responsabilidade civil decorrente de ação humana para existir sustenta-se em alguns pilares. São eles:
• ato voluntário (ação ou omissão);
• dano;
• nexo de causalidade entre o ato praticado pelo agente e o dano ocorrido.
Sem a existência de um dano, não há como acionar ou discutir o campo da responsabilidade civil. Pelas atividades desenvolvidas pelo cirurgião-dentista no setor profissional e social, torna-se imprescindível o conhecimento do conceito da responsabilidade e das implicações ético-legais que, porventura, possam ocorrer na existência de um dano.
O Código Civil prevê em seu artigo 927 que aquele que por ato ilícito causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. O ato ilícito foi definido no artigo 186 do referido diploma com a seguinte redação: “aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.
A Constituição do Brasil de 1988, em seu artigo 5º, V traz o direito de resposta proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem. Deixaremos para outra ocasião a diferença entre responsabilidade objetiva e responsabilidade subjetiva, quando uma ou outra entram em cena e a relação com o Código de Defesa do Consumidor.
A regra básica da responsabilidade civil é a existência de culpa, exteriorizada em negligência, imperícia e imprudência; todavia, em algumas ocasiões excepcionais e dependendo da natureza da obrigação do cirurgião-dentista, se de meio ou de resultado, teremos a responsabilidade sem a existência de culpa.
Na obrigação de meio, o dentista empreende todos os esforços, técnicas e conhecimentos durante o tratamento, sem ter a obrigação do resultado pretendido. Na obrigação de resultado, o profissional vincula-se, obrigatoriamente, ao resultado. Essa distinção é essencial e deve ser direcionada e trabalhada na confecção e escrita dos documentos que farão parte do prontuário do paciente.
O Homem Aranha, em suma, entra em cena quando regras, obrigações e deveres são quebrados, infringidos, não respeitados. Entra como um tutor da justiça, detentor dos meios e conhecimentos para o restabelecimento da ordem. O profissional da odontologia vive em meio social, é um organismo sociável e estabelece relações pessoais e contratuais com seus pacientes.
Nada mais justo e certo conhecer para aplicar, apreender as regras e condutas adequadas para se chegar o mais próximo possível do real, do pretendido. O instituto da responsabilidade existe quando há um dano a ser reparado, um autor que fez ou deixou de fazer e um nexo de causalidade entre o dano e o agente praticante do mesmo.
O conhecimento, a diligência, o cuidado e a presteza com os documentos odontológicos e o bom convívio profissional e pessoal são ferramentas valiosas no exercício da profissão.
As teias do nosso super-herói não suportam todos os danos que possam ser causados. Deixemos o Homem Aranha, somente, para as telas e o imaginário das nossas crianças e não deixemos que a fatalidade encerre o faz de conta.
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