Puxado pelas carnes, café, milho e açúcar, o agronegócio disparou e deve representar quase o dobro do saldo da balança comercial em 2025. Entre exportações e importações, as transações com produtos do campo devem atingir US$ 126,8 bilhões. Essa cifra equivale a quase o dobro do saldo da balança comercial de US$ 67 bilhões projetado para 2025 pela consultoria MacroSector.
Não é de hoje que a balança comercial do País seria deficitária, caso não contasse com a contribuição do agronegócio. “Mas desde 2022 não havia uma relação tão forte entre o saldo comercial do agronegócio e o da balança comercial”, observa o economista Fabio Silveira, sócio da MacroSector e responsável pelas projeções.
Naquele ano, o saldo comercial do agronegócio correspondeu a duas vezes o saldo da balança comercial total, porém com resultados menores do que os projetados para 2025. Em 2022, o saldo do agronegócio somou US$ 123,9 bilhões e o da balança comercial geral foi de US$ 61,5 bilhões.
Já nos anos seguintes, 2023 e 2024, a relação entre o saldo comercial do agronegócio e da balança como um todo recuou para 1,3 vezes e 1,6 vezes, respectivamente.
Silveira atribui o fortalecimento do papel do agronegócio previsto para este ano a vários fatores combinados. Entre eles estão a escalada de preços das matérias-primas, o ritmo ainda acelerado de crescimento das economias asiáticas, em especial a da China – o grande comprador de carnes e grãos – e a forte liquidez global.
Os programas de transferência de renda feitos por vários países para reverter a paralisia econômica provocada pela pandemia resultaram na aceleração dos preços das commodities que tem ajudado as exportações do agronegócio.
Dois lados
O lado bom do vigoroso desempenho da balança comercial do agronegócio é o acúmulo de reservas em dólares para o País, o que garante a estabilização da moeda. Esse aspecto ganhou relevância sobretudo nos últimos meses por conta da forte desvalorização do real em relação ao dólar. “O acúmulo de reservas ajudou a conter a disparada do dólar e evitou que a moeda americana chegasse a R$ 7”, afirma Silveira.
O economista pondera que a inflação está hoje acima do teto da meta (4,5%), mas ressalta que não vê risco de descontrole. “São poucos os países atualmente que têm essa sobra de dólar no mercado financeiro que o Brasil tem.”
No longo prazo, porém, a forte dependência do agronegócio e da exportação de matérias-primas no resultado comercial preocupa porque não gera dinamismo na economia e limita o crescimento, avalia o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro. “O que exportamos (commodities) é o que alguém quer e os preços são determinados pelo mercado: apenas embarcamos o que foi decidido no exterior.”
Tanto Silveira como Castro alertam que, do ponto de vista estratégico, um desdobramento negativo da forte dependência do agronegócio nas exportações é a baixa geração de empregos qualificados. “Mão de obra qualificada seria demandada se as exportações fossem focadas em segmentos de densidade tecnológica, como a indústria automobilística, eletroeletrônica e nos bens de capital”, observa Silveira.
Nas contas de Castro, devido ao déficit na balança comercial de manufaturados de US$ 135 bilhões alcançado no ano passado, o País deixou de gerar 4 milhões de empregos qualificados diretos e indiretos ligados à indústria.
Silveira diz que a fragilidade da indústria brasileira, que não consegue gerar saldo comerciais, é resultado dos juros altos, da falta de investimentos e de políticas direcionadas para o setor. “Não conseguimos exportar bens de consumo, bens intermediários e bens de capital.”
Café no topo
A grande ajuda no saldo comercial do agronegócio tem vindo do café. Em 2024, o saldo comercial do café em grão atingiu US$ 11,3 bilhões, com avanço de US$ 4,1 bilhões ante 2023 ou crescimento de quase 60%.
Para 2025, a expectativa é de que esse cenário continue. A consultoria projeta que o saldo comercial do café em grão atinja US$ 12,8 bilhões.
Márcio Ferreira, presidente do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé), observa que o País bateu recorde anual de exportação em 2024, com o embarque de 50,4 milhões de sacas e alta 28,5% nos volumes ante 2023.
A receita de exportação de US$ 12,5 bilhões no período também foi recorde e avançou 55,4% ante 2023.
Ferreira atribui esse forte desempenho das exportações de café à oferta restrita e ao aumento de preços. Em dezembro de 2024 o preço médio de exportação atingiu US$ 300,64 por saca, com alta de 54,7% ante dezembro de 2023, o maior nível em cinco anos.
Por conta de problemas climáticos, Vietnã e Indonésia colheram safras menores e o Brasil, mesmo com um volume aquém do previsto de produção, atendeu a demanda deixada pelos concorrentes.
“O agro salvou o saldo comercial do País e, com certeza, o café é um dos grandes guerreiros para manter esse superávit”, afirma o diretor do Cecafé, Marcos Mattos. No ano passado, o café respondeu por 7,6% das exportações do agronegócio e 3,7% das exportações totais brasileiras. Em ambos os casos, são as maiores marcas em dez anos.
Em menor proporção comparado ao café e às carnes, o açúcar também deve contribuir para impulsionar o saldo do agronegócio. A projeção é de um saldo de US$ 19,6 bilhões em 2025, com avanço de US$ 0,9 bilhão ante 2024.
Novas estrelas
Apesar de a soja ser isoladamente o principal produto de exportação do agronegócio em volume e receita, a perspectiva para este ano é de que o grão não contribua para o aumento do saldo comercial do setor comparado a 2024.
O saldo da balança comercial da soja projetado para este ano é de US$ 39,2 bilhões, ante US$ 42,6 bilhões em 2024, com recuo de US$ 3,4 bilhões.
O motivo da retração é o preço baixo do grão devido ao aumento dos estoques internacionais. Ao final da safra 2023/24, o estoque mundial de soja era de 112 milhões de toneladas e a projeção é de que atinja 132 milhões de toneladas ao final da safra 2024/25.
O produtor e pecuarista Guilherme Pinezzi, do Mato Grosso, que iniciou nesta semana a colheita de 5,6 mil hectares de soja espalhados entre os municípios de Bom Jesus de Araguaia e Serra Nova Dourada, no nordeste do Estado, vive realidades diferentes dos produtos com os quais ele trabalha. A soja está no terceiro ano de baixa de preços e a pecuária deu uma virada a partir do segundo semestre do ano passado, com uma valorização inesperada do boi gordo. “Commodity é cíclica”, afirma.
Anos atrás quando comprou a fazenda, ele conta que surfou no ciclo de alta da soja. Agora, no entanto, os preços estão em queda por causa da grande oferta mundial. Mesmo assim, ele expandiu a área plantada com o grão em 6% nesta safra. Foi um ritmo bem menor do que o plano inicial, que era crescer 20% a área.
Apesar do risco de expandir o cultivo num cenário desfavorável de preços, Pinezzi explica que os produtores que plantam soja não têm alternativas de outras lavouras anuais para substituir o grão em grande escala.
A expectativa é tirar a diferença da queda de preços com aumento da produtividade para voltar a ter margem positiva. Neste ano, ele espera colher 70 sacas de 60 quilos por hectare, ante 62 no ano passado.
Além da expectativa de aumento da produtividade da soja, o produtor comemora o cenário favorável da pecuária. A arroba (15 quilos) do boi na sua região hoje está em R$ 320, ante R$ 220 no mesmo período do ano passado. Hoje Pinezzi está investindo no estoque de animais.
De acordo com as projeções da consultoria, as exportações de carnes, que incluem frango, suínos e bovinos, devem ser uma das alavancas do saldo comercial do agronegócio. A projeção é de um saldo de US$ 25,6 bilhões para as carnes neste ano, ante US$ 24,2 bilhões em 2024.
Além da carne, outros dois destaques da balança comercial do agronegócio são o milho e o café. No caso do milho, a expectativa é de que o grão gere um saldo comercial de US$ 9,5 bilhões este ano, com um aumento de US$ 1,6 bilhão em relação a 2024.
Ao contrário da soja, o preço do grão voltou a crescer em escala global pelo declínio dos estoques em razão de problemas na produção dos Estados Unidos e aumento da demanda da China. Na última quinta-feira, 16, a saca de 60 quilos do grão estava cotada à vista a R$ 74,42, segundo Indicador Esalq/BM&FBovespa. É uma alta de quase 20% em 12 meses.