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A coluna nasce da necessidade de se criar e ocupar um espaço no jornal que proponha o debate, a crítica e a divulgação sobre as artes, no contexto da arte contemporânea. Fernando Augusto, artista visual e professor da UFES e Flávia Dalla Bernardina, advogada e curadora de arte, provocados pelo Folha Vitória, conduzem esta coluna semanal, onde junto a um time de colaboradores do Espírito Santo e de outros estados brasileiros, publicarão às terças-feiras textos sobre arte, fazendo conexões com diversas áreas do conhecimento.

A coluna nasce da necessidade de se criar e ocupar um espaço no jornal que proponha o debate, a crítica e a divulgação sobre as artes, no contexto da arte contemporânea. Fernando Augusto, artista visual e professor da UFES e Flávia Dalla Bernardina, advogada e curadora de arte, provocados pelo Folha Vitória, conduzem esta coluna semanal, onde junto a um time de colaboradores do Espírito Santo e de outros estados brasileiros, publicarão às terças-feiras textos sobre arte, fazendo conexões com diversas áreas do conhecimento.

Cena do filme "Dias Perfeitos", do diretor Wim Wenders. Imagem obtida na internet.

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"Dias perfeitos", filme de Wim Wenders: previsibilidade e caos da condição humana

Não se trata de um filme dilacerante e nem se vale de apelos catárticos. “Dias perfeitos” é enxuto, cheio de interditos e entrecortado por pequenas belezas cotidianas, que traz o fino diálogo entre cinema e psicanálise, e mostra uma maneira outra de se movimentar no mundo, uma espécie de contenção que deposita em cada gesto um sentido próximo ao sublime, uma forma de capturar o silêncio das coisas a partir de filigranas. Essa pura alteridade, um jeito de fazer-se sujeito de sua história, o abismo geracional, dentre outras sutilezas, parecem render homenagem ao cinema de Yasujiro Ozu.

Rosindo Torres. Atributos para jovens rebeldes. Pintura vinílica sobre reprodução. 2001

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Pode a inteligência artificial conceber arte? Parte 2

Em síntese, a obra de arte não nasce da combinatória automática de dados disponíveis num arquivo potencialmente infinito e sim do embate necessário com uma condição de existência, a princípio, brutal e incompreensível. Ela não surge da abundância e sim da penúria, como resposta ao vazio, à falta e ao desamparo. As inteligências artificiais não concebem arte porque não podem sentir esse drama, nem possuir o arbítrio necessário para oferecer a ele uma resposta. O máximo que podem fazer, nas suas operações automáticas, é trocar a simbolização pela programação, o embate existencial pela combinatória e o significado pelo efeito.

Kelly Reis. Detalhe do grafite “Coroa de Lírios”. Projeto “Estamxs Vivxs - Mulheres Emergentes”, Studio Soberana, Jaraguá, São Paulo. 2023. São Paulo. Foto: Raphael Aliens.

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Grafite "Coroa de Lírios" faz referência a famosa poetisa

Ao apreciar o grafite de Kelly Reis, percebo a importância de adotar uma perspectiva decolonial. É possível que você, assim como eu, talvez nunca tenha ouvido falar em Leodegária de Jesus antes. Isso nos impulsiona a reconsiderar e ampliar nosso conhecimento sobre figuras fundamentais da cultura negra, frequentemente esquecidas ou negligenciadas nos ambientes tradicionais de educação e cultura. Atribuir uma identidade visual à escola não apenas introduz arte à comunidade escolar, mas também fomenta um senso de pertencimento ao local.

Imagem gerada por IA, em domínio público.

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"Saltburn" ou posso resistir a tudo, menos às tentações

Diante de um mundo prestes a entrar em colapso, onde notícias sobres guerras e catástrofes nos assombram a todo momento, parecemos estar diante de uma humanidade dividida entre trabalhadores cansados de tanta exploração, céticos quanto a um futuro melhor, e certos de que o melhor é aproveitar os prazeres da vida que estão ao seu alcance, e por outro lado esse modelo de rico infantilizado, incapaz de lidar com as emoções, tomar decisões, e afundados em excessos de toda sorte. E é no sexo e nas drogas que todos acabam se encontrando.

Imagem disponível na internet

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Anatomia de uma queda: quando tudo desaba, o que é possível escrever?

Em “Anatomia de uma queda”, de Justine Triet, somos confrontados com uma atordoante história de amor. O filme nos inquieta por ser excessivamente real, sem pirotecnias ou excessos. O que impacta é justamente a presença de algo fundante em qualquer relação de amor: o ressentimento. Há a marca de uma história que atravessa os anos com suas dores, alegrias e traições. E há amor – com tudo que o amor abriga de horror. O filme descortina essa dimensão terrivel que se infiltra no cotidiano de forma subreptícia, revelando que em toda parceria amorosa e sintomática há sempre algo também daquilo que Jacques Lacan chamou de “amódio”. Parte do filme acontece em um tribunal, mas não se trata de grandes mistérios e reviravoltas: o grande enigma é mesmo a escrita de uma vida. Ali, como acontece na vida, não há separação estanque e fixa do que usualmente se nomeia realidade ou ficção. Há camadas diversas de questões: a maternidade, a paternidade, a queda como abalo imaginário da paixão frente ao insuportável do cotidiano, as ambiguidades que estão em jogo no amor, a raiva. Não há propriamente vítima e algoz e o que há de mais preciso no filme encontra-se encarnado na opacidade da deficiência visual do filho, com seus olhos turvos e sua sensibilidade. Mais do que revelar um crime, ”Anatomia de uma queda” é um filme que não oferece concessões ao que se escreve de uma história. A queda é também a surpresa que revira qualquer certeza e nos lembra de que, quando estamos imantados por aquilo que nomeamos “amor”, guardamos aí também algo de nossos delírios e fantasias fundamentais.

O silêncio não tem paz: uma viagem pelos sons e pelas palavras

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O silêncio não tem paz: uma viagem pelos sons e pelas palavras

O artista sabe que sua presença no mundo é um ensaio sobre seu desejo de ir além do discurso social insosso; das pequenas bandeiras para ganhar batalhas combinadas; dos destinos anódinos e confortáveis da palavra no blá blá blá…(.n),.. palavra imolada e entregue ao plágio do entretenimento voraz, ao objeto consumível e à pose quantificável pelo algoritmo, aos passos e fórmulas de uma psicologia do sucesso, quiçá à aceitação de uma obsolescência programada para a arte.

Vida, arte e psicanálise: uma análise sobre Ferreira Gullar

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Vida, arte e psicanálise: uma análise sobre Ferreira Gullar

Viver não tem explicação. E não saber dói. É neste o ponto, segundo Lacan, que desejo de saber se torna o horror de saber, ao se deparar com a falta de sentido para a vida. Mas é também aí, o ponto de possibilidade de virada, onde a vida em repetição pode ganhar margem para invenção. Margem de liberdade que vem com a grande responsabilidade de compor sua própria vida, escrever em tempo real a sua história.