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Embora seja um dos momentos mais significativos e esperados, a chegada de um filho pode resultar em mudanças bruscas no relacionamento de um casal.
Esse fenômeno, complexo e repleto de nuances, é conhecido como “baby clash” (choque ou conflito do bebê, em português) e tem se tornado cada vez mais comum nas relações modernas.
Segundo Dani Fontinele, terapeuta sexual e membro da Abrasex, o baby clash refere-se às crises conjugais que geralmente surgem no pós-parto, se intensificam nos primeiros seis meses de vida do bebê e podem persistir por anos, caso o casal não se separe.
“O que era uma parceria se torna agora uma família, com todas as mudanças que isso implica. E o seguinte cenário tem sido comum: ‘o casal tem um relacionamento que funciona bem, até que vem o primeiro filho e tudo se torna mais estressante e menos excitante’”, explica.
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A terapeuta também ressalta que, na ausência de cumplicidade entre os parceiros, há inúmeras razões para o baby clash desencadear eventos potencialmente estressantes no relacionamento.
O QUE DIZEM ESTUDOS
Uma pesquisa envolvendo 2 mil casais, realizada por ChannelMum.com e divulgada pelo Independent, mostrou que um terço dos casais passa por crises graves no relacionamento durante o primeiro ano de vida do bebê, especialmente nos seis primeiros meses, enquanto um quinto deles acaba se separando neste período.
Monica Machado, psicóloga e fundadora da Clínica Ame.C, destaca que os primeiros meses com um bebê nem sempre são caracterizados pela felicidade e paz de espírito.
“As tarefas aumentam, a qualidade de sono diminui e a exaustão chega ao nível máximo. Um cenário que tem tudo para discussões e troca de farpas. No entanto, é preciso que ambos se lembrem de que estão no mesmo barco. A fadiga, que é inevitável nesta fase, não pode minar o que há de melhor no entrosamento do casal”.
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Outra pesquisa, publicada no Frontiers in Psychology, com pais de primeira viagem, mostrou que quase 80% das mulheres passaram a sentir desânimo na relação logo após o nascimento do filho, enquanto 51% dos homens sentiram o mesmo.
Esses sentimentos não estavam necessariamente relacionados à depressão pós-parto ou ao “baby blues“.
Para Danielle H. Admoni, psiquiatra geral da Infância e Adolescência, não há dúvida de que um recém-nascido coloca o relacionamento do casal à prova.
“O período pós-parto é uma verdadeira montanha-russa, tanto do ponto de vista hormonal para a mãe, quanto emocional para ambos. Entre a mulher que se recupera gradualmente e o homem que vai assumindo seu papel como pai, fica fácil perder o rumo”, diz a psiquiatra especialista pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP).
Já um estudo encomendado ao IFOP pelo site Sleepyz.fr, envolvendo mil casais com filhos de até 3 anos, apontou que 50% deles cogitaram a separação após o nascimento do filho mais novo.
No quesito intimidade, 48% dos casais diminuíram bem a frequência das relações sexuais, enquanto 75% já deixaram de ter relação por alguma intervenção relacionada ao filho.
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Bárbara Bastos, sexóloga clínica e educacional pela Fasex, explica que, após o retorno da maternidade, a mulher lida com mudanças em seu corpo, bem como em seu foco de preocupação.
“Naturalmente, ela está mais concentrada em seu papel de mãe do que de mulher. Por outro lado, seu parceiro pode facilmente interpretar mal essas mudanças comportamentais, dificultando uma abordagem íntima”.
COMO SUPERAR O BABY CLASH
No entanto, segundo Dani Fontinele, muitas vezes o casal se deixa levar pela exaustão e vai postergando a resolução dos conflitos. Porém, o risco do baby clash se agravar cresce, e a chance de uma ruptura também.
“Mesmo que o relacionamento já esteja enfraquecido, sempre há uma chance de resgatar a conexão anterior. O nascimento de uma criança, a descoberta da maternidade/paternidade, as mudanças no corpo e na mente… juntos, esses aspectos vão constituir uma nova dinâmica que o casal, agora família, deve aprender a praticar”.
Não hesitem em falar: evitem sufocar seus sentimentos, especialmente se eles dizem respeito ao relacionamento.
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Para Bárbara Bastos, também pós-graduanda em Sexualidade Humana e sócia da Désir Atelier, uma grande armadilha da relação é se reprimir e deixar assuntos pendentes.
“Estes se tornarão rancores que vão se acumular e, em algum momento, virão à tona da pior forma. Portanto, façam do diálogo um hábito saudável, em que ambos tenham o mesmo espaço para falar, ouvir e refletir”.
Joguem no mesmo time: o bebê não é motivo de competição. Não se trata de mostrar quem se dedica mais à criança e/ou ao relacionamento.
“Aceitem que a vida mudou, e ambos precisam estar no mesmo time que, agora, tem um novo integrante que depende muito da união dos pais, pondera a psicóloga Monica Machado, apresentadora do podcast Ame.Cast.
Entre as sonecas do bebê, apostem no autocuidado: a psiquiatra Danielle Admoni ressalta a importância de o casal manter a individualidade.
“Antes de serem um casal e, agora, país, estamos falando de duas pessoas, dois indivíduos que também têm necessidades e interesses próprios”.
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Segundo Admoni, do nascimento até cerca de 3 meses, o bebê costuma dormir de 15 a 20 horas por dia.
“Cada um deve aproveitar essas brechas para fazer algo que o renove, de forma particular, seja uma caminhada no parque, um banho de sol, uma leitura interrompida… Qualquer coisa que realmente lhe preencha”.
A psiquiatra ainda reforça: “o autocuidado é fundamental, até porque é praticamente impossível se dedicar com qualidade ao bebê e ao relacionamento, caso a saúde física e mental estejam comprometidas”.
Preservem a intimidade sexual: mesmo com o resguardo e os desconfortos pós-parto, o casal não precisa se abster dos momentos de intimidade e correr o risco de esfriar a vida sexual.
“Sexo está longe de se resumir à relação genital. O casal pode abusar dos beijos, explorar carícias e toques em outras regiões de grande sensibilidade. Também trocar flertes e provocações, criando jogos de sedução e brincadeiras eróticas. O mais importante é evitar a perda dessa conexão. Pelo contrário. O ideal é instigar o desejo até o momento em que seja possível retomar o sexo por completo”, aconselha Dani Fontinele.
“Em suma, resistir ao baby clash vai exigir uma boa dose de criatividade, disciplina e tolerância, mas o esforço certamente irá recompensar”, finaliza Bárbara Bastos.
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