Coincidência ou não, dois artistas moradores do interior do Espírito Santo apresentam um ponto em comum, além de estarem presentes na Exposição 20/20, que marca os 20 anos do Museu Vale. As obras escolhidas por eles para compor a mostra tem como ponto de inspiração a iconografia casa.
Jocimar Nalesso, nascido em Alfredo chaves e atualmente morador de Marechal Floriano, retratou em pintura e desenho, de 300 x 150 centímetros, uma casa centenária, localizada em Soído de Baixo, na qual se dedicou a investigar os espaços vazios e a memória – não seu caráter histórico, mas os vestígios: objetos, rabiscos, paredes, incisões, informações deixadas –, ocupando-a como ateliê e estadia. Nesse espaço de pesquisa esteve por dois anos e, até hoje, ele instiga indagações em suas configurações.
A obra, segundo Jocimar, ainda faz referência e homenagem ao Museu Vale e à Rosana Paste e Rosilene Luduvico, artistas que já expuseram no local. Compondo ainda a criação, escadas e cadeiras dão movimento à pintura e conversam com a escultura Nu, de 176 x 97 x 60 centímetros, posicionada ao lado do quadro. Feita em madeira e com as medidas reais do seu autor, o objeto tem a forma de uma cadeira que simula um nu andando pelo Museu.
Também do interior do Estado, o artista Rick Rodrigues, nascido e morador de João Neiva, traz o tom rosa para uma salinha que fica logo na entrada do Museu e toca em cheio o território do sensível e do delicado, tendo o bordado como meio de produção principal para a discussão da contemporaneidade e da tradição junto a abordagens sobre gênero, afetividade e sexualidade.
Dois trabalhos da série “Casa 34” remetem à antiga residência dos avós paternos do artista. “A partir da imersão nas memórias da casinha, criei desenhos bordados sobre lenços de algodão de padrões florais ou lisos e outros suportes, como fitas voil, fotografias, brinquedos e miniaturas de minha coleção pessoal ou garimpados. Para a Exposição 20/20, selecionamos as obras ‘Carta a quem não leu’ e ‘A planta’”, explica.
A primeira foi inspirada em uma correspondência endereçada ao pai de Rick, que nunca a leu. ”Logo senti a necessidade de bordá-la na fita, que foi disposta dentro de uma gaiola de madeira antiga”, explica. A segunda é um desenho bordado sobre lenço de algodão branco e miniaturas de móveis. “Representando a planta baixa da casa 34, a produzi sem consulta de projeto. Rebusquei nas minhas memórias e criei o desenho. No quintal, de onde mais tenho lembranças, destaco pássaros, árvores e flores. A obra está montada em uma caixa de acrílico transparente e pendurada na horizontal por finos cabos de aços”, comenta.
Dando continuidade, Rick ainda expõe obras das séries “Transparências” e “Casa 97”. Retrata também o ponto turístico Monte Negro, de João Neiva, em três peneirinhas de cozinha; e ainda as montanhas que circundam o bairro Crubixá, onde mora, com linhas douradas sobre o tecido de algodão branco. Encerra usando tecidos cinzas antigos, onde bordou retratos do pai, contornados por um crochê vermelho sangue, detalhes em dourado e moldura oval.
“Minhas buscas são sempre por revisitar as memórias afetivas de infância reais ou inventadas, que destacam vivências familiares, forças, desejos, sonhos, dores e fragilidades. Tenho o lar sempre como o principal símbolo, acrescido por elementos como móveis em miniaturas e outros elementos da arquitetura, como escadas, porões, janelas e portas. Vale ressaltar que as paisagens montanhosas entraram pela primeira vez nesse processo. É uma observação da casa-lar para além das paredes e, ao mesmo tempo, uma homenagem a minha cidade”, explica.
Outro artista que mora no interior e brindou a Exposição 20/20 foi Leo Benjamim. De Marechal Floriano, o artista emoldurou 54 minidesenhos, de 3,5 x 9 centímetros. Segundo ele mesmo descreve, cada um deles é capaz de gerar uma identificação com o espectador pela situação, pelo lugar ou pelo objeto que representa. Usando de 5 a 20 minutos para criar suas obras, o artista plástico considera-se “um arquiteto sem texto dado”. Para ele suas obras são “um dom, um experimento, um desenho puro e despreocupado, resultado unicamente da pura ação de desenhar”.
Todos revelam grande alegria em exporem no Museu Vale. Para Jocimar foi um presente. “Pensava que nunca ia poder expor lá. É um espaço tão grande. Foi almejado, sonhado. Também achei muito legal receber o pessoal do museu no ateliê para conhecer onde a gente produz”, explica Jocimar.
“Considero o Museu Vale um dos equipamentos mais importantes para as artes no Estado. Expor ali é o anseio de muitos artistas. Ser artista integrante de uma mostra que comemora as duas décadas de existência da instituição é um grande privilégio. Estar ao lado de grandes nomes das artes visuais, sem dúvida, é um marco na minha produção artística”, conta Rick.
“Eu me identifico com o Museu Vale e agora tenho uma relação mais íntima e física. Durante 20 anos foi somente uma relação telepática”, revela Leo.
Serviço
Exposição 20/20
Até 25/02/2019
Terças a sextas, das 8h às 17h, sábados e domingos, das 10h às 18h
Em janeiro, terças a domingos, das 10h às 18h
Entrada gratuita
Museu Vale – Antiga Estação Pedro Nolasco, s/n, Argolas – Vila Velha/ES
Informações: (27) 3333-2484.