O encanto das saíras-douradinhas

Encontro com saíras-douradinhas durante busca por um sítio em Domingos Martins mudou o curso da minha história. Conheça essa aventura e sua lição!

28 de novembro de 2024
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Saíra-douradinha segurando uma frutinha vermelha em seu bico, destacando a sua importância na dispersão de sementes

Saíra-douradinha em seu habitat natural, alimentando-se de uma frutinha vermelha. Sua alimentação ajuda na regeneração da floresta. | Foto: Leonardo Merçon/Instituto Últimos Refúgios

A saíra-douradinha é uma das mais comuns no Espírito Santo. Já tive a oportunidade de fotografá-las algumas vezes. 

E muitas das vezes, elas não apresentavam medo. Levando suas vidas como se eu não estivesse lá… fotografá-las comendo não é difícil.

Porém, ao apresentar fotos dessa espécie tão bonita, lembrei-me de uma história que vale a pena contar. O dia em que uma manhã clara e serena marcou o início de uma das histórias mais curiosas da minha vida como fotógrafo de natureza. 

O destino me levou ao interior de Domingos Martins, no Espírito Santo, em busca de um refúgio para a alma e a câmera: me desfazer de tudo na cidade e trocar por um sítio onde eu poderia viver cercado por natureza, águas correntes e o canto dos pássaros. 

No entanto, como a vida no meio natural costuma nos surpreender, minha busca pelo sítio ideal terminou com um desfecho inesperado, graças a um pequeno pássaro de cores vibrantes — a saíra-douradinha.

Um plano cheio de sonhos

Eu procurava um lugar onde pudesse construir meu sonho de envelhecer em paz, rodeado por um pedaço de floresta viva, que eu pudesse ajudar a proteger. 

Sempre acreditei que a verdadeira riqueza está nas experiências, e não no acúmulo de bens. Cada pedaço de terra que eu visitava carregava a esperança de encontrar o lugar onde a natureza pudesse florescer junto comigo. Ela protegendo minha alma e eu protegendo suas fronteiras.

Quando soube de uma propriedade em Domingos Martins, senti que estava prestes a encontrar esse pedaço de paraíso. 

Cercada por uma floresta promissora, uma nascente e um platô perfeito para uma casa com vista deslumbrante, essa terra parecia tudo o que eu sonhara. Marcamos uma visita com o proprietário e lá fomos explorar cada canto.

Um encontro que mudou meu destino

Enquanto caminhávamos pelo sítio, trocamos impressões sobre o potencial da terra. O proprietário me contou sobre o uso agrícola do local e, embora ele não tivesse tanta familiaridade com as espécies que por ali habitavam, falava com paixão sobre o que a terra lhe proporciona. Mesmo que meu interesse fosse outro, a floresta em pé, achei linda a conexão dele e de sua família com a região.

Subimos até um platô já limpo, onde ele planejava uma futura construção. Foi quando ouvi, ao longe, um som inconfundível: o canto de um bando de saíras-douradinhas.

Não hesitei. Com um toque no celular, reproduzi o canto da espécie. Para a nossa surpresa, mais de dez saíras-douradinhas se reuniram na copa de uma pequena árvore próxima. 

Saíra-douradinha pousada em galhos com flores rosas, destacando sua beleza vibrante

A delicadeza da saíra-douradinha em harmonia com flores rosas do seu habitat. | Foto: Leonardo Merçon/Instituto Últimos Refúgios

Elas pareciam iluminar a paisagem com seu amarelo vibrante, como enfeites de Natal em uma árvore verde. Nunca tinha visto um bando tão grande. 

O espetáculo foi tão impressionante que até o proprietário, acostumado à terra, ficou boquiaberto.

O sítio que não foi

Naquele instante, percebi que algo mudou. A empolgação dele ao ver as aves tornou-se quase palpável. 

A impressão é de que ele e sua família há tempos não percebiam a riqueza natural daquele lugar. Aqueles pequenos pássaros, com sua simplicidade, despertaram um amor adormecido pela terra.

Dias depois, recebi a notícia que não esperava: ele desistiu de vender o sítio. Percebi o meu equívoco em fazê-lo valorizar o que tinha de uma forma diferente. Acredito que não quis mais vender, pois foi como se ele tivesse enxergado sua terra com novos olhos. 

Refleti… Por um lado, perdi o negócio, mas por outro, acredito que tenha sensibilizado ainda mais aquele proprietário. No final das contas, acho que valeu a pena.

Uma joia alada

A saíra-douradinha (Tangara cyanoventris), é uma joia das matas brasileiras. Com sua cabeça amarela, peito azul piscina e dorso estriado de preto e amarelo, ela também encanta por sua importância ecológica. 

Alimentando-se de pequenos frutos, dispersa sementes, ajudando a regenerar florestas. 

Saíra-douradinha coletando material para construir seu ninho, mostrando sua dedicação na reprodução

A saíra-douradinha é vista em ação, coletando material para seu ninho. | Foto: Leonardo Merçon/Instituto Últimos Refúgios

Essas aves vivem em pequenos bandos, muitas vezes acompanhadas por outras espécies de aves, criando uma sinfonia colorida na copa das árvores.

Elas habitam regiões montanhosas do Sudeste e Nordeste do Brasil, mas estão cada vez mais restritas devido ao desmatamento. Fotografá-las é um lembrete da fragilidade de nossos ecossistemas.

O aprendizado da natureza

Embora eu tenha perdido o sítio em Domingos Martins, ganhei algo ainda mais valioso: a confirmação de que a natureza tem um poder transformador. 

Vista panorâmica de uma área florestal em Domingos Martins, destacando a beleza preservada da região

Paisagem exuberante de uma das áreas visitadas durante a busca pelo sítio ideal. | Foto: Leonardo Merçon/Instituto Últimos Refúgios

Essa minha aventura me lembrou muito a famosa história, que usa o poeta Olavo Bilac como personagem:

“Certa vez, um amigo do poeta Olavo Bilac queria muito vender uma propriedade, de fato, um sítio que lhe dava muito trabalho e despesa. Reclamava que era um homem sem sorte, pois as suas propriedades davam-lhe muitas dores de cabeça e não valia a pena conservá-las. Pediu então ao amigo poeta para redigir o anúncio de venda do seu sítio, pois acreditava que, se ele descrevesse a sua propriedade com palavras bonitas, seria muito fácil vendê-la.

E assim Olavo Bilac, após conhecer o sítio do amigo, redigiu o seguinte texto:

“Vende-se encantadora propriedade onde cantam os pássaros, ao amanhecer, no extenso arvoredo. É cortada por cristalinas e refrescantes águas de um ribeiro. A casa, banhada pelo sol nascente, oferece a sombra tranquila das tardes, na varanda.”

Meses depois, o poeta encontrou o seu amigo e perguntou-lhe se tinha vendido a propriedade.

“Nem pensei mais nisso”, respondeu ele. “Quando li o anúncio que você escreveu, percebi a maravilha que eu possuía.”

Algumas vezes, só conseguimos enxergar o que possuímos quando pegamos emprestados os olhos alheios.”

 

Essa experiência reforçou minha convicção de que a conservação pode começar pelo olhar. A fotografia é minha maneira de mostrar a outros o que talvez passe despercebido, com a sensibilidade de alguém que ama a natureza!

Descubra a sua riqueza

Hoje, conto essa história com um sorriso. Acabei encontrando um outro pedaço de floresta maravilhosa à venda em Santa Teresa, mas isso é tema para outra aventura. 

Representação artística de como seria minha casa no sítio descrito na história, cercada pela natureza

Representação artística de como seria minha casa no sítio, integrada à natureza local. | Arte: Leonardo Merçon/Instituto Últimos Refúgios

Quero deixar uma pergunta para você: será que você já parou para observar os tesouros que possui? Seja uma amizade, um pedaço de terra ou mesmo o simples privilégio de ouvir o canto dos pássaros.

Compartilhe essa história, comente e curta. Sua interação mantém viva a minha chama da conservação e ajuda a espalhar a mensagem de que a natureza merece ser protegida. 

Espero que tenham gostado dessa história ao lado das saíras-douradinhas. Até a próxima aventura!

Por Leonardo Merçon

Leonardo Merçon, fotógrafo de natureza sorri enquanto um passaro chamado de "corrupião" ou "sofrê" pousa em sua câmera, interagindo com o fotógrafo.

Fotógrafo e Cinegrafista de natureza, fundador do Instituto Últimos Refúgios, Mestre em Conservação da Biodiversidade e Desenvolvimento Sustentável, apaixonado pelo meio ambiente! Junte-se a mim nesta incrível jornada de descobertas sobre a vida selvagem e veja mais histórias lindas que vivo estando sempre explorando a natureza. 🌳 (Foto de making of: Iago Bueno)


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