Videogames: uma arte do século XXI?

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Carlos Queiroz

Assim como o cinema foi, em seu momento, questionado como forma de arte, os videogames estão agora no centro de um debate sobre seu papel na cultura contemporânea.

Por muito tempo vistos apenas como produtos de entretenimento, os games estão se afirmando como obras de arte interativas, onde a narrativa e a estética não são meramente observadas, mas moldadas pela ação do jogador.

Vale destacar que o grande diferencial dos videogames reside em seu caráter imersivo e interativo. Essas características permitem que o jogador participe de narrativas emocionais profundas, não apenas contemplando, mas “vivendo” uma multiplicidade de experiências sensíveis e subjetivas.

Nesse sentido, Gilles Deleuze e Félix Guattari, ao falarem de “rizoma” e “devir”, nos oferecem um esteio conceitual que nos ajuda a pensar a arte como um campo de experimentação contínua.

Esses conceitos, por exemplo, nos levam a pensar a obra de arte como algo que ultrapassa a mera contemplação, abrindo espaço para novas formas de subjetividade e interação.

No caso dos videogames, o jogador não é apenas espectador, mas experimenta transformações, participando de uma obra em movimento. Podemos, então, discutir a arte como emancipação — aqui lembrando Jacques Rancière — onde o jogador se apropria da obra, criando significados próprios e subjetivos a partir da interação.

Embora o jogador não seja um coautor no sentido literal, ele emancipa-se ao se engajar com a obra, transformando-a de acordo com suas próprias experiências.

Um exemplo disso é Journey (2012), da thatgamecompany. Nesse jogo, o jogador assume o controle de um personagem sem rosto, que atravessa vastos desertos em direção a uma montanha. A narrativa minimalista e a ausência de diálogos permitem que o jogador projete suas próprias emoções na jornada.

O cenário aberto, a trilha sonora imersiva e as interações com outros jogadores anônimos criam uma experiência altamente subjetiva, na qual o jogador “devém” junto ao personagem.

A obra, nesse caso, é um ponto de partida para uma experiência estética aberta, composta de múltiplos caminhos e subjetivações. Jogos que se lançam a esse desafio transformam o significado original — se é que ele existe — da própria ideia de jogar, onde o gameplay é frequentemente caracterizado pela superação de desafios ou cumprimento de objetivos.

Contudo, aqui, os jogos se tornam jornadas visuais, sensoriais e emocionais que se aproximam do que chamamos de arte, talvez a arte do século XXI. Nos videogames, o “devir” — a transformação contínua da experiência — é parte integral da obra, onde o jogador não apenas joga, mas se transforma.

 

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Carlos Queiroz

Professor do Departamento de Geografia-Ufes e do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Territorialidades-PÓSCOM/Ufes.